Cultura
Sexta-feira, 29 de março de 2024

‘Friends’ realiza o desejo de todos na pandemia, reunir os amigos

TETÉ RIBEIRO –

Essa talvez seja a uma hora e 45 minutos mais esperada de toda a pandemia. É assim, compridão, o especial “Friends: the Reunion”, produzido pela HBO Max com uma intenção bem explícita –fazer o máximo de pessoas possível assinar a nova plataforma de streaming.
Também foi no serviço da gigante WarnerMedia que foi ao ar, nos Estados Unidos, a reunião do elenco de “Um Maluco no Pedaço”, série que lançou Will Smith. E é lá que estreará a nova temporada de “Sex and the City”, agora rebatizada de “And Just Like That…”, produção inédita que começa a ser filmada no próximo mês.
A HBO Max planejava chegar chegando nos Estados Unidos, onde foi lançado em maio de 2020. “Friends: the Reunion”, anunciado em fevereiro de 2020, era para ser o pontapé inicial do canal. Mas aí, em março, o mundo parou por causa da pandemia.
Foram um ano e meio de anúncios de novas datas e muitos adiamentos, mas nesta quinta (27), finalmente, o especial foi ao ar nos Estados Unidos –ele estreia no Brasil junto com o lançamento da HBO Max no país, em 29 de junho. E é tudo que uma reunião de um elenco deveria ser.
Não é um novo episódio. A ideia é reunir aqueles seis atores 17 anos depois do final da série e comemorar, relembrar, brincar, fofocar, rir junto. Aliás, como nós temos sonhado fazer com os amigos queridos de quem estamos distantes há mais de um ano.
A diferença é que eles estão em Hollywood, e os tais amigos queridos são também grandes estrelas.
O primeiro a abrir a porta do estúdio 24, onde está montado o cenário de “Friends” –o apartamento de paredes roxas de Rachel e Monica, o café Central Perk e seu sofá cor de mostarda, a sala do apartamento de Chandler e Joey, com as duas poltronas reclináveis– é David Schwimmer.
Ele anda pelo set, elogia a produção, larga uma mochila no sofá. Então, chega Lisa Kudrow. Os dois se abraçam, brincam com uma viga de madeira que tinha sido tirada do cenário mas que está lá na remontagem.
Quando chega Jennifer Aniston, a temperatura começa a subir. Ela logo brinca que vai precisar de uma caixa de lencinhos. Matt LeBlanc aparece com o jeitão despachado que mostrou na série “Episodes”, exibida entre 2011 e 2017, em que interpretava a si mesmo. (Quem perdeu, deve assistir voando. É de longe a melhor produção televisiva com a qual um dos atores de “Friends” se envolveu depois do final da série.)
Então Courteney Cox entra em cena, e por último, Matthew Perry, o garoto problema do elenco, que desde que saiu de “Friends” vem travando uma batalha pública contra o alcoolismo e o uso de drogas.
Os seis se sentam no cenário em que passaram tantas horas entre os anos 1994 e 2004, e, mesmo para quem não era fanático pela série, como é o meu caso, o momento é muito emocionante. Os seis estão mais velhos, exatamente 17 anos mais velhos, e aconteceu com os atores o que os personagens temiam que acontecesse com eles.
Viraram adultos, são homens e mulheres de meia-idade, com menos tempo de vida para vir do que aquele que ficou para trás. Alguns engordaram, outros tiveram problemas pessoais, pelo menos uma delas exagerou no botox.
A superprodução que foi essa reunião começa a dar as caras quando os seis são chamados para uma entrevista em um auditório montado ao ar livre no estúdio de filmagem, com o sofá do Central Perk posicionado bem em frente à fonte em que eles dançavam e se encharcavam na abertura de cada episódio ao som de “I’ll Be There For You”, do The Rembrandts.
O apresentador britânico James Corben é quem os anuncia, fazendo as vezes de mestre de cerimônia. O público se senta na arquibancada oval em frente a eles, para dar a mesma sensação das gravações dos episódios, feitas sempre com plateia. Agora, no entanto, as pessoas estão sentadas a um metro e meio de distância umas das outras. Esse é o único momento no especial em que o espectador é lembrado do estado do mundo aqui fora, do estranho distanciamento social imposto pela pandemia.
Corben faz uma entrevista simpática, divertida, sem assuntos espinhosos. Ninguém está ali para cutucar nenhuma ferida. Mas há uma revelação –dois dos atores da série eram apaixonados um pelo outro. Essa eu não vou contar aqui.
Aos poucos, vão aparecendo atores coadjuvantes, como os pais de Monica e Ross –Elliott Gould e Christina Pickles–, que estão sentados na arquibancada e pedem para fazer uma pergunta. Reese Witherspoon, que participou de episódios como a irmã de Rachel, dá um depoimento em vídeo. Fora ela, só o ator James Michael Tyler, o garçom Gunther, do café Central Perk, aparece virtualmente em um telão.
Os encontros que acontecem nessa uma hora e 45 minutos são de verdade, com abraços, beijos, lágrimas, e perdigotos saltando no ar nas várias vezes em que eles caem na risada lembrando de algum bastidor.
A entrevista é cortada por cenas da série, momentos dos seis atores assistindo a episódios e fazendo comentários, depoimentos dos criadores e roteiristas Marta Kauffman e David Crane e do produtor e diretor Kevin Bright, e o elenco em uma mesa redonda lendo roteiros como costumavam fazer durante as nove temporadas que ficaram no ar. A cada memória deles, uma do telespectador também vem à tona.
Os excessos ficam muito por conta do que os produtores acharam que deviam fazer para engordar o especial, e que no final não fazem a menor diferença. Lady Gaga canta o hit “Smelly Cat” ao violão com Lisa Kudrow. Em um desfile das roupas usadas pelos personagens, as modelos Cara Delevingne e Cindy Crawford exibem figurinos de cenas marcantes
Justin Bieber aparece de surpresa nesse desfile, e é um pouco constrangedor como uma parte do elenco de uma das séries mais populares de todos os tempos reage à aparição de uma estrela talvez tão brilhante quanto eles.
Mas, se não somam, essas participações também não chegam a atrapalhar. No fim das contas, “Friends: the Reunion” faz por aquelas seis pessoas com quem o público se acostumou a conviver o que todo mundo gostaria de fazer por si mesmo e pelos melhores amigos –promover um reencontro em que tudo vai bem, ninguém bebe demais, ninguém fala o que não deve e todo mundo exibe à flor da pele o afeto que sente pelo outro.
Pode ser culpa da pandemia. Assim como na vida, nos programas de TV, timing é –quase– tudo.

Fonte: FolhaPress