No Mundo
Segunda-feira, 22 de julho de 2024

População da China está prestes a encolher pela 1ª vez em 60 anos

A maior nação do mundo está prestes a encolher.

A China representa mais de um sexto da população mundial.

No entanto, após quatro extraordinárias décadas durante as quais o número de habitantes do país aumentou de 660 milhões para 1,4 bilhão de habitantes, a população está prestes a diminuir neste ano, pela primeira vez desde a Grande Fome de 1959-1961 (fome generalizada que matou estimados 55 milhões de chineses).

Segundo números mais recentes do Escritório Nacional de Estatísticas da China, a população do país cresceu de 1,41212 bilhão para 1,41260 bilhão em 2021 — um aumento de apenas 480 mil habitantes, uma mera fração do crescimento anual de oito milhões ou mais, comum uma década atrás.

Embora a relutância em ter filhos diante das rígidas medidas impostas contra covid-19 possa ter contribuído para a desaceleração dos nascimentos, isso vem ocorrendo há anos.

A taxa de fecundidade total da China (nascimentos por mulher) era de 2,6 no final da década de 1980 — bem acima dos 2,1 necessários para compensar as mortes. Estava entre 1,6 e 1,7 desde 1994, e caiu para 1,3 em 2020, chegando a apenas 1,15 em 2021.

Para efeito de comparação, na Austrália e nos Estados Unidos a taxa de fecundidade total é de 1,6 nascimentos por mulher. No longevo Japão, é de 1,3. No Brasil, 1,7, segundo dados do Banco Mundial.

Para que a reposição populacional seja assegurada, a taxa de fecundidade não pode ser inferior a 2. Caso isso aconteça, o país passa a registrar declínio demográfico.

Isso aconteceu apesar de a China ter abandonado sua política de filho único em 2016 e ter implementado uma política de três filhos, apoiada por incentivos fiscais, no ano passado.

Há diferentes teorias sobre por que as mulheres chinesas continuam relutantes em ter filhos diante dos incentivos do Estado.

Uma das hipóteses se baseia na suposição de que muitas delas se acostumaram com famílias pequenas; outra está relacionada ao aumento do custo de vida, enquanto uma terceira aponta para o aumento da idade do casamento, o que atrasa os nascimentos e diminui o desejo de ter filhos.

Além disso, a China tem menos mulheres em idade fértil do que se poderia esperar.

Limitados a ter apenas um filho desde 1980, muitos casais optaram por um menino, elevando a proporção de sexo ao nascer de 106 meninos para cada 100 meninas (a proporção na maior parte do restante do mundo) para 120, e em algumas províncias para 130 .

Encolhimento — suposições razoáveis

A população total da China cresceu, depois da baixa pós-fome, a uma taxa de apenas 0,34 em 1000 no ano passado.

Projeções preparadas por uma equipe da Academia de Ciências Sociais de Xangai mostram que neste ano — pela primeira vez após a fome — essa proporção cairá em 0,49 em 1000.

Pessoas agitando bandeirinha da China

O ponto de virada chegou uma década mais cedo do que o esperado.

Em 2019, a Academia Chinesa de Ciências Sociais esperava que a população atingisse seu pico em 2029, com 1,44 bilhão de habitantes.

O relatório de Perspectivas Populacionais das Nações Unidas de 2019 previa o pico ainda mais tarde, em 2031-2032, com uma população de 1,46 bilhão.

A equipe da Academia de Ciências Sociais de Xangai prevê um declínio médio anual de 1,1% após 2021, reduzindo a população da China para 587 milhões de habitantes em 2100, menos da metade de hoje.

As suposições razoáveis ​​por trás desta previsão são que a taxa de fecundidade total da China caia de 1,15 para 1,1 entre agora e 2030, e permaneça nesse nível até 2100.

O rápido declínio terá um impacto profundo na economia da China.

A população em idade ativa do país atingiu seu pico em 2014 e deve encolher para menos de um terço desse patamar até 2100.

A expectativa é que a população idosa da China (com 65 anos ou mais) continue a aumentar na maior parte deste tempo, ultrapassando a população em idade ativa do país por volta de 2080.

Mais idosos e bem menos jovens

Isso significa que, embora existam atualmente 100 pessoas em idade ativa disponíveis para cada 20 idosos, em 2100, essa proporção será de 100 chineses em idade ativa para 120 idosos.

O declínio médio anual de 1,73% na população em idade ativa da China cria o cenário para um crescimento econômico muito menor, a menos que a produtividade avance rapidamente.

Os custos trabalhistas mais altos, impulsionados pela força de trabalho que encolhe rapidamente, devem expulsar a manufatura de mão de obra intensiva de baixa margem da China para países com abundância de mão de obra, como Vietnã, Bangladesh e Índia.

Os custos da mão de obra de manufatura na China já são duas vezes maiores do que no Vietnã.

Mais cuidados, menos manufatura

Ao mesmo tempo, a China será obrigada a direcionar mais recursos produtivos para a prestação de serviços de saúde, médicos e assistência a idosos para atender às demandas de uma população cada vez mais velha.

Cálculos feitos pelo Centro de Estudos de Políticas da Universidade de Victoria, na Austrália, apontam que, sem mudanças no sistema previdenciário da China, o montante gasto com pensões vai crescer cinco vezes, de 4% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços de um país) em 2020 para 20% em 2100.

Para nações exportadoras de matéria-prima como a Austrália ou o Brasil, essas mudanças provavelmente vão exigir uma reorientação das exportações para fabricantes fora da China.

Para os importadores de mercadorias, incluindo os Estados Unidos, a origem das mercadorias deve mudar gradualmente para centros de manufatura novos e emergentes.

Apesar das previsões de que este será “o século da China”, se depender das projeções populacionais, o gigante asiático pode ver sua influência se deslocar para outros locais —- inclusive para a vizinha Índia, cuja população deve ultrapassar a da China na próxima década.

Fonte: BBC News Brasil