
Em entrevista exclusiva, David Vélez falou ainda sobre polêmicas tributárias, expansão internacional e modelo de trabalho
Em entrevista exclusiva concedida ao CNN Money, David Vélez, CEO do Nubank, rebateu críticas sobre a tributação de fintechs e falou sobre planos para obtenção de uma licença bancária.
Questionado sobre a possibilidade de adquirir um banco no Brasil para obter a autorização, Vélez não descartou essa hipótese.
“Anunciamos que estaremos procurando uma licença. Essa procura pode ser via aquisição ou vir do zero”. A medida atenderia à exigência do BC (Banco Central) de que instituições com “banco” no nome tenham efetivamente uma licença bancária.
O fundador do Nubank também falou sobre a expansão internacional da companhia.
“Quando a gente compara o México com o Brasil, o México está crescendo mais rápido que o Brasil para nós. Colômbia é mais rápido que o México”, revelou.
Nos Estados Unidos, onde o Nubank solicitou licença bancária, Vélez vê uma grande oportunidade: “Representa 50% do sistema financeiro global. Só mercados como o Texas já são maiores do que o Brasil, em termos de PIB”.
Tributação e modelo de negócios
Vélez foi enfático ao abordar a questão tributária, tema que ganhou destaque nas últimas semanas: “O Nubank, em 2025, tem sido a instituição financeira que mais imposto tem pago no Brasil, R$ 8,2 bilhões, com uma taxa efetiva de 32%, em comparação com a média dos bancos de 12%”.
Segundo ele, a discussão deveria focar no que as instituições efetivamente pagam, não no que deveriam pagar.
Sobre a possível elevação de impostos para fintechs em discussão em Brasília, Vélez afirmou que isso aumentaria ainda mais a carga tributária da empresa.
“O debate agora é sobre essa taxa nominal da CSLL. As fintechs estão pagando 15%, os bancos estão pagando 20%. O ponto não é necessariamente a taxa nominal, é a taxa efetiva”, explicou. O executivo defendeu uma taxa efetiva mínima de 17,5% para todas as instituições financeiras.
Leia a entrevista na íntegra
Nas últimas semanas, o Nubank esteve envolvido em uma polêmica daquelas relacionada à tributação, a quanto a instituição paga, já que o governo brasileiro discute este assunto com muita frequência nos últimos dias. Por que há uma percepção distinta do Nubank versus entidades de fora sobre a carga tributária de uma fintech como vocês?
Primeiro, o que eu queria deixar muito claro, porque tem sido bastante barulho sobre esse tema nas últimas semanas, é que a gente, como empresa, nossa obcecação é nosso consumidor, não nosso concorrente. E a gente não vai ficar se defendendo de muitos dos ataques que estão voando de um lado para o outro, nas últimas semanas, por parte de muitos concorrentes.
Respeitamos muito os bancos do Brasil e nós, principalmente como empresa, vinhamos trabalhando por 12 anos, trazendo mais concorrência nesse sistema financeiro, incluindo mais de 110 milhões de pessoas no sistema financeiro do Brasil e trazendo muito valor para a sociedade no Brasil.
Então, a nossa visão geral é não entrar nesses debates, mas quando existe esse tipo de acusação que claramente não é verdade, temos que deixar isso muito claro. No caso especificamente de impostos, como eu deixei muito claro em uma postagem que eu fiz no LinkedIn, o Nubank, em 2025, teria sido a instituição financeira que mais impostos pagou no Brasil: R$ 8,2 bilhões, com uma taxa efetiva de 32%, em comparação com a média dos bancos de 12%.
Nesse debate, o importante é, de fato, o que as instituições estão pagando e não o que deveriam estar pagando. O que, de fato, estamos pagando é 32%, uma taxa altíssima. Acho que não existe nenhum outro caso na história do Brasil onde uma startup de só 12 anos pagou mais de R$ 8 bilhões em impostos.
Então, acreditamos que, por mais que não temos vontade de entrar nessa briga, nessas discussões, seria importante deixar muito claro que as fintechs, incluindo o Nubank, estão contribuindo ativamente com o Brasil e pagando uma taxa altíssima em termos de impostos.
David, então, diante desses números que você nos traz, a discussão em Brasília sobre, eventualmente, uma majoração, uma elevação do imposto a ser cobrado de fintechs, não afetaria o Nubank ou aumentaria ainda mais esta carga que você nos informa?
Acho que aumentaria ainda mais essa carga, porque acho que o debate agora é sobre essa taxa nominal de CSLL. As fintechs estão pagando pagando 15%, os bancos estão pagando 20%.
Então, acho que o debate tradicional aqui deveria ser igual. Mas, de novo, o ponto não é necessariamente a taxa nominal, é a taxa efetiva. E as fintechs, incluindo a Nubank, não têm um histórico de décadas de operação no Brasil que permitem abater um monte de impostos.
Precisamente isso que permite aos bancos irem de uma taxa nominal de 40%, 45% a 12%, porque tem uma grande quantidade de jeitos para baixar essa taxa efetiva de juros. Então, não achamos que o problema está aí com as fintechs pagando mais imposto. Realmente, estamos pagando muito mais, além do que muitas das grandes instituições financeiras.
De novo, nossa taxa é de 33%, uma taxa efetiva da média dos grandes bancos de 12%. Acho que o foco do governo, se quer aumentar a arrecadação, deveria ser na taxa efetiva. É, de fato, o que todo mundo está pagando.
E é a taxa efetiva muito longe da taxa nominal. Nossa proposta foi ter uma taxa efetiva mínima nominal de 17,5% para todas as instituições financeiras. Então, todo mundo paga um mínimo.
Tem um mínimo que cada instituição vai pagar e desse jeito, realmente, é uma taxa justa que inibe essa grande quantidade de jeitos de pagar menos impostos.
Uma das maneiras que instituições financeiras historicamente fazem aqui no Brasil para pagar menos imposto é, por exemplo, fazer provisão de créditos duvidosos, assim reduzindo o lucro, ou, eventualmente, na aquisição de instituições financeiras com créditos tributários. O Nubank tem sido questionado a ter uma licença bancária no Brasil. Você imagina possível comprar um banco com licença bancária e, assim, resolver dois problemas ao mesmo tempo? Conseguir crédito tributário e ter uma licença bancária?
Eu acho que é possível. Tem essa nova resolução do Banco Central que obriga a qualquer instituição que tenha banco no nome ser banco. A gente tem uma história que é respeitar 100% todas as regulações, então a gente anunciou que vamos estar procurando uma licença bancária. Essa procura pode ser via aquisição ou pedindo uma licença do zero.
E, claro, tem algumas licenças bancárias que podem oferecer esse tipo de possibilidade. Imagino que provavelmente serão licenças menores, mas é algo que a gente vai considerar com certeza para atender essa demanda do Banco Central.
O Nubank também solicitou uma licença bancária nos Estados Unidos. Nos últimos anos, a frente internacional tem sido uma área muito importante no plano de negócios da casa. Eu queria te ouvir sobre até onde o Nubank quer chegar nos Estados Unidos, e também no México e na Colômbia, os outros países onde vocês já ficaram pé.
Se você observar no nosso C-DEC, quando levantamos nossos primeiros US$ 2 milhões em 2013, falávamos de uma tese que era global, de uma visão de que o futuro será serviços financeiros globais e dos bancos digitais.
Precisamente porque era a mesma transformação que todas as indústrias estavam tendo em todas as áreas. A Netflix entrando em mídia, o Uber entrando em transporte, a Amazon entrando em varejo.
Do mesmo jeito, as empresas de tecnologia que estavam em serviços financeiros iriam ter vantagens significativas em termos de prover melhores experiências para os consumidores a um custo menor. E dessas vantagens, era muito provável, pelo menos em nossa tese desde 2013, que o futuro de serviços financeiros globais vai ser 100% de bancos digitais.
Essa tendência tem sido relativamente devagar, tem sido basicamente 12 anos onde temos operado no Brasil, no México e na Colômbia. Ainda 97% das receitas globais de serviços financeiros do mundo são de bancos tradicionais com agências bancárias.
Isso com certeza vai mudar nos próximos 10 a 20 anos. Essa transformação tem acontecido mais devagar do que em outros setores, porque lógico, o serviço financeiro é mais regulado e tem certo tipo de inércia. Mas a vantagem competitiva dos modelos de negócios, modelos como a gente traz, fica cada vez fica mais clara, especialmente num mercado como o Brasil, onde já somos uma das maiores instituições financeiras.
Isso ao mesmo tempo que conseguiu oferecer um dos melhores produtos do sistema financeiro brasileiro, com uma lucratividade maior do que os bancos tradicionais e com uma grande satisfação para esses clientes.
Então, nos últimos 4 ou 5 anos, nossa jornada tem sido basicamente provar esse modelo do Brasil, levando para o mercado mais perto, como o México e a Colômbia.
Até agora, temos conseguido replicar muito bem esse modelo, quando comparamos o México com o Brasil. O México está crescendo mais rápido que o Brasil para nós, a Colômbia mais rápido que o México.
Somos hoje um dos maiores bancos do México, com mais de 14 milhões de clientes. 28% da população adulta mexicana é cliente do Nubank, parecido ao 60% da população adulta brasileira do Nubank.
Na Colômbia tem replicado [esse resultado], e agora, nos Estados Unidos, vemos uma grande oportunidade. [O país] representa 50% do sistema financeiro global. Só mercados como o Texas já são maiores do que o Brasil, em termos de PIB.
Então, Estados Unidos, pelo tamanho do mercado e pelas grandes oportunidades que oferecem, vai ser uma grande aposta do Nubank nos próximos anos. Mas, de novo, é o primeiro minuto, como falamos dentro da casa, e é só um passo mais em uma tendência, uma estratégia, uma tese de várias décadas, onde esperamos levar esse modelo do banca digital para muitos outros países e muitos outros continentes.
Você menciona o futuro do negócio, quando o Nubank nasce lá no bairro de Pinheiros, e a ideia de que os serviços financeiros serão digitais. Me parece muito clara essa tese e absolutamente vencedora. Ao mesmo tempo, o Nubank esteve, nos últimos meses, envolvido numa outra polêmica, que é a história do home office. Um banco que não tem agência, que não tem instalações físicas para os seus clientes, exigindo a volta ao trabalho presencial. Isso gerou ruído na comunicação com os trabalhadores, gerou ruído na comunicação com os clientes. Que lição ficou dessa história e o home office não cabe no Nubank?
Bom, acho que eu vejo essas duas comparações completamente sem relação. O fato como nos organizamos para desenvolver o melhor produto possível e o canal de distribuição.
Para construirmos os melhores produtos e serviços possíveis, precisamos de colaboração entre pessoas. Uma das coisas que nos demos conta nos últimos cinco anos é que essa colaboração, o ambiente de colaboração, o ambiente de inovação, precisa ter pessoas fisicamente em uma sala com uma grande parede branca para fazer brainstorming e para realmente pensar em como reinventar muito esses produtos.
Começamos e a gente trabalhou dentro dessa casinha [primeiro escritório da empresa] por seis, sete anos. Todo mundo indo ao escritório todos os dias.
O Uber é digital, o Amazon é digital, o Google é digital, mas todos trabalham no escritório. E qual é o jeito da empresa se organizar para criar e desenvolver os melhores produtos e serviços?
E só deixando um ponto bastante claro, nossa mudança ainda é uma mudança híbrido. Permite dois dias por semana em 2026 trabalhando de casa e depois três dias trabalhando no escritório.
Então, ainda achamos que o melhor do mundo é uma mistura, um híbrido, quando as pessoas conseguem se conhecer, conseguem ter essa colaboração, mas também conseguem trabalhar de casa em algumas das tarefas que realmente se dão mais produtividade trabalhando de casa.
O Nubank fez um trabalho, liderou um trabalho de bancarização absolutamente incrível do ponto de vista financeiro. Conseguiu levar muitos CPFs para os serviços bancários. Era um objetivo há muito tempo da indústria bancária no Brasil e que o Nubank conseguiu com o uso de muita tecnologia. Há muitos aplausos para este resultado, porém, há também muitas críticas sobre quanto estes clientes pagam em termos de taxa de juro, porque o juro médio do Nubank é maior do que seus concorrentes, inclusive com acusações de, eventualmente, um incentivo ao superendividamento das pessoas físicas no Brasil. Na tua percepção, esta acusação, esta análise, ela é verdadeira?
Bom, com certeza, superendividamento preocupa. Acho que é algo que olhamos com muito cuidado e temos desde o começo. Começamos com modelos muito conservadores em termos de crédito, porque um dos piores erros que poderíamos ter cometido era dar crédito demais e aí ter uma crise de endividamento. Teríamos perdido muita credibilidade que temos construído com os investidores na parte de crédito.
Mas essa comparação feita, realmente não é uma comparação intelectualmente honesta, pois muitas vezes quando essa comparação é feita, você está comparando maçãs com laranjas. Muitas das comparações estão comparando portfólios de bancos tradicionais que têm empréstimos com subsídios do governo – empréstimos de mortgages, empréstimos de auto, empréstimos consignado privado, consignado público – com outros tipo de empréstimo que não tem nenhum tipo de colateral.
Então, muitas vezes, quando você compara a inadimplência desses portfólios ou até a taxa de juros, logicamente vai ser diferente. São perfis de risco bem diferentes, são tipos de produtos completamente diferentes. Quando você faz a comparação ‘bananas com bananas’, você vê que temos um dos melhores juros do setor. E isso é uma das razões para que continuemos crescendo hoje tão rapidamente.
E hoje temos uma das maiores carteiras de empréstimo sem colateral do Brasil. E continuamos tendo uma das melhores NPS e métricas de qualidade do Brasil. Então, só ganhamos quando o nosso cliente ganha e trabalhamos muito. Utilizamos toda essa eficiência operacional do nosso modelo de negócios – o fato de que a gente não tem agências – para passar para o cliente final crescendo para cobrar menos.
Essa é a nossa meta como empresa: crescer para cobrar menos. Quando você faz a comparação ‘banana com banana’, por exemplo, empréstimo em consignado, olha a nossa taxa de consignado público, já operamos com juros 30%, 40% menores do que a média do mercado.
E assim, em produtos que oferecem esse tipo de comparação, ‘banana com banana’, dá para ver que estamos crescendo para cobrar menos. Além disso, existe toda uma parte de tarifas. Nós não cobramos tarifas. Muitos dos grandes bancos tradicionais ainda cobram muita tarifa.
O porcentagem da receita total de tarifa dos bancos brasileiros ainda é muito alta em comparação com os padrões internacionais. Nós cobramos basicamente zero tarifa, esse é um custo que o cliente termina pagando.
Então, de novo, acreditamos que a temos um modelo digital que tem conseguido crescer no Brasil.
Só para te dar um ponto, nos últimos cinco anos no Brasil, fomos de 30 milhões a quase 130 milhões de clientes. 100 milhões de pessoas tem entrado no Nubank nos últimos quase cinco anos, o que tem sido realmente uma revolução impressionante.
Acho que o Brasil não entende, às vezes, a incrível revolução que existiu nessa área de fintech e que foi realmente uma parceria entre o governo, entre um Banco Central que viu a oportunidade e a necessidade de concorrência em um setor que tinha cinco bancos representando 85% do setor.
Criou uma infraestrutura para outras 1.700 fintechs entrarem e hoje quem ganha é o consumidor que tem uma grande oportunidade de benefícios.
Realmente, essas comparações eu não concordo, acho que tem que ter uma análise muito mais intelectualmente honesta.
Fonte: CNN
