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Na esteira da proposta de Donald Trump para remover os palestinos da Faixa de Gaza, o governo de Israel determinou que o Exército do país prepare um plano para o que chamou de “saída voluntária” da população do território em ruínas.
A medida foi anunciada nesta quinta (6) pelo ministro Israel Katz, da Defesa. “Dei instruções para preparar um plano que permita a saída de qualquer residente de Gaza que deseje, para qualquer país que queira aceitá-los”, disse.
“O plano incluirá opções de saída através de passagens terrestres, bem como arranjos especiais para saídas por mar e ar”, afirmou, sem mais detalhes. A ideia foi celebrada por líderes da extrema-direita que sustenta o governo de Binyamin Netanyahu, como o ex-ministro Itamar Ben-Gvir e o titular das Finanças, Bezalel Smotrich.
Falando à Fox News, emissora associada ao trumpismo, o premiê elogiou a proposta de Trump, que atraiu condenação praticamente universal após ter sido feita na noite de terça (4). “Quero dizer, o que há de errado com isso? Eles podem sair, podem depois voltar, podem se realocar e voltar. Mas é preciso reconstruir Gaza”, disse.
A formulação é semelhante à adotada pela Casa Branca após o estrago diplomático da fala em tom de agente imobiliário de Trump, que sugeriu que os Estados Unidos enviassem tropas para tomar Gaza e transformá-la em uma “Riviera do Mediterrâneo”.
Nem Netanyahu entendeu direito o que Trump sugeria, dizendo na entrevista que não acreditava no envio de tropas ou no financiamento americano da reconstrução de Gaza, arruinada após a guerra iniciada pelo ataque do grupo terrorista Hamas, que a governava desde 2007, no 7 de outubro de 2023.
Tal medida contraria todo o discurso de Trump desde que foi eleito pela primeira vez em 2016, prometendo desengajar os EUA de conflitos mundo afora, a começar pelo Oriente Médio.
De todo modo, o premiê elogiou Trump. “Esta é a primeira boa ideia que ouvi. É uma ideia notável, e acho que deve ser realmente perseguida, examinada, perseguida e realizada, porque acho que criará um futuro diferente para todos”, disse o premiê.
O conflito, que deixou 1.200 mortos no primeiro dia da ação palestina e mais de 47 mil em Gaza nos meses seguintes, está congelado desde o dia 19 de janeiro. Troca de reféns israelenses por prisioneiros palestinos estão em curso na primeira fase do frágil cessar-fogo.
Aliados dos EUA na Europa e rivais, como Rússia e China, além dos palestinos, condenaram a proposta de Trump. No Brasil, o presidente Lula (PT) a chamou de incompreensível e voltou a acusar Tel Aviv de genocídio em Gaza.
Alguns observadores acreditam que o presidente americano só quer forçar uma negociação partido de termos maximalistas, obrigando os vizinhos árabes que historicamente lavam as mãos quando o assunto é a Palestina a participar ativamente.
No fim de janeiro, Trump havia lançado a ideia pela primeira vez, dizendo que países como Egito e Jordânia deveriam receber os palestinos, algo que na visão deles repete a nakba, árabe para tragédia, o processo de expulsão dos moradores durante a guerra da independência de Israel, em 1948.
Grupos de direitos humanos e a ONU apontam que, na prática, a ideia do americano equivale a uma limpeza étnica, e que não existe algo como uma saída temporária.
O presidente americano se apoia numa realidade de solo: segundo a ONU, cerca de 90% dos edifícios de Gaza estão destruídos ou arruinados. A reconstrução, que muitos apostam ser um projeto que vai cair no colo de petromonarquias do golfo Pérsico como o Qatar, deve durar décadas e custar uma fortuna.
Reagindo às críticas europeias, o ministro Katz sugeriu que países como a Espanha seriam “obrigados legalmente” a então receber os palestinos. “A terra dos gazenses é Gaza, e ela deve ser parte do futuro Estado palestino”, disse à rádio espanhola RNE o chanceler Juan Manuel Albares.
Pela paz firmada entre Israel e os palestinos em 1994, chancelada pela ONU, a ANP (Autoridade Nacional Palestina) deveria formar o embrião de um país na Cisjordânia e em Gaza, cimentando a chamada solução dos dois Estados que Trump desconsidera.
Múltiplos fatores demoliram o plano ao longo dos anos, como a cisão palestina após a vitória eleitoral do Hamas em 2006, que foi rejeitada pela ANP e levou o grupo a tomar Gaza. Pesa muito a política israelense, acelerada sob Netanyahu, de colonização ilegal da Cisjordânia, inviabilizando na prática um Estado lá.
A brutalidade do 7 de Outubro, um trauma nacional em Israel, levou Tel Aviv a tentar um acerto de contas regional. Na mira final está o Irã, país que bancava o Hamas, o Hezbollah e outros prepostos regionais contra os israelenses e americanos.
Até aqui, o Estado judeu colhe uma vitória tática: os rivais foram bastante degradados e até a ditadura síria, que servia de ponto de coordenação regional do Irã, acabou derrubada no caso, com ajuda da ambiciosa Turquia. Tropas israelenses operam livremente na Cisjordânia e ampliaram a ocupação no sul sírio.
Mas esse avanço tem um preço em sangue que coloca Netanyahu no alvo da opinião pública mundial, e Israel, no banco dos réus em Haia, sob acusação de genocídio.
Trump, com seu estilo “prendo e arrebento”, chegou ao poder desafiando essa pressão ainda que não seja claro o que ele quer, e como, sem esquecer o fato que o republicano forçou o aliado em Tel Aviv a aceitar o cessar-fogo em Gaza antes de voltar à Casa Branca.
Para os vizinhos árabes, há temores diversos. Ao longo das décadas, o movimento de refugiados causou instabilidades graves, como na Jordânia, e no caso do Líbano esteve intrincado com a guerra civil que devastou o país.
Fonte: FolhaPress