SÉRGIO RODRIGUES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “O que eu mais quis fazer ao longo dos últimos dez anos foi transformar a escrita de textos políticos em uma arte”, afirma George Orwell em “Por que Escrevo”. Impossível negar que conseguiu.
É possível mesmo sustentar que nenhum outro escritor do século 20 teve tanto sucesso nessa empreitada quanto o autor de “Fazenda dos Animais” e “1984” –respectivamente, o ideal platônico de fábula política e a distopia das distopias.
Escritas nos anos 1940, as mais famosas obras de Orwell vendem e são debatidas em nosso tempo assombrado por novas ameaças totalitárias como se tivessem sido concebidas para nós. Não há melhor definição de clássico.
O volume fino reúne quatro textos unificados pelo tema política e literatura. Além de “Por que Escrevo”, se destaca “Política e a Língua Inglesa”, talvez o mais citado dos ensaios de Orwell. Escrito em 1946, reflete sobre questões de deturpação ideológica da linguagem que três anos depois estariam no coração de “1984”.
É um texto que mostra marcas de envelhecimento. Brilhante ao analisar a tendência ao clichê e ao bordão no debate público de uma sociedade de massas, o autor resvala num sentimento apocalíptico, inseparável da idealização de um passado linguístico mítico, que desde então perdeu crédito. As questões de linguagem que aponta vão muito além da “língua inglesa” do título.
Completam o volume o curto “Livros vs. Cigarros”, reflexão jornalística leve sobre o peso econômico e cultural da leitura, e o longo “O Leão e o Unicórnio: O Socialismo e o Gênio Inglês”, tratado sobre o espírito nacional inglês que ilumina até o brexit -“o patriotismo em geral é [entre os ingleses] mais forte do que o ódio entre classes, e é sempre mais forte do que qualquer tipo de internacionalismo”.
No entanto, escrito no tumulto de 1941, quando parecia impossível que o mundo tivesse futuro sem se reinventar por completo, é também o ensaio mais datado do livro. O autor julga iminente uma revolução socialista à inglesa que, como se sabe, nunca veio. Veio décadas mais tarde seu exato oposto –o thatcherismo.
Esse é o texto em que fica mais clara a posição política de Orwell, “contra o totalitarismo e a favor do socialismo democrático, tal como eu o entendo”. Tal entendimento pessoal fez dele um inimigo dos stalinistas, que três anos mais tarde esculacharia com gênio em “Fazenda dos Animais” (também conhecido no Brasil como “A Revolução dos Bichos”).
“Por que Escrevo”, ensaio que abre o livro, dá pistas de como o escritor inglês nascido na Índia em 1903, e que viveu apenas 46 anos, encontrou a fórmula da juventude artística. Ao se fazer a pergunta clássica, Orwell –nome literário de Eric Arthur Blair– responde com mais lucidez e menos narcisimo do que a média dos escritores.
Os quatro combustíveis da escrita, segundo ele, são puro egoísmo, entusiasmo estético, impulso histórico e propósito político. A lista é bastante defensável em sua seleção de elementos que, misturados em proporções variadas, compõem não só obras individuais, mas escolas estéticas inteiras.
A surpresa é ver Orwell se declarar inclinado para o lado estético da escrita, segundo uma “visão de mundo” adquirida na infância, e atraído à força para os campos histórico e político por um chamado moral inegociável.
“A guerra na Espanha e outros eventos em 1936-1937 pesaram na balança e, depois disso, já sabia minha posição”, escreve. Não foi, obviamente, o único escritor da época a imprimir à sua obra um propósito político claro. Em momentos históricos inflamados –como também é o nosso–, esse tipo de opção tende mesmo a ser hegemônico.
O segredo de Orwell deve ser buscado em sua fusão particular de política e estética, tanto na capacidade de isolar e retratar as grandes linhas de força sociais do seu tempo quanto no rigoroso trabalho de linguagem com que as fixou.
Cultura
Quinta-feira, 3 de outubro de 2024
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