ANA ESTELA DE SOUSA PINTO – Apesar de um ano de manifestações por sua renúncia e do pior desempenho contra pandemia na União Europeia, o premiê da Bulgária, Boico Borisov, largou na frente para obter o quarto mandato.
Seu partido –Cidadãos para o Desenvolvimento Europeu da Bulgária (Gerb), de centro-direita– perdeu participação em relação às eleições de 2017, mas obteve a maior fatia dos votos nas parlamentares deste domingo (4), de acordo com pesquisa de boca de urna do instituto Alpha. O Gerb aparece com 25,7% dos votos (de 32,7% em 2017), segundo o levantamento.
Apelidado de “Batman dos Bálcãs”, por preferir roupas pretas e por seu passado como bombeiro, instrutor policial, guarda-costas e dono de empresa de segurança, Borisov, 61, tornou-se premiê pela primeira vez em 2009.
Desde 2020, opositores e manifestantes o acusam de ter entregue o país a oligarcas privados –a Bulgária foi classificada pela ONG Transparência Internacional como o país mais corrupto da UE.
Membro mais pobre da União Europeia, a Bulgária foi gravemente atingida pela crise sanitária e tem a maior taxa de mortes por caso confirmado de Covid-19 no bloco –a cada 100 infectados, 4 morreram– e o menor número de vacinas aplicadas –média de 8,2 doses para cada 100 habitantes.
O número exato de cadeiras de cada partido deverá ser conhecido ao longo da semana –a comissão eleitoral tem até o dia 8 para divulgar o resultado oficial e até o dia 11 para anunciar os eleitos–, mas já é certo que Borisov terá que atrair outras siglas para garantir 121 dos 240 assentos e assegurar a maioria.
Uma das dificuldades pode ser a perda de um dos aliados no último governo, o ultranacionalista VMRO, que aparece com 4% dos votos, mínimo necessário para poder ocupar assentos na Assembleia.
Caso o Gerb fracasse na tentativa de montar um governo, a tarefa passará ao segundo colocado, o Partido Socialista Búlgaro, herdeiro do Partido Comunista da era soviética. Segundo a pesquisa, o PSB obteve 17,6% dos votos.
A principal surpresa foi a votação do populista Este Povo Existe (ITN), partido novo estrelado pelo músico e apresentador de TV Slavi Trifonov. A boca de urna atribui ao ITN mais de 15% dos votos –dois pontos percentuais acima do que ele vinha registrando nas sondagens pré-eleitorais.
Se o resultado se confirmar, ele abrirá vantagem clara para se consolidar como terceira força política no país, à frente do Movimento para os Direitos e Liberdades (DPS), que representa a minoria turca e muçulmana da Bulgária e aparece com 11% nas pesquisas.
Para analistas, o apresentador de TV capitalizou o sentimento antigoverno e antissistema, mas sua falta de experiência política dificulta prever se ele poderia se unir a um dos dois principais partidos tradicionais do país para tentar formar um governo.
A Bulgária aparece ao lado da Polônia e da Hungria como países “preocupantes” em relatórios da Comissão Europeia sobre Estado de Direito –principalmente em áreas como corrupção, liberdade de imprensa, liberdades civis e independência do Judiciário.
Borisov, porém, tem escapado dos holofotes habitualmente dirigidos ao premiê da Hungria, Viktor Orbán, e aos políticos do partido de direita Lei e Justiça, que governa a Polônia. Entre outros motivos, porque Borisov evita discursos iliberais agressivos, como os anti-imigração de Orbán ou os anti-LGBT na Polônia.
Além disso, analistas apontam diferenças importantes de grau no controle e na captura do Estado nos três países.
“A Hungria é já uma autocracia, enquanto a Bulgária ainda não. Na Bulgária há uma competição entre grupos criminosos pelo poder, mas nenhum é capaz de anular os outros”, afirmou o ex-ministro de Educação da Hungria Bálint Magyar, que pesquisa os chamados Estados mafiosos, após a principal onda de protestos em Sofia, em 2020.
Outra razão para a até então bem-sucedida blindagem de Borisov é que o Gerb integra o principal bloco do Parlamento Europeu, o Partido do Povo Europeu, ao qual também pertence a CDU (União Democrata-Cristã), da primeira-ministra alemã Angela Merkel.
Em outubro os eurodeputados aprovaram uma resolução de repúdio à “deterioração significativa do respeito aos princípios do Estado de direito, democracia e direitos fundamentais”, uma “contínua falta de investigações de corrupção com resultados tangíveis” e “a grave deterioração da liberdade da mídia”.
Embora não tenha implicação prática, foi um primeiro passo político para pressionar a União Europeia a sustar o repasse de fundos do bloco a governos acusados de desrespeitar regras democráticas.
Uma das principais acusações contra Borisov é que ele usa o dinheiro da UE para beneficiar oligarcas búlgaros.
Antes da boca de urna, o presidente Rumen Radev, crítico do premiê, disse que a Bulgária precisava de novas ideias. “Esta eleição será o primeiro passo da volta à normalidade, às leis e às regras.”
Fonte: FolhaPress