LEONARDO SANCHEZ
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Não dá para dizer que o público brasileiro de TV e streaming seja virgem quando o assunto é drag queen. É só dar uma olhada nas 12 temporadas de “RuPaul’s Drag Race”, que inspirou um spin-off –”All Stars”–, uma série só sobre seus bastidores –”Untucked”–, um especial de Natal e versões internacionais, além de ter popularizado expressões como “sashay, away” e “shantay, you stay”.
Esse sucesso chegou ao Brasil, que tem público cativo dessas atrações e uma legião de fãs de Mama Ru, como é carinhosamente chamado o apresentador RuPaul Charles.
E foi justamente nesse universo de saltos altíssimos, perucas gigantescas e muito carão que a Netflix buscou inspiração para o seu primeiro reality show 100% brasileiro.
Apresentado por Gloria Groove e Alexia Twister, “Nasce uma Rainha” tira do palco o sadismo das competições do formato americano, em que drags disputam prêmios e uma coroa de melhor participante, e adota um tom um pouco mais motivacional.
A dupla brasileira faz as vezes de madrinhas e ajuda os convidados a melhorarem suas habilidades em maquiagem, figurino, dança e passarela a fim de impulsionar as carreiras desses aspirantes a drags profissionais e os preparar para o palco. Também auxilia em questões pessoais, reconstruindo laços com parentes e amigos que são avessos à ousadia e ao brilho.
Por isso, a pegada de “Nasce uma Rainha” talvez se assemelhe mais à de outro reality famoso da plataforma, “Queer Eye”, em que cinco rapazes gays dão conselhos de moda, beleza, decoração, alimentação e vida social para tipos, digamos, chucros.
“O ‘Nasce uma Rainha’ não tem nada a ver com ‘RuPaul’s’. Não é uma competição, mas, por outro lado, também fala sobre o quanto a arte é transformadora”, diz Alexia Twister, uma das drags mais famosas da noite paulistana.
“Mas realmente não tem como a gente passar por um formato sobre drags sem mencionar a RuPaul, porque ela foi um divisor de águas”, diz Gloria Groove, cantora de “Bumbum de Ouro” e “Coisa Boa”.
“O que nós temos em comum é a humanização que acontece no nosso reality, o fato de mostrarmos o que está por trás dessa construção visual e artística de ser drag.”
“Nasce uma Rainha” por enquanto vai poder reinar sozinha em terras brasileiras. A expectativa era que uma outra produção fizesse frente a ela –uma versão completamente brasileira do próprio “RuPaul’s Drag Race”. Há poucos dias, no entanto, a Endemol, que havia comprado os direitos para a refilmagem, confirmou que havia desistido dela.
Ficou para o novo reality da Netflix a tarefa de abrasileirar o universo das drags da TV. Alexia Twister e Gloria Groove dizem que um dos principais objetivos do trabalho é extrapolar a bolha LGBT e falar para mais gente.
“A RuPaul abriu as portas do mundo drag para além da comunidade LGBTQIA+ e, em qualquer programa ou formato, a arte drag discute várias questões importantes. A gente vê tanta violência por causa de ignorância que poder entrar na casa das pessoas e trazer informação é educar. É de certa maneira salvar vidas –por que não?”, questiona Alexia Twister.
Na tentativa de informar, ela e Gloria Groove apadrinharam, num dos episódios, um drag king. Ainda pouco conhecidos até mesmo por quem frequenta a noite LGBT, esses artistas também se montam –como se diz ao entrar em sua persona drag–, mas em vez de replicar estilo e trejeitos femininos, enveredam para o gênero masculino.
O episódio se tornou um dos mais desafiadores para a dupla de apresentadoras. Segundo Gloria Groove, por ser uma expressão artística, a performance drag desafia barreiras de gênero, mas tanto ela quanto Alexia Twister costumam investir na feminilidade.
Ausentes na lista de participantes do “RuPaul’s Drag Race”, os drag kings são mais um dos pontos que separam “Nasce uma Rainha” do sucesso televisivo americano. Outro deles é o simples fato de o novo reality ser nacional, trazendo para o universo drag um estilo e linguagem bem brasileiros.
“Eu sou a primeira a ficar atenta às linguagens de publicidade usadas para promover o reality, às palavras em inglês que acabam escapando para dentro do roteiro”, diz Gloria Groove, porta-voz de um universo no qual gírias americanizadas são frequentes. “A gente tenta trazer uma perspectiva nacional nesse programa, até porque as drags trazem muitas referências de outras coisas e áreas da cultura.”
“Aqui no Brasil nós temos muito essa coisa do aculturamento, mas nós somos diferentes. Quem teve contato com drags gringas percebe como a nossa postura e a maneira como a gente performa são diferentes. São outras realidades”, concorda Alexia Twister.
Essas drags gringas foram as responsáveis por unir Alexia Twister e Gloria Groove, muito antes de “Nasce uma Rainha”. Elas contam que abriam shows para artistas estrangeiras que vinham se apresentar nas boates de São Paulo, em festas como a famosa Priscilla.
A primeira das apresentadoras, aliás, já apareceu em dois videoclipes do início da carreira de Gloria Groove. Mas ressalta que elas se aproximaram mesmo graças ao reality.
“Eu tenho um pouquinho mais de tempo de montagem –digamos assim, a idade toda da Gloria”, brinca Alexia Twister, sobre a diferença geracional delas. “Mas não importa o tempo de carreira, porque a gente se enxerga nos participantes deste programa.”
Programa que, para elas, quer expressar ao máximo o brilho e a cor do universo drag. “A gente mostra que a nossa arte, a nossa cultura, têm muito a oferecer, a dizer, a resgatar. Porque o drag nunca vai ser sobre o que está por fora, mas sim sobre uma transformação e um poder internos”, afirma Gloria Groove.
Cultura
Segunda-feira, 20 de janeiro de 2025
Dólar | R$ 5,18 | 0,000% |
Peso AR | R$ 0,03 | 0,164% |
Euro | R$ 5,59 | 0,000% |
Bitcoin | R$ 114.180,92 | 0,096% |
Termina nesta sexta prazo para prefeito explicar muro na Cracolândia
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, deve se manifestar ainda nesta sexta-feira (17), junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), sobre os motivos que levaram a prefeitura a construir um muro na Cracolândia, confinando, no local, pessoas em situação de vulnerabilidade. A intimação, dando prazo de 24 horas para a manifestação do prefeito, foi determinada...
Política
Taxação de estrangeiros vai resolver crise de moradia da Espanha?
Em meio à alta nos preços de imóveis, premiê defende imposto de 100% sobre imóveis comprados por cidadãos não residentes de fora da UE. Como o plano se compara a outros países onde faltam moradias a preços acessíveis?O mercado imobiliário espanhol está está passando por um grande boom. Nos primeiros nove meses de 2024, os...
No Mundo
Saiba onde comprar discos de vinil e jogar fliperama para embarcar na nostalgia em SP
Em plena era digital, enquanto a humanidade acompanha a evolução vertiginosa da inteligência artificial, o hábito de consumir produtos e serviços analógicos está (novamente) em alta na capital paulista.Com algum esforço, quem anda pelas ruas de São Paulo consegue comprar discos de vinil, revelar filmes, jogar fliperama e até provar comidas que foram famosas em...
Cultura
Bolsonaro se irrita com veto de Moraes a passaporte: “Não estou indo para uma festa
Bolsonaro pediu o documento de volta ao ministro para viajar aos Estados Unidos e acompanhar a posse do presidente eleito, Donald Trump, no próximo dia 20 O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) mostrou irritação nesta quinta-feira, 16, por ter tido o pedido de devolução de seu passaporte negado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre...
Política
Brasil terá maior imposto do mundo com IVA estimado em 28%
País ultrapassaria carga de 27% da Hungria; trava de alíquota pode impedir isso A regulamentação da reforma tributária como foi sancionada nesta quarta-feira (16) deve resultar em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) médio de 28% no Brasil, segundo estimativa apresentada pelo secretário extraordinário da reforma, Bernard Appy. A taxa levaria o país a ultrapassar a carga de alíquota aplicada na Hungria (27%),...
Economia
Aborto legal na França completa 50 anos como exceção mundial
Cinquenta anos atrás, estima-se que eram realizados 300 mil abortos clandestinos por ano na França. “Abortava-se em condições assustadoras, em cima de mesas de cozinha, frequentemente com hemorragias e sequelas para toda a vida”, lembra à reportagem a diplomata Claudine Monteil, na época uma jovem feminista.Tudo mudou em 17 de janeiro de 1975, quando foi...
No Mundo
BYD anuncia fim de contrato com construtora chinesa e cria comitê para obras em Camaçari
A BYD anunciou nesta quinta-feira, 16, que encerrou oficialmente o contrato com a construtora chinesa Jinjiang após o resgate de 163 trabalhadores que trabalhavam em condições análogas à de escravos na obra da fábrica de Camaçari (BA) no final de 2024. Foi contratada uma construtora brasileira que será responsável pelos ajustes exigidos pelo Ministério do...
Negócios