Tecnologia
Terça-feira, 30 de abril de 2024

O metaverso ruiu? Não, continua vivo em games e aplicações industriais e comerciais

Com aplicações industriais, comerciais e em games, tecnologia pode ter futuro, mas há dificuldades a serem superadas

“Agora temos uma nova Estrela do Norte: ajudar a dar vida ao metaverso”. Foi assim que Mark Zuckerberg anunciou, em outubro de 2021, a troca do nome de uma das maiores marcas do mundo. O Facebook passou a se chamar Meta. Dois anos e dezenas de bilhões de dólares depois, a grande aposta da big tech entrou no segundo plano das atenções, com a explosão da inteligência artificial generativa. Mais distante do frisson do público, no entanto, o metaverso continua vivo nos games e em aplicações industriais e comerciais.

Embora a própria Meta esteja reavaliando seus passos e concentrando o foco no desenvolvimento de inteligência artificial geral (com capacidades similares às de humanos), o metaverso se tornou um caminho sem volta para a empresa de Zuckerberg, que despejou um caminhão de dinheiro e direcionou toda a sua estratégia para a tecnologia, avaliam especialistas ouvidos pelo IM Business. Apenas em 2023, a companhia registrou perdas de US$ 16,1 bilhões na sua linha operacional Reality Labs — de hardware, software e conteúdo de realidade aumentada, virtual e mista —, em função dos investimentos.

“Essa aposta que veio com a mudança de nome não deu certo como eles esperavam, mas vão continuar tentando”, diz Arnobio Morelix, CEO da Faculdade Sirius, especializada em Inteligência Artificial. Ele explica que uma das razões para que a empresa siga batalhando pela tecnologia é a desvantagem que a Meta leva em relação a concorrentes como Apple, Google e Microsoft, donas de plataformas para celulares e computadores como iPhone (iOS), Android e Windows. Para a Meta, essa plataforma pode ser a realidade aumentada.

Há, ainda, muitos desafios a serem superados por todas as empresas que continuam apostando em um metaverso. 

O primeiro é a acessibilidade. Usuários e diversas outras empresas acreditaram que o ambiente de convívio virtual em realidade aumentada era uma oportunidade única — à época, pipocaram notícias sobre pessoas comprando terrenos em metaversos por milhões de dólares. Esse cenário não se confirmou, em parte devido aos altos custos dos headsets (popularmente chamados de óculos) utilizados para “entrar” no mundo virtual.

“Um ponto de inflexão para o futuro das aplicações de metaverso é a criação de um headset de realidade aumentada barato, tão discreto quanto um par de óculos”, diz Gary Bolles, chair de futuro do trabalho da Singularity University. “A Magic Leap [desenvolvedora de displays para realidade aumentada] já arrecadou US$ 4,5 bilhões, mas o Magic Leap 2 hoje é útil principalmente para aplicações industriais”, completa. Óculos de realidade aumentada como o Magic Leap 2, Hololens (da Microsoft) e Apple Vision Pro não custam menos de US$ 3 mil.

É por essa razão que, nas empresas, o metaverso encontrou um caminho mais próspero. Com maior capacidade de investimento, as companhias estão dispostas a alocar recursos em realidade aumentada para reduzir custos e ganhar eficiência. Uma das pioneiras no que chama de metaverso industrial, a Siemens dedicou uma parcela relevante dos 6,2 bilhões de euros investidos em pesquisa e desenvolvimento no ano fiscal de 2023 na tecnologia. “É uma evolução dos gêmeos digitais que tratamos desde 2007”, diz Rafael Alves, head de Digital Enterprise da Siemens.

Evolução gráfica dos gêmeos digitais da Siemens (Foto: Divulgação)

Gêmeos digitais são cópias de uma planta fabril que tomam como base dados coletados por sensores nas linhas de produção. Sinalizam alterações de todas as naturezas que possam ocorrer em máquinas, processos e no ambiente em tempo real e transmitem as informações para uma ferramenta digital. Com o metaverso industrial, esses gêmeos se transformam em uma reprodução simulada em 3D da planta, interativa por meio dos óculos e sensores motores. É possível até desenvolver um protótipo antes da instalação física do ambiente.

“Cada empresa compra [a ferramenta] para uma utilização específica do seu negócio. Temos um cliente que está usando para o treinamento virtual de operadores com fotorrealismo, por exemplo”, diz Alves. Como resultado, o risco de acidentes de trabalho e custos de treinamento podem ser reduzidos, e equipamentos mais caros que não serão manuseados podem ser preservados. Tudo isso foi possível, segundo a Siemens, devido a um amadurecimento do ecossistema de realidade virtual. A empresa mantém parceria com a linha de GPUs para games da NVidia, para a construção do seu metaverso, e com a Sony, fabricante dos headsets que permitem a visualização do ambiente.

Os videogames do “metaverso”

“Experiências online imersivas — frequentemente agrupadas como “O Metaverso” — continuam desenvolvendo cases cada vez mais valiosos em games, educação, treinamento e RH”, diz Bolles, da Singularity University. Dois grandes exemplos são as febres Roblox e Fortnite. 

Two-thirds of all U.S. kids between 9 and 12 years old use Roblox, and it’s played by a third of all Americans under the age of 16, according to the company.

O primeiro game é uma espécie de quadro em branco em que os jogadores podem criar o seu próprio mundo virtual — em 2020, dois terços das crianças entre nove e 12 anos dos Estados Unidos jogavam o game, disse a desenvolvedora à Bloomberg. De outro lado, a Disney investiu US$ 1,5 bilhão na Epic Games, desenvolvedora do jogo online Fortnite, para aproveitar o ecossistema aberto do game para distribuição de produtos. “Tenho dificuldade em argumentar que isso já não seja um metaverso. Para mim, já é. É realidade no nosso dia a dia”, diz Morelix.

Um ambiente compartilhado em que as pessoas convivam por meio de realidade virtual, no entanto, parece ainda estar distante. Em 2016, Bolles organizou alguns eventos para a Open Metaverse Foundation e, à época, o consenso era que ainda havia um longo caminho até chegar em aplicações consistentes de “mobilidade de personalidade” em um ambiente digital. “O lugar onde a consistência é valorizada hoje é no hardware. Ainda é tão caro, que apenas alguns jogadores podem construí-los, então é aí que um grande número de desenvolvedores de software escolhe um único headset para oferecer suporte”, diz.

Mas avanços em inteligência artificial devem significar um novo ânimo para essa tecnologia. Seu potencial de simular áudio, imagens e vídeos capazes de representar o mundo podem baratear a criação de ambientes que respondam automaticamente às interações e comandos humanos no mundo físico.

Fonte: InfoMoney