Com a vacina contra o novo coronavirus, a esperança pelo fim das restrições e a volta à vida pré-Covid-19, o ano de 2021 começou com uma expectativa de alta no preço dos produtos primários e um novo superciclo das commodities, algo fundamental para a economia brasileira, que é grande exportador. Nesta semana, porém, a alta dos preços em produtos como gás natural e petróleo ganharam um impulso a mais com as baixas temperaturas que atingiram com força pelo menos oito estados dos EUA e deixaram mais de 5 milhões de pessoas sem energia num dos invernos mais rigorosos do país. Suscetíveis a fatores sazonais, junto com o período de reaquecimento das economias mundiais, os preços estão subindo globalmente.
Temperaturas tão baixas a ponto de atingir o grau de congelamento dos combustíveis levaram o país a sofrer com a alta demanda por petróleo e gás de aquecimento ao mesmo tempo em que as maiores usinas do país tiveram de cortar a produção dos combustíveis, gerando apagões e deixando milhões sem energia elétrica. Como não poderia deixar de ser, o preço dos combustíveis disparou, antecipando o movimento previsto por muitos especialistas da área.
A aposta de Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, por exemplo, estimou antes mesmo da crise climática americana que o barril de petróleo atingiria 60 dólares com a retomada econômica mundial. Na terça-feira 16, os primeiros contratos futuros do petróleo encerraram nas bolsas de Nova York a 60,05 dólares o barril. A repentina alta se deve a uma crise pontual, mas ela endossa a expectativa de alta das commodities de energia neste ano.
A China foi o primeiro país a mostrar a força do consumo pós crise, dando sinais de como será a retomada da economia mundial quando o vírus for controlado. Primeiro a superar a pandemia, já no ano passado teve uma alta expressiva nas atividades industriais e também no consumo de commodities. Para a economia brasileira, que tem no asiático o seu principal parceiro comercial, essa foi uma notícia altamente promissora e fundamental para evitar uma queda maior do PIB em 2020. Entre os produtos, destacam-se soja, milho e açúcar.
Na soja, por exemplo, principal produto da balança comercial brasileira, o Brasil bateu recordes. A alta da demanda internacional foi tanta que as duas safras subsequentes brasileiras foram vendidas, o que pressionou os preços dos alimentos e levou a recordes históricos. Ainda assim, a expectativa para 2021 é de uma alta de 25% na média anual do preço dos grãos, de acordo com a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
Assim como ocorreu com a China, a perspectiva agora é que os demais países passem por esta recuperação econômica e industrial com o avanço das imunizações, o que certamente levará a um aumento das compras de commodities brasileiras como petróleo e minério de ferro. “Para retomar a economia precisamos de um aumento no consumo do petróleo e das commodities em geral e, como houve redução na produção atrás, teremos um ano de preços elevados em petróleo, gás e no próprio minério de ferro”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura.
Neste cenário, empresas como a Petrobras saem ganhando. Em janeiro, os papeis da companhia ultrapassaram os 31 reais, atingindo preços não alcançados desde 2010. Outra empresa brasileira beneficiada é a Vale do Rio Doce. No começo do ano, as ações da empresa na B3 quebraram recordes históricos e bateram 102 reais – até novembro do ano passado elas oscilavam em torno de 60 reais. Produtora de Minério de Ferro, do qual 70% é vendido para a China, a empresa se prepara para um ano aquecido. Após uma produção em 2020 estimada em 320 milhões de toneladas, a expectativa é de 350 milhões em 2021 e 400 milhões em 2022. O minério de ferro é o principal produto da empresa seguido por cobre, que também tem planos de ter a produção expandida, mais especificamente em Carajás e em 2022.
Superciclo pós crise do Subprime
Essa alta forte das commodities pós crise não é algo inédito e a última vez que ela ocorreu foi depois da crise econômica de 2008, do subprime. Na época, os preços do petróleo dispararam com a retomada econômica. E de acordo com um relatório do JP Morgan, o mundo está entrando no seu quinto superciclo de commodities desde o século XX. “Acreditamos que o último superciclo atingiu o pico em 2008 (após 12 anos de expansão), atingiu o ponto mais baixo em 2020 (após uma contração de 12 anos) e que provavelmente entramos em uma fase de alta de um novo superciclo de commodities”, diz Marko Kolanovic, estrategista do JP Morgan responsável pela pesquisa. Além da retomada econômica que liberará a demanda reprimida, Kolanovic cita os estímulos monetários e aumento dos gastos públicos como contribuintes deste quadro.
A forma como o superciclo de commodities impactou o Brasil em 2008, porém, tem diferenças agudas da que corre agora. “Naquela época a economia brasileira estava melhor que o mundo. O governo tinha condições de dar incentivos econômicos, mas agora não consegue mais. Por isso empresas como a Ford estão saindo do país”, diz Tharcisio Bierrenbach, consultor em cenários econômicos e finanças e ex-diretor do MBA da Faap.
A grande diferença é que agora o Brasil enfrenta uma crise econômica interna, com um alto déficit fiscal e o real desvalorizado. Sem tantos incentivos governamentais no mercado doméstico e uma queda da industrialização, o melhor para o país é focar no mercado internacional. “Câmbio desvalorizado, demanda internacional aquecida e retomada da economia mundial significa que 2021 continua sendo um bom ano para exportação”, diz Marcos Jank, professor de agronegócio global do Insper. Por isso, o superciclo de commodities é tão importante, sem dúvida elas são continuarão por um bom tempo as principais fontes de receita do país.
Fonte: Veja