Cultura
Domingo, 13 de outubro de 2024

A Festa de Formatura’ tenta salvar fiasco da Broadway com glitter e celebridades

LEONARDO SANCHEZ
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Purpurina, estrelas de Hollywood e muito otimismo estão na receita que Ryan Murphy usou para levar o espetáculo da Broadway “The Prom” para a Netflix. Batizada, no Brasil, “A Festa de Formatura”, a adaptação cinematográfica que chega à plataforma agora é um banquete para os fãs de musicais, mas também deve agradar a quem busca por uma comédia calorosa ao passear pelos vastos catálogos de streaming.
As canções guiam o espectador pela história de vários estudantes americanos que foram impedidos de comparecer às suas festas de formatura pelo mesmo motivo – eles queriam estar acompanhados de alguém do mesmo sexo.
Esse tipo de caso começou a ganhar a atenção da mídia no fim dos anos 2000, quando as redes sociais se tornaram plataformas para denunciar as intolerâncias às quais jovens LGBT eram submetidos.
Ainda pouco conhecidos no universo teatral, Chad Beguelin e Bob Martin encontraram nessas histórias potencial para um novo espetáculo. Em 2016, eles assinaram juntos o libreto de “The Prom”. Dois anos mais tarde, conseguiram ocupar um dos cobiçados teatros da Broadway com a produção e, hoje, eles são creditados como os roteiristas de “A Festa de Formatura”.
“Nós escrevemos essa história num momento em que cada vez mais pessoas estavam se posicionando e atuando politicamente. Mas, na contramão disso, havia muita gente que não se informava sobre as causas que defendia. Então nós criamos um espetáculo que fala sobre compreensão e perdão”, diz Beguelin.
Na trama, seguimos a estudante lésbica de uma cidadezinha do estado americano de Indiana que tem sua festa de formatura cancelada pela associação de pais e mestres do lugar. Quando ficam sabendo, quatro estrelas da Broadway que passam por uma crise na carreira veem na situação a oportunidade perfeita de, por meio do ativismo, reconquistarem os aplausos.
É preciso assistir ao filme para saber se o quarteto recuperou a aclamação, mas, na vida real, muitas palmas seguiram a estreia de “The Prom” em Nova York. O espetáculo foi bem recebido pela crítica e teve seis indicações ao Tony. Mas, nas bilheterias, foi um fiasco e fechou depois de menos de um ano em cartaz.
“Poucos espetáculos da Broadway recuperam seu investimento”, diz o roteirista Bob Martin. “É um mercado muito competitivo e são poucos os musicais totalmente originais na Broadway. É mais difícil vender uma ideia original do que alguma coisa com a qual o público já está familiarizado, como a adaptação de um filme. É um desafio que não conseguimos superar.”
Mas “The Prom” ganhou uma segunda chance quando o megaprodutor americano Ryan Murphy viu a peça em Nova York. Depois de se identificar com a protagonista – já que ele próprio cresceu como um jovem gay em Indiana -, ele decidiu tornar o espetáculo parte de um acordo de de US$ 300 milhões, ou R$ 1,5 bilhão, firmado com a Netflix.
“Nós ficamos muito empolgados porque nossa temporada na Broadway foi limitada e agora, no primeiro dia do filme na Netflix, essa história será vista por muito mais gente do que foi em todas as sessões teatrais que fizemos”, afirma Martin. “Nós a escrevemos porque nos importamos muito com o seu tema, então estamos animados por espalhar essa mensagem.”
É nítido que Murphy investiu boa parte de sua energia no projeto. Muito além do que costuma fazer, ele não só produz, como também dirige o longa. Ao escalar o elenco, usou sua influência para persuadir Meryl Streep, Nicole Kidman, James Corden e Kerry Washington a fazer um filme que, em outras mãos, poderia ficar restrito à timidez e a um público de nicho.
Enquanto Washington faz a tirana presidente da associação de pais e mestres do longa, Streep, Kidman e Corden retornam aos musicais como as estrelas da Broadway que ajudam a protagonista. A eles se junta Andrew Rannells, que ganhou fama nos palcos com “The Book of Mormon”.
Afetados do jeito que os personagens de Ryan Murphy costumam ser, os quatro deixam a trama impregnada de certo glamour e humor ácido, já que, nas palavras dos roteiristas Martin e Beguelin, foram pensados para representar liberais de Nova York que se engajam em causas sociais, mas pouco as conhecem.
Eles entoam canções que clamam por diversidade e condenam o retrocesso da cidadezinha que visitam, ao mesmo tempo em que fazem piada com seu próprio estilo de vida e com o universo dos musicais.
Ao chegar a Edgewater, a personagem de Streep, uma lenda decadente, se irrita com a simplicidade de seu hotel. Para conseguir um quarto melhor, ela tira dois prêmios Tony da bolsa e os mostra ao recepcionista, que não faz ideia do que são os troféus.
Mas se o quarteto estrelado encarna a superficialidade e a pompa do showbiz, o casal de estudantes que eles ajudam, vivido pelas novatas Jo Ellen Pellman e Ariana DeBose, é responsável pelos momentos mais ternos do filme.
“Eu só quero dançar com você”, entoam as estudantes numa das canções. É a partir da simplicidade de um primeiro amor, e também de sua intensidade, que Murphy constrói seu palco de excessos e levanta a bandeira que se tornou quase que obrigatória em seus trabalhos – a diversidade.
“Eu acho que é incrível termos artistas como o Ryan Murphy criando conteúdo para pessoas que costumavam estar marginalizadas no cinema e na TV”, diz Beguelin. “É maravilhoso que essas pessoas agora se vejam nas telas.”
“Esse é um filme extremamente otimista e, no centro da história, está a mensagem de que é possível construir um futuro melhor”, acrescenta o parceiro de roteiro Bob Martin.