Internacional
Quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

TPI considera culpado menino-soldado que se tornou senhor da guerra em Uganda

O Tribunal Penal Internacional (TPI) considerou, nesta quinta-feira (4), culpado de crimes de guerra e contra a humanidade Dominic Ongwen, um menino-soldado ugandense que se tornou comandante do grupo rebelde Exército de Resistência do Senhor.

“Estabeleceu-se sua culpa para além de qualquer dúvida razoável”, afirmou o juiz Bertram Schmitt, ao ler o veredicto sobre massacres cometidos nos anos 2000 por soldados liderados por Ongwen, que atualmente tem 45 anos e é chamado de “formiga branca”.

Ao todo, ele foi considerado culpado de 61 acusações, incluindo assassinatos, recrutamento de crianças-soldado e estupros, incluindo a primeira condenação por gravidez forçada de vítimas de escravidão sexual.

O Exército de Resistência do Senhor (LRA), então liderado por Joseph Kony, travou uma guerra em Uganda para estabelecer um Estado baseado nos dez mandamentos da Bíblia.

O julgamento começou há cinco anos no TPI e é único porque é a primeira vez que alguém que foi vítima e ao mesmo tempo suposto autor de crimes de guerra e crimes contra a humanidade comparece ao tribunal.

Dominic Ongwen foi raptado quando criança pelo LRA, a caminho da escola.

“O tribunal está ciente de que sofreu muito”, declarou o juiz Schmitt. “No entanto, esses são crimes cometidos por Dominic Ongwen como adulto responsável e comandante do Exército de Resistência do Senhor”, acrescentou.

Ele é o primeiro membro do LRA a ser julgado por massacres cometidos em Uganda e três outros países africanos.

Ongwen negou as acusações “em nome de Deus” e seus advogados pediram sua absolvição, alegando que ele foi vítima de brutalidade por parte do grupo rebelde.

O LRA foi fundado há três décadas por Joseph Kony, um ex-padre católico que se autoproclamou profeta. Ele iniciou uma rebelião contra o presidente Yoweri Museveni no norte de Uganda.

De acordo com a ONU, os rebeldes mataram mais de 100.000 pessoas e sequestraram 60.000 crianças durante operações que se espalharam para três outros países africanos: Sudão, República Democrática do Congo e República Centro-Africana.

– Comandante “feroz” –

Este julgamento marca “uma etapa importante, porque é a primeira e única vez que um caso do LRA é julgado no mundo”, comentou à AFP Elise Keppler, vice-diretora do programa de justiça internacional da ONG Human Rights Watch.

Com Ongwen como comandante, o LRA fez reinar o terror no norte de Uganda, especialmente com massacres nos campos de refugiados de Lukodi, Pajule, Odek e Abok, bem como o recrutamento de crianças-soldados.

De acordo com os promotores, Ongwen era um comandante “feroz” e “entusiasta” no comando da brigada Sinia de Joseph Kony, que sequestrava jovens e mulheres adultas para se tornarem servas e escravas sexuais.

No início do julgamento, a acusação exibiu vídeos gravados após um ataque ao campo de refugiados de Lukodi, a cerca de 20 km da capital regional, Gulu. Nas imagens aparecem crianças estripadas e corpos carbonizados de bebês.

“No total, 15 membros da minha família foram mortos no ataque e muitas pessoas ficaram feridas”, declarou à AFP Muhammed Olanya, um camponês de 38 anos de Lukodi.

Em outro ataque ao campo de refugiados de Odek em 2004, Dominic Ongwen ordenou que suas tropas “não deixassem nada vivo”, segundo os promotores.

Os advogados de Ongwen insistiram que seu cliente deveria ser considerado uma vítima do LRA pela lavagem cerebral em crianças-soldados, algumas das quais foram forçadas a matar seus próprios pais.

“O tribunal não encontrou nenhuma evidência na alegação da defesa de que ele sofria de doença mental ou que cometeu os crimes sob coação”, disse o juiz Schmitt.

Dominic Ongwen se rendeu em 2015 às forças especiais dos Estados Unidos que buscavam Joseph Kony na República Centro-Africana e foi transferido ao TPI, com sede em Haia, para julgamento.

Joseph Kony ainda está foragido e um mandado de prisão da CPI pesa sobre ele.

Fonte: IstoéDinheiro