Economia
Quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Startup que financia energia solar a consumidores recebe R$ 160 milhões

Solfácil já financiou painéis fotovoltaicos a mais de 10 mil clientes na pessoa física e jurídica; proposta cresceu com aumentos na conta de luz

Hidrelétricas em baixa, termelétricas em alta: o resultado é que o consumidor de energia elétrica tem visto uma conta de luz cada vez mais cara. Essa crise gera oportunidades para startups que defendem maneiras de economizar na conta atual, ou mudar para uma conta completamente diferente.

O segundo caso é o da Solfácil. A startup de serviços financeiros defende trocar a mensalidade da energia elétrica por um painel fotovoltaico parcelado.

Essa fintech de financiamento da energia solar acabou de ganhar mais um impulso para sua proposta. A Solfácil anunciou nesta quarta-feira (23) a captação de R$ 160 milhões. O aporte será fundamental para a fintech crescer dez vezes sobre 2020, ampliando a carteira de crédito para R$ 1 bilhão neste ano. Atualmente, são mais de 10 mil clientes e R$ 300 milhões em painéis fotovoltaicos financiados.

Do Zero Ao Topo, marca de empreendedorismo do InfoMoney, conversou com o fundador Fabio Carrara sobre o setor de energia solar e o crescimento da Solfácil. O mercado tem dado saltos nos últimos anos, mas a oportunidade continua grande. Segundo dados coletados pelo empreendedor na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), 0,6% das unidades consumidoras brasileiras tem tecnologia de energia solar atualmente. Em países como a Austrália, a penetração chega a 25%.

Como funciona a energia solar distribuída

A Solfácil foi fundada pelo engenheiro Fabio Carrara em 2018. Carrara começou sua carreira há 15 anos, como consultor estratégia no Boston Consulting Group. Um MBA na Universidade de Wharton acendeu seu interesse pelo empreendedorismo. De volta ao Brasil, Carrara tornou-se diretor em um fundo alemão de venture capital. O estudo de um negócio de geração de contatos de clientes (leads) fez o diretor perceber o mercado de painéis fotovoltaicos.

“Pesquisei sobre a energia solar distribuída e vi que ela era comum na Austrália, na Europa e nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, o Brasil é o melhor país para esse mercado: tem uma energia elétrica cara, mas muito sol e mão de obra relativamente barata. São fatores que permitem a expansão da energia solar distribuída”, diz Carrara. Na energia solar distribuída, os usuários geram luz para consumo próprio.

O diretor virou empreendedor em 2015. Fundou a Solstar, uma empresa que desenhava projetos e instalava painéis fotovoltaicos em estabelecimentos comerciais e residenciais. “Aprendi sobre a cadeia de suprimentos, sobre a tecnologia e sobre as necessidades do consumidor final. Ficou claro que o grande gargalo era fazer o investimento inicial nos painéis, e as fintechs estavam crescendo no Brasil”.

Após um investimento semente de R$ 4 milhões, captado em 2018, nasceu a Solfácil. A fintech pretende trocar o custo atual da energia elétrica pelo investimento em energia solar, concedendo financiamentos de até dez anos para aquisição de painéis fotovoltaicos.

A Solfácil atua em modelo B2B2C: agentes locais de projeto e instalação de painéis oferecem o financiamento da fintech aos consumidores finais. A Solfácil tem mais de 5 mil parceiros em mais de mil municípios. “O financiamento é uma ferramenta de venda para essas empresas, já que investimento inicial é o grande gargalo”, diz Carrara. É uma relação similar entre empresas de crédito automotivo e concessionárias, por exemplo.

A Solfácil atende consumidores na pessoa física e pessoas jurídicas de pequeno porte. Esses mercados representam respectivamente 40%-45% e 35% dos projetos de energia solar no Brasil, segundo coletados pelo fundador da fintech na Aneel.

No segundo semestre, a Solfácil passará a atender também produtores rurais, que representam 15% dos projetos de energia solar. Dessa forma, a fintech pretende endereçar entre 90% e 95% do mercado. O restante está nas empresas de grande porte.

Segundo o fundador da fintech, o investimento em um painel fotovoltaico fica entre R$ 20 mil e R$ 30 mil para pessoa física, e entre R$ 75 mil e R$ 100 mil para pessoa jurídica de pequeno porte. Em um prazo de cinco a seis anos, o consumidor costuma pagar o painel – e a partir daí pode gerar a própria energia pelos painéis instalados no telhado ou no solo de sua residência. Sem os juros do financiamento, o prazo seria de quatro anos (considerando uma mensalidade similar à da fatura tradicional de energia elétrica).

A Solfácil tem mais de 10 mil clientes em sua carteira de crédito, que já ultrapassou R$ 300 milhões. O dinheiro para conceder o crédito é captado por meio de Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs).

A monetização da fintech vem da taxa de administração cobrada para originação do crédito e alocação do capital, além do spread do financiamento dos painéis fotovoltaicos. Esses FIDCs têm oferta restrita e para investidores qualificados (Instrução CVM 476), mas a Solfácil busca lançar no futuro uma oferta pública (CVM 400).

Conta de luz mais cara e novo investimento

Apesar de notícias sobre o aumento na conta de luz terem tomado o país nos últimos meses, Carrara afirma que o encarecimento da energia elétrica vem de anos e tem raízes estruturais.

“O custo da energia cresce historicamente acima dos índices de inflação. O Brasil tem uma matriz majoritariamente hídrica, mas esse modelo se esgotou pela falta de escalabilidade. O projeto mais recente foi o da hidrelétrica de Belo Monte, que teve uma série de problemas ambientais”, diz o fundador da Solfácil.

Atualmente, o risco de racionamento fez o Brasil se ancorar em termelétricas, poluentes e com energia mais cara que a das hidrelétricas. “Já a energia solar é uma das mais baratas e depende apenas de incidência solar. É uma solução ideal para momentos de racionamento, porque são as pessoas colocando o próprio capital para construir infraestrutura de eletricidade.”

Carrara acrescenta que a demanda pela energia solar cresceu diante do encarecimento da conta de luz. O mercado cresceu 160% por ano nos últimos cinco anos, segundo dados coletados pelo empreendedor na Aneel. O negócio cresceu dez vezes em 2020, e têm agora crescido 90% por trimestre. A fintech concede R$ 60 milhões em crédito mensalmente, com a entrada de 2 mil novos clientes por mês.

Além do investimento semente em 2018, a fintech captou R$ 21 milhões em agosto de 2020. O aporte série A foi liderado pela Valor Capital Group. Os atuais R$ 160 milhões correspondem a um aporte série B, liderado pelo QED Investors. O fundo de capital de risco investiu em startups como Creditas, Loft e QuintoAndar. A rodada teve ainda a participação do Banco Mundial e novamente da Valor Capital Group.

As captações feitas em troca de participação no negócio (equity) são voltadas para investimentos na própria fintech, e não nos recursos para financiamento. O aporte série B será usado primeiro para crescer e melhorar o financiamento. Depois, para criar soluções aos parceiros da Solfácil.

A Solfácil vai lançar financiamentos de curto prazo, para aqueles que querem comprar o painel fotovoltaico em três ou quatro parcelas. A fintech vai investir em marketing e comercial para ampliar o número de parceiros, chegando a 10 mil deles até o final de 2022. Os recursos também vão para tecnologia, com o objetivo de automatizar a concessão do financiamento e facilitar a integração com os sistemas dos parceiros. Por fim, pretende ir além da concessão de financiamento aos parceiros: oferecerá plataformas de conexão com fornecedores, relacionamento com o cliente e monitoramento dos painéis instalados.

Executar tais planos requer uma equipe maior. A Solfácil tem mais de 200 funcionários hoje e pretende chegar a 460 pessoas até o final de 2020. A Solfácil espera chegar a 100 mil clientes e R$ 1 bilhão financiados em 2021 – outro crescimento de dez vezes sobre o ano anterior, como visto em 2020. Para 2022, o plano é conceder R$ 2,5 bilhões em crédito.

“Percentualmente, o crescimento vai desacelerar aos poucos. É natural. Mas ainda temos muito potencial para crescimento”, diz Carrara.

Fonte: InfoMoney