No Mundo
Quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Vingança não vai resolver problemas de Israel, diz irmão de refém morto ainda não devolvido pelo Hamas

Elad Or assiste às notícias com apreensão. No último dia 13, o Hamas entregou a Israel os restos mortais de mais um refém. Restam apenas três corpos na Faixa de Gaza um deles é o de seu irmão, Dror. “Estou bastante ansioso. Tenho receio de que ele seja esquecido”, diz à reportagem.
Dror morreu no kibbutz Beeri ao lado da mulher, Yonat, durante os atentados de 7 de outubro de 2023. Seu corpo foi levado para Gaza, entre os mais de 250 reféns israelenses. Dois de seus três filhos também foram capturados naquele dia pelo Hamas, mas foram soltos em seguida.
Apesar da dor, Elad se opõe de maneira categórica aos ataques israelenses que já mataram quase 70 mil palestinos, no que parte da comunidade internacional considera um genocídio. “A vingança não é o jeito de resolver nossos problemas”, afirma. “Não quero que ninguém sofra porque meu irmão morreu, porque minha família sofreu. Esse é meu instinto mais básico.”
Elad, 41, é um dos membros da organização Parents Circle (Círculo de Pais, em inglês). Esse grupo reúne centenas de familiares de vítimas israelenses e palestinas para pressionar as autoridades de ambos os lados a encontrar uma solução que não passe pela violência. “Não tem outro jeito”, diz Elad. “Os palestinos não vão embora. É a casa deles, quer eu goste disso ou não. Assim como é a minha casa, quer gostem ou não.”
Essa é uma posição cada vez mais rara, em meio aos episódios de violência que marcaram a história recente da região, com as autoridades israelenses e a liderança do Hamas prometendo a exterminação uns dos outros. “Sei que não é simples. Mas estou escolhendo acreditar nisso.”
Foi também a escolha do palestino Mazin Abuzir, 47, outro membro do Parents Circle. Bombardeios israelenses mataram cerca de 20 membros de sua família em Gaza, incluindo primos com quem tinha crescido. Seu irmão passou duas décadas preso e só foi solto agora, em setembro. “Este conflito dói muito”, diz. “Há mortos dos dois lados, sem que isso mude nada. Então dissemos: chega. Queremos um caminho para a paz.”
Entre seus projetos, o Parents Circle organiza um acampamento de verão para jovens palestinos e israelenses que perderam familiares. Reúnem-se em territórios neutros neste ano, em um resort no Chipre para uma série de atividades voltadas a criar laços entre pessoas condicionadas a desconfiar umas das outras. “Um dos principais problemas da nossa terra é a dificuldade de comunicação”, afirma o gerente Mohamad Awad, 32, de Belém, na Cisjordânia.
Mohamad perdeu o primo em julho deste ano, na região de Ramallah. Estava visitando amigos quando as forças israelenses entraram no território em uma operação militar. Alvejaram o jovem de 16 anos no coração. Mohamad estava no acampamento do Parents Circle quando soube. “Por um instante, pensei que não conseguiria mais dizer às crianças que precisamos viver em paz nesta terra. Mas então recebi mensagens de apoio dos membros israelenses. E trabalhei mais duro.”
Uma das atividades do acampamento de verão é aprender a contar as histórias de suas perdas uns aos outros. Os jovens também fazem cursos de fotografia, retratando o outro lado. Na cozinha, preparam pratos típicos de sua culinária. Brincam e rezam juntos também. “A ideia é trazer alguma esperança e construir uma ponte entre eles”, afirma Mohamad.
Os adultos têm suas próprias atividades. Neste ano, vão para Praga, na República Tcheca, onde também vão aprender a contar suas histórias de uma maneira que expresse suas perdas sem gerar mais ressentimento. Assim, segundo Mohamad, os palestinos entendem que nem todo israelense é militar já os israelenses entendem que nem todo palestino é membro do Hamas.
Os participantes não pagam nada pelas atividades. O Parents Circle diz que financia os projetos com doações recebidas, por exemplo, dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Alemanha. Mas, ainda que o dinheiro seja externo, a solução tem de vir de dentro, diz Mohamad. “Só nós, os palestinos e os israelenses, vamos poder resolver os nossos problemas.”
Para Elad, a meta a curto prazo é recuperar o corpo do irmão, Dror. Depois, quer pressionar as autoridades de ambos os lados. Dos palestinos, espera que removam o Hamas do poder. Já dos israelenses, que deixem de bombardear Gaza. “Quero que o meu sofrimento e o sofrimento deles acabem”, afirma. “Não vou ter um futuro se eles não tiverem um futuro também.”

Fonte: FolhaPress