LETÍCIA QUATEL
Reunir o chef Wolfgang Puck ao diretor e produtor David Gelb é como dar três estrelas Michelin a uma produção cinematográfica. Ao menos é essa a aposta da plataforma de streaming Disney Plus ao lançar o documentário “Wolfgang: O Chef Celebridade” na próxima sexta (25).
“Revisitar minha história mesmo com todas as dores foi uma maneira de dizer a mim mesmo que você pode ser o que quiser se encontrar sua paixão”, disse Puck em entrevista coletiva pelo Zoom.
Gelb é tido como mestre em tirar das pessoas seus traumas mais escondidos. “O que nos molda, para o bem e para o mal, são as nossas relações, especialmente com o núcleo familiar”, afirmou o diretor na entrevista. “Essas relações tornam as histórias universais.”
Em sua lendária trajetória, o chef austríaco coleciona, além de estrelas Michelin, mais de 30 bares e restaurantes espalhados pelo mundo -o Cut e o Spago à frente deles-, duas décadas preparando o cardápio da festa do Oscar, participação em pelo menos 15 programas de TV, e até estrela na Calçada da Fama.
O sucesso diante das telas muitas vezes deixou em segundo plano os grandes feitos na gastronomia. Puck é responsável pela construção de uma identidade para a cozinha americana. Nascido Wolfgang Johaness Topfschnig, em 1949, migrou da Áustria para a França e de lá para os Estados Unidos, em 1973, aos 24 anos.
Foi trabalhar no Ma Maison, de Patrick Terrail, na Hollywood dos anos 70. Ali, levou o protagonismo da cozinha de volta aos ingredientes e sabores. Terrail, com quem brigou e se reconciliou, é um dos entrevistados do documentário.
“Assim que eu cheguei, houve uma melhora instantânea no Ma Maison, mas o Patrick levava todo crédito”, relembra Puck no novo filme. Depois de quase sete anos, era a hora do voo solo.
Quando abriu o Spago, em 1982, em Los Angeles, introduziu ingredientes frescos na elaboração dos pratos, com uma técnica mais europeia de cozinhar. O endereço passou a ser frequentado por celebridades, alçando-o ao status de estrela.
Em “Wolfgang: O Chef Celebridade”, Gelb está interessado tanto na gastronomia quanto em entender quem é Puck. E revela um passado de superação e resiliência.
O chef, que saiu de casa aos 14 anos para se internar numa cozinha, sempre fugiu, na tentativa de escapar especialmente do relacionamento conturbado com o padrasto.
“Ele costumava me dizer que eu não seria nada. E que, se eu fosse homem de verdade, era pra ficar longe da cozinha”, conta Puck.
Filho de Peter Gelb, diretor do Met (Metropolitan Opera), de Nova York, David Gelb criou um estilo particular de narrar histórias do mundo da gastronomia desde seu pioneiro “Jiro Dreams of Sushi”, documentário de 2011 sobre o lendário sushiman japonês Jiro Ono. Ele traz as questões humanas e relações familiares para o centro da narrativa.
Foi nessa base que criou o estrondoso “Chef’s Table”, atualmente em sua sexta temporada na Netflix.
“No caso de Wolfgang isso é muito forte”, disse Gelb durante a entrevista. “A relação com a família, com o padrasto, foi complicada. Depois, ele constituiu famílias que viraram grandes alicerces para tudo o que ele conquistou.”
O documentário não é o primeiro encontro do chef e do diretor. Gelb lembra que, aos 13 anos, foi com o pai ao Spago e viu Puck saindo da cozinha.
“O que mais me impressionou foi o momento em que ele sai e, com muito carisma, aperta a minha mão. Eu era uma criança e achei isso incrível, me marcou muito”, conta.
“Para mim, comida é família. Fazer as pessoas felizes é o meu propósito na vida”, resume Puck. “E eu não mudaria absolutamente nada em minha história.”
Fonte: FolhaPress