Com reformas estruturais travadas no Congresso, o governo aposta em mecanismos extraordinários para diminuir uma dívida pública que deve encerrar o ano perto de 95% do PIB (Produto Interno Bruto) por causa dos gastos com a pandemia de Covid-19.
Sem os choques de longo prazo das reformas tributária e administrativa, que poderiam melhorar a confiança de investidores e eventualmente atrair recursos para o país, e com a demora na tramitação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial, o governo já se prepara para usar artifícios laterais que têm um impacto muito mais tímido nas contas públicas.
Em audiência pública na comissão mista no Congresso que acompanha as ações para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus, o ministro Paulo Guedes (Economia) afirmou em novembro que o governo vinha derrubando a relação dívida/PIB até o início da pandemia do novo coronavírus.
“Pois nós vamos derrubar de novo. Nós vamos derrubar de novo, seguindo os mesmos métodos”, afirmou. “Nós vamos desinvestir. Nós vamos privatizar. O Banco Central, enquanto estiver fazendo transferências, continua fazendo transferências. Nós vamos desalavancar os bancos públicos.”
Com exceção das privatizações, que não são consenso dentro do governo e, pelo menos no caso da Eletrobras, ficaram mais distantes após a série de apagões no Amapá, algumas das medidas devem sair do papel e aliviar o endividamento. O plano de Guedes também prevê a venda de imóveis da União.
Especialistas alertam, no entanto, que ações desse tipo são pontuais, servem apenas para que o governo ganhe um fôlego e não dispensam a implementação de reformas estruturantes e medidas de ajuste fiscal efetivo.
Para acalmar o mercado, Guedes afirmou na semana passada que a situação está sob controle e citou as medidas extraordinárias ao explicar a estratégia do governo.
Em videoconferência, o ministro afirmou que, dos R$ 600 bilhões em títulos públicos a vencer nos primeiros quatro meses de 2021, metade já está garantida pelo governo.
Segundo ele, R$ 200 bilhões virão de transferência de lucro do Banco Central para o Tesouro. Outros R$ 100 bilhões terão origem na devolução de recursos de bancos públicos à União.
“Não achamos que estamos em uma situação dramática. Se nossas reformas avançarem, isso vai acontecer com muita tranquilidade”, disse.
Para os trabalhos no Congresso, técnicos da equipe econômica elencaram algumas propostas em uma pauta considerada prioritária.
Na área de produtividade, defendem a votação ainda neste ano de projetos considerados menos polêmicos, como os marcos regulatórios do gás e de cabotagem.
Na área fiscal, a avaliação é que seria importante avançar com a PEC Emergencial. É dentro dela que o governo tenta encaixar o Renda Brasil, programa que busca substituir o Bolsa Família, marca de gestões petistas. Porém ainda não há acordo sobre a proposta e a votação pode ficar para 2021.
A maior dificuldade tem sido encontrar uma fonte de financiamento que permita ampliar o número de beneficiários do programa.
A principal aposta para este ano, considerada mais factível, é o projeto de lei complementar que libera R$ 177 bilhões para aliviar o endividamento.
De autoria do deputado Mauro Benevides Filho (PDT-CE), o texto propõe usar o saldo do superavit financeiro de 29 fundos públicos para compensar parte da queda da arrecadação da União e melhorar a trajetória da dívida pública.
Segundo Benevides Filho, a intenção foi encontrar fontes de recursos para dar ao governo a capacidade de arcar com os programas de auxílio que precisou implementar para enfrentar a pandemia.
“Em vez de ir ao mercado e vender título público, ele vai pagar dívida pública com os recursos dos fundos”, disse.
No Congresso também estão os principais entraves ao governo no momento, entre eles a votação do Orçamento de 2021. A disputa pela sucessão à Presidência da Câmara travou a instalação da CMO (Comissão Mista de Orçamento).
Sem um acordo, é possível que a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) seja votada neste mês diretamente no plenário, enquanto a LOA (Lei Orçamentária Anual) ficaria para depois de fevereiro, quando a sucessão presidencial na Câmara já estará resolvida.
Até lá, a PEC Emergencial pode ser aprovada e promulgada, o que abriria espaço no apertado Orçamento de 2021, que tem R$ 96,1 bilhões de gastos discricionários (não obrigatórios).
Desse valor, apenas R$ 28,7 bilhões foram reservados para investimento, enquanto cresce no governo a pressão para o aumento dos gastos com obras.
Fonte: BizNews