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De última hora, deputados aprovaram uma emenda chamada de ‘aglutinativa’. Pelo texto aprovado na Câmara, os governos estaduais poderão tributar – por exemplo – petróleo, minério de ferro, gás, energia e produtos agrícolas destinados à exportação.
Especialistas e empresas ligadas a questões tributárias expressam preocupação em relação a um artigo incluído de última hora na proposta de reforma tributária na Câmara dos Deputados, o qual abre espaço para a criação de um novo imposto.
Após a votação da reforma tributária, na noite da última quinta-feira (6), os deputados aprovaram uma emenda conhecida como “aglutinativa”, a qual consiste em um conjunto de propostas provenientes de diversos setores a serem anexadas ao texto principal. Esta emenda possui 35 páginas, e o artigo 20 tem suscitado preocupações entre os especialistas em tributação, uma vez que aborda um tema que não foi discutido em comissões ou grupos de trabalho na Câmara.
O mencionado artigo estabelece que “os estados e o Distrito Federal poderão instituir uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados, produzidos em seus respectivos territórios, com o objetivo de investir em obras de infraestrutura e habitação, em substituição à contribuição para fundos estaduais”. Portanto, de acordo com o texto aprovado na Câmara, os governos estaduais poderão tributar produtos como petróleo, minério de ferro, gás, energia e produtos agrícolas destinados à exportação. Essa contribuição permaneceria em vigor até 31 de dezembro de 2043.
Embora o artigo seja novo, os tributaristas destacam que trata-se de uma questão antiga. Alguns estados já cobram uma contribuição semelhante, e foram justamente esses estados que solicitaram a inclusão desse artigo na reforma. Dezenas de ações judiciais, inclusive no STF (Supremo Tribunal Federal), questionam essa cobrança.
Luiz Bichara, especialista em tributação, alerta que a criação de uma contribuição desse tipo é de competência exclusiva da União. Ele explica que alguns estados driblam essa proibição utilizando o que denominam de “fundos estaduais”, uma espécie de taxa obrigatória paga pelas empresas.
“Se a Constituição permitir a nova contribuição, então a prerrogativa da União de legislar sobre esse tipo de tributo e não dos estados perde sua validade, entendeu? Esse é o problema. Além disso, nem mesmo uma declaração passada do Supremo Tribunal Federal acerca da inconstitucionalidade desse tributo hoje impedirá sua cobrança amanhã. Pelo contrário, se a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) legitimar essa cobrança, teremos uma situação absurda em que um tributo que era considerado inconstitucional será constitucionalizado na PEC da reforma tributária”, afirma o advogado tributarista Luiz Gustavo Bichara.
Carlos Ari Sundfeld, professor de Direito da FGV, argumenta que o conteúdo do artigo precisa ser revisado no Senado, onde a reforma tributária ainda será discutida e votada.
“Isso é muito grave, pois outros estados estão cumprindo a legislação nesse sentido, e não faz sentido legitimar um contorno legal por mais 20 anos quando se está tentando corrigir o sistema tributário brasileiro. É algo que o Senado Federal precisa corrigir. É totalmente contraditório”, afirma Carlos Ari Sundfeld.
Economistas ressaltam que a essência da reforma é simplificar o sistema tributário sem aumentar a carga de impostos, ou seja, o peso dos tributos. Por isso, setores que podem ser afetados pelo artigo 20 se manifestaram contrários.
O Instituto Brasileiro de Mineração alega que o artigo da emenda contradiz a própria reforma e aumenta a carga tributária, gerando sérias repercussões para o setor empresarial e para as exportações brasileiras.
O Ministério da Fazenda não se pronunciou a respeito do artigo 20.
Em entrevista ao podcast O Assunto, na manhã desta segunda-feira (10), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, declarou que se reunirá com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, do PSD, para discutir os próximos passos da reforma.
“Nós não esperaremos o término do processo legislativo para enviar a segunda fase da reforma ao Congresso, pois ela precisa ser incluída no Orçamento. Portanto, assim como o marco fiscal e a PEC caminharam juntos, o Senado e o Orçamento terão que caminhar juntos. Além disso, para garantir as metas do plano fiscal do marco fiscal, será necessário que o Congresso analise essa segunda etapa junto com a proposta orçamentária”, afirmou Haddad.
Fonte: G1