Internacional
Quarta-feira, 3 de julho de 2024

Merkel deixa poder após 16 anos ao som de Nina Hagen e cerimônia militar

“Aos 16 anos, eu disse baixinho / quero, quero tudo ou nada”, diz a primeira estrofe de uma canção que músicos militares tocarão na noite desta quinta-feira (2) para a primeira-ministra Angela Merkel, na homenagem mais solene que um civil pode receber das Forças Armadas da Alemanha.
Chamada de Großer Zapfenstreich –em referência ao “grande toque” que lhe deu sua origem, no século 16–, a cerimônia vai marcar a saída do cargo de Merkel, 16 anos depois de ter sido eleita pela primeira vez como líder do governo alemão.
Mencionado pela primeira vez em 1596, o termo Zapfenstreich descrevia o toque de recolher para que os soldados deixassem a noitada e voltassem ao acampamento. Um oficial ou sargento percorria as estalagens acompanhado de um baterista e de um flautista, e batia nas pontas dos barris com seu bastão ou sabre.
Após esse toque, nem mais um trago de cerveja, vinho ou schnapps era permitido, todos os soldados deveriam se recolher, e a desobediência levava a punições severas. O costume militar foi descrito no manual “O Perfeito Soldado Alemão”, de 1726.
Transformada na mais solene cerimônia militar, é sempre realizada à noite, e todos os oficiais com patente de general, tenente-general, almirante ou vice-almirante têm direito a ela quando saem da ativa.
Sua forma atual foi criada em 1813, quando um rei prussiano incluiu uma apresentação de armas, uma oração e uma canção militar. A apresentação é rigorosamente coreografada e executada por duas formações de soldados, segurando rifles e tochas acesas, e uma banda marcial. Dura 20 minutos.
O ritual militar começa com um toque da banda marcial, chamadas para os soldados feridos e dispersos durante a batalha e uma saudação aos que tombaram mortos. Soldados tiram os capacetes, seguram-no em frente ao peito com a mão esquerda e ouvem uma oração musical. O hino alemão é tocado depois.
A “serenata”, onde são tocadas as músicas de escolha dos homenageados, não faz parte da cerimônia militar. Desde 1998, ela passou a ser feita também para autoridades civis, mas só presidentes, primeiros-ministros e ministros da Defesa podem ser homenageados por essa cerimônia militar.
Merkel deve se aposentar da política nas próximas semanas, quando o provável novo premiê, Olaf Scholz, for confirmado no cargo pelos deputados.
A cerimônia em sua homenagem começa às 19h30 (15h30 no horário de Brasília), no pátio da sede do Ministério da Defesa, em Berlim. Como os homenageados anteriores, ela pode escolher três músicas, que serão executadas pela banda militar.
A que fala do “tudo ou nada” aos 16 anos é “Deve Chover Rosas Vermelhas Para Mim”, de Hildegard Knef, que termina prevendo: “Devo conhecer milagres completamente novos /Devo desenvolver-me de novo longe do antigo”. A segunda escolha é o hino religioso “Grande Deus, Nós Te Louvamos”, de Ignaz Franz.
Na terceira canção, a primeira-ministra, apelidada de “mamãe” em seu país, política conservadora e dona de um estilo tradicional, surpreendeu os alemães. Merkel, 67, incluiu uma obra da roqueira Nina Hagen, que, como ela, cresceu e apareceu sua carreira na Alemanha Oriental.
Da mesma geração da primeira-ministra, Hagen se transformou em ícone do punk depois de partir para a Alemanha Ocidental, mas a música escolhida pela líder alemã é de sua fase pop anterior: “Você Esqueceu o Filme Colorido” foi lançada em 1974 e, segundo amigos de Merkel, ela a sabia de cor.
Por causa da pandemia de coronavírus, que tem provocado números recordes de novos casos da doença no país, o número de candidatos foi reduzido e não haverá recepção após a homenagem.
Grupos pacifistas criticam o evento e pedem sua abolição, por causa do destaque dado a ele durante o nazismo.

Fonte: FolhaPress/Ana Estela Sousa