JULIO WIZIACK E DANIELLE BRANT
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Em meio a dificuldades de conciliar posições diferentes sobre a navegação entre portos nacionais (cabotagem), a Câmara tenta votar novamente nesta semana o texto que cria a BR do Mar, projeto do governo que busca reduzir a dependência do transporte rodoviário no país.
A proposta foi apresentada pelo Executivo em agosto com uma mensagem de urgência para a votação. Na prática, isso significa que desde o final de setembro o projeto está impedindo a apreciação de outras matérias, especialmente aquelas relacionadas à pandemia.
Essa situação já fez aumentar a resistência ao projeto no Congresso. Os parlamentares afirmam que o ministro Tarcísio Freitas (Infraestrutura) havia se comprometido a retirar a urgência do texto, para que ele fosse debatido com calma.
Líderes partidários na Câmara advertem que, se isso não ocorrer, nada será votado. O relator do texto, deputado Gurgel (PSL-RJ), diz que está buscando uma solução para os pontos controversos do texto.
O lobby de representantes das empresas e associações de cabotagem também gerou mais preocupação nos congressistas, que querem debater o projeto sem pressão.
“Defendemos a concorrência limpa e não um emaranhado de normas para proteger os amigos do rei”, disse Abrahão Salomão, diretor da Logística Brasil, associação que representa os usuários dos portos. “Lamento em dizer que a BR do Mar é isso. E com um potencial devastador tremendo para a indústria local. Ele confere status de brasileiro a embarcações estrangeiras, o que, na prática, cria uma reserva de mercado para as seis grandes do exterior que já operam com navios de fora aqui no Brasil.”
Salomão é presidente da Posidonia Shipping, uma empresa que tem contratos com empresas do porte da Alcoa, Raízen e Vale, e apólices de seguros contratadas com bancos de mais de R$ 1 bilhão.
“Com esse projeto o governo está dizendo que eu não posso operar. O diabo mora nos detalhes e os dispositivos desse projeto impedem a concorrência com o estrangeiro em igualdade de condições”, disse. “Que liberalismo é esse?”
Hoje, a lei permite que uma empresa possa afretar uma embarcação estrangeira para transporte caso não haja navio nacional disponível. Essa busca é realizada eletronicamente.
Com a BR do Mar, os estrangeiros serão tratados como nacionais. O problema, segundo as empresas, é que o custo de uma embarcação estrangeira é muito menor.
Segundo dados do Ministério da Infraestrutura, uma operação de navio com bandeira brasileira pode custar até 70% mais caro do que a realizada por uma embarcação estrangeira na modalidade de afretamento por viagem ou a tempo (durante a colheita de uma safra, por exemplo.
A cabotagem é feita apenas pelas EBNs, as empresas brasileiras de navegação, que precisam de autorização da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e podem ter capital 100% estrangeiro. Essas empresas podem ter frota própria ou afretar navios.
O projeto em tramitação na Câmara amplia o leque de possibilidades em que as EBNs poderão afretar navios e também retira a obrigatoriedade de que tenham embarcações próprias.
“A intenção é que a cabotagem assuma em volume e frequência o que é feito por caminhão, e criar uma rota frequente entre Nordeste e Sul”, explica o advogado Nilton Mattos, sócio do escritório Mattos Filho.
Não por acaso, representantes dos caminhoneiros pressionaram suas bases no Congresso contra o projeto e ameaçaram fazer uma paralisação caso o projeto avance da forma como foi enviado.
A ideia de desenvolver a navegação de cabotagem ganhou força no governo depois de maio de 2018, ainda no governo do presidente Michel Temer, quando o Brasil parou por causa de uma paralisação de caminhoneiros que durou pouco mais de uma semana.
O impacto no PIB (Produto Interno Bruto) gerou discussões sobre a necessidade de diversificar as opções de escoamento de cargas no país e, com isso, minimizar os reflexos de futuras paralisações.
O problema para os caminhoneiros é que um dos dispositivos do projeto delega poderes aos grupos estrangeiros de selecionar as empresas de frete rodoviário quando a carga chegar no porto mais próximo do destino final.
Isso vai tirar não só quilometragem no transporte por terra como restringirá o poder de negociação do valor do frete pelos caminhoneiros junto ao dono da carga. A empresa de cabotagem, segundo o setor, passará a ser a única negociadora com o produtor ou comprador.
Para a advogada Livia Amorim, sócia do escritório Souto Correa Advogados, com o projeto, o governo busca aumentar o número de contêineres transportados por ano – a ideia é ampliar em 40% a capacidade da frota marítima dedicada à cabotagem nos próximos três anos.
Para o governo, o texto tenta reduzir a volatilidade nos preços do frete marítimo quando a disponibilidade de embarcações no mercado internacional diminui por causa de um aumento de demanda – como na China, por exemplo.
Essa incerteza afeta a regularidade das rotas e mantém a dependência do transporte rodoviário no país.
Para isso, o BR do Mar prevê que a empresa habilitada possa afretar por tempo embarcações de uma subsidiária estrangeira nos casos de contratos de longo prazo e para prestação de serviços especiais de cabotagem por até quatro anos.
Ao retirar a obrigatoriedade de que a empresa possua frota própria, a intenção é reduzir custos e dar agilidade ao mercado. Seria possível a uma companhia autorizada operar no transporte de cabotagem sem precisar investir pesado na construção de um navio, por exemplo.
A Abac (Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem) critica a medida. “Empresa de navegação sem embarcação é uma aberração. Por que traríamos isso a um mercado que precisa crescer?”, questiona Cleber Lucas, presidente da entidade. Na avaliação dele, para garantir a atividade no Brasil seria preciso exigir que a empresa tivesse ao menos parte de frota própria.
Lucas equipara uma companhia que opera sem navios próprios a uma empresa de transporte rodoviário sem caminhões.
Ele afirma que uma empresa que afreta embarcações tem pouco compromisso com a atividade e que isso pode ser um entrave à regularidade de rotas. “Quando você só tem embarcação afretada, você fica sujeito à disponibilidade no mercado internacional. Se há aquecimento, os navios vão sumir daqui. É um agenciamento que não favorece o desenvolvimento da atividade no Brasil”, afirma.
O projeto também tenta destravar o acesso a crédito a empresas de navegação nacionais. Para isso, permite que esses navios possam ser dados em garantia para obtenção de financiamento.
“Isso dá oportunidade a empresas, pois os bancos ficam mais confortáveis para estruturar as garantias”, afirma Nilton Mattos, sócio do escritório Mattos Filho.
Procurado, o Ministério da Infraestrutura afirmou que o objetivo do projeto “é justamente o contrário de criar uma reserva de mercado”.
“A iniciativa vai proporcionar a abertura ao mercado, com responsabilidade e equilíbrio, ampliando a concorrência no setor”, informou. Segundo a pasta, a proposta tem sido “amplamente discutida” desde o ano passado e “tem o apoio expresso da comunidade portuária, trabalhadores marítimos, setores que utilizam o cabotagem e da Frente Parlamentar do Agronegócio.”
O ministério negou ainda impacto negativo para o transporte rodoviário de cargas e afirmou que a BR do Mar reduzirá custos e aumentará a atividade econômica, “o que implica mais trabalho para todos, inclusive caminhoneiros”.
Política
Quarta-feira, 11 de setembro de 2024
Dólar | R$ 5,18 | 0,000% |
Peso AR | R$ 0,03 | 0,164% |
Euro | R$ 5,59 | 0,000% |
Bitcoin | R$ 114.180,92 | 0,096% |
Setor de serviços cresce pelo 2º mês seguido e renova patamar recorde, diz IBGE
O volume de serviços prestados no país teve expansão de 1,2% em julho. na comparação com junho, informou nesta quarta-feira, 11, o IBGE. Foi a segunda alta seguida do setor que, com o resultado, renovou seu patamar recorde de atividade no país. O resultado surpreendeu e ofuscou a expectativa em pesquisa da Reuters de um...
Economia
Rússia começa contraofensiva em região invadida pela Ucrânia
Pouco mais de um mês após terem sofrido a primeira invasão estrangeira desde 1941, as Forças Armadas da Rússia começaram uma contraofensiva na região meridional de Kursk, parcialmente ocupada pela Ucrânia.A ação começou na terça (10) e foi confirmada nesta quarta (11) pelo general Apti Alaudinov, comandante da unidade de forças especiais tchetchenas Akhmat, principal...
No Mundo
Tabata diz falar de ‘coisas chatas’ e incorpora apelido ‘Chatabata’ difundido por Marçal
Depois de “para-choque de comunista”, Pablo Marçal (PRTB) passou a chamar Tabata Amaral (PSB) de “Chatabata”. Agora o apelido, cunhado no debate na TV Gazeta no último dia 1º, tem sido usado pela própria candidata.“É ‘Chatabata’ como estão me chamando, né?”, disse ela, rindo, durante sabatina promovida pela Jovem Pan na noite de segunda-feira (9)....
Política
Brasil volta a jogar mal e perde para o Paraguai nas Eliminatórias da Copa
Seleção Brasileira perdeu por 1 a 0, com direito a golaço O Brasil voltou a perder nas Eliminatórias da Copa do Mundo. Nesta terça-feira (10), a Seleção Brasileira foi derrotada por 1 a 0 pelo Paraguai, no Estádio Defensores del Chaco, na oitava rodada do torneio continental. Em mais um jogo ruim do Brasil, o...
Esportes
Conheça o Pulso Hotel, novo oásis de luxo em SP com diárias a partir de R$ 2,5 mil
Para disputar o concorrido mercado hoteleiro da capital paulista, o recém-inaugurado Pulso Hotel reflete contemporaneidade em todos os espaços e é eleito um dos mais bonitos do mundo São Paulo é pulsante. É onde tudo acontece, dos negócios ao lazer. Há quem não goste, mas quem gosta, se encanta pela efervescência que só existe na...
Negócios
Além de impeachment, oposição fala em apreender e acessar telefone de Moraes em documento
Documento ainda não está no sistema oficial do Senado, mas foi compartilhado nesta terça-feira (10) Além do impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a oposição no Congresso Nacional fala na apreensão e na quebra de sigilo de telefones, computadores, tablets e outros aparelhos eletrônicos pessoais e funcionais do magistrado. A ideia consta...
Política
Israel não tinha informações necessárias para resgatar reféns mortos, diz porta-voz
Seis prisioneiros do Hamas foram mortos no início do mês, segundo militares israelenses As forças israelenses não “tinham a inteligência” necessária, ou seja, as informações, para a missão de resgate dos seis reféns cujos corpos foram recuperados de um túnel na Faixa de Gaza no início deste mês, disse o porta-voz chefe das Forças de Defesa...
No Mundo