Internacional
Segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Bolhas sociais reagrupam e dividem pessoas no descongelamento belga

ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) – As lojas reabriram na Bélgica nesta segunda (11), mas a grande sensação do descongelamento são as bolhas sociais, apelidadas de “coronabolhas”: cada família (pessoas que vivem juntas, seja qual for o número) pode receber outras quatro pessoas, por determinação do governo.
O problema é que precisam ser sempre as mesmas quatro, e, uma vez escolhidas, elas não podem mais ser mudadas. “Por exemplo, se a família escolher coletivamente os quatro avós, não será mais possível convidar temporariamente amigos”, diz o comunicado do governo belga.
Além disso, se alguém de uma família aceita um convite, mesmo que só ele faça a visita todos os que moram na sua casa entram para essa bolha social e não podem mais receber outras pessoas nem visitar outras famílias.
Um solteiro que more sozinho pode convidar dois casais sem filhos ou quatro amigos que moram sozinhos, mas essa bolha não poderá mais absorver ninguém nem se intercomunicar com outras.
O objetivo é não apenas limitar os contatos, mas criar comunidades fechadas. Se um dos membros for identificado como portador do coronavírus, será fácil rastrear e isolar os contatos.
Avós e netos podem formar uma bolha, mas, como é preciso manter o distanciamento, eles não devem ficar responsáveis por cuidar das crianças. “Obviamente, não é possível visitar as pessoas da sua bolha se uma delas estiver doente”, acrescenta o governo.
A única exceção é para os dois amigos com quem os belgas estão autorizados a praticar esportes. Essas duas pessoas não farão parte da bolha social, mas terão que ser sempre as mesmas e manter a distância de 1,5 metro.
Segundo a primeira-ministra da Bélgica, Sophie Wilmès, o esquema foi criado porque “a separação física dos que amamos estava ficando insuportável em alguns casos”. Não por acaso, a permissão começou a valer no domingo, Dia das Mães, e não na segunda, quando todo o comércio reabriu.
Os agrupamentos têm outras regras: a distância física de 1,5 metro deve ser respeitada e, de preferência, os encontros devem ser em um terraço ou jardim.
Apesar da perspectiva de poder reencontrar com frequência pessoas queridas, a escolha de quem vai fazer parte de sua bolha não está sendo fácil para muitos moradores de Bruxelas.
Tofik Sawaya, 67, dono de uma quitanda na cidade, diz que a decisão tem provocado discussões com sua mulher, Jamila, porque nem ele gosta dos maridos das amigas dela nem ela aprecia as mulheres dos amigos dele. Famílias de segundo ou terceiro casamento, em que meios-irmãos ou meios-netos podem ser considerados de outra bolha, também são uma complicação.
A estudante de arquitetura Madeleine Dubois, 24, que mora sozinha, brinca que só vai tentar cooptar logo amigos que tenham um jardim, antes que eles sejam capturados por outros círculos.
O governo não divulgou como as bolhas serão fiscalizadas, disse apenas que “conta com a responsabilidade de todos em aplicar corretamente esses contatos sociais limitados”.
Os jornais deste final de semana mostraram que é uma expectativa otimista. Às 23h30 do sábado, depois de bater por várias vezes na porta de um apartamento em Bruxelas, policiais encontraram 17 pessoas que participavam de uma festa, proibida pelas regras do “lockdown”.
Com 53.449 casos confirmados até esta segunda (11) e 8.707 mortes, a Bélgica tem 75 mortos por 100 mil habitantes, a maior taxa do mundo entre países com mais de 1 milhão de habitantes.
O número, porém, reflete o fato de que são incluídas também mortes suspeitas de terem sido causadas pelo coronavírus, e mais da metade das vítimas estava em residências para idosos, na região de Flandres.
Outras estratégias da desescalada em Bruxelas Somos todos pedestres – o pentágono que forma o centro da cidade virou zona de convívio, com placas em todas as vias que dão acesso a ele avisando que as ruas serão compartilhadas por carros, pedestres e ciclistas. As pessoas poderão caminhar por toda a via pública, e não apenas pela calçada, para garantir o distanciamento de 1,5 metro. Em princípio, a zona dura três meses.
Somos todos ciclistas – a capital belga vai transformar 40 km de faixas de carros e vagas de estacionamento em ciclovias. No centro da cidade, veículos motorizados não podem passar de 20 km/h, devem garantir distância de ao menos 1,5 metro dos ciclistas e dar prioridade a eles e os pedestres.
Mão única para pedestres – Nas principais ruas comerciais, como a Neuve, a mais movimentada da cidade, o trânsito de pedestres foi regulado para evitar aglomerações. Grades dividem a rua por todo o comprimento, criando duas faixas de mão única.
Máscaras com hora marcada – o uso de máscaras passa a ser obrigatório no transporte público, e a cidade vai fornecê-las a maiores de 12 anos. Para recebê-las, porém, é preciso fazer o pedido por um número de telefone gratuito ou por e-mail. Será marcado um horário e um local para a entrega, para evitar filas e aglomerações, e só uma pessoa por família deve comparecer para buscá-las.
Não é trote – o governo avisou que o rastreamento de contatos de quem tiver coronavírus confirmado será feito por telefone e SMS. A administração divulgou os números e pediu que toda a população os anotasse em seus contatos, para ter certeza de que os telefonemas não são trote nem golpe. Os rastreadores vão pedir a quem tiver diagnóstico de coronavírus que identifique pessoas com quem se encontrou nos dias anteriores e darão orientações de saúde.