Política
Quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Relator do PL Antifacção diz que Senado deve manter endurecimento de penas, mas com ‘sentido’

O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) afirmou não ver possibilidade de retomada da versão original do PL Antifacção enviada ao Congresso Nacional pelo governo Lula (PT).
Relator da proposta, Vieira pretende manter o endurecimento de penas e de regras da execução penal previstas no texto aprovado pelos deputados federais. Na Câmara, sob protesto de governistas, a relatoria ficou a cargo de Guilherme Derrite (PP-SP), secretário de Segurança Pública na gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Vieira disse à Folha de S.Paulo que avalia incluir em seu relatório um novo modelo de financiamento para o enfrentamento ao crime organizado, segundo noticiou o Painel. E também pretende suprimir trechos considerados inconstitucionais, como o que proíbe o pagamento de auxílio a familiares de pessoas presas.
O senador afirmou estar em diálogo com Derrite, com integrantes do Ministério da Justiça e da Polícia Federal, na tentativa de construir um consenso possível. O PL Antifacção foi aprovado na Câmara na última terça-feira (18) em derrota para o Palácio do Planalto.
“A gente funciona aqui como uma casa revisora, com autonomia e legitimidade, e o governo depois retoma a prerrogativa do veto. Mas a interferência no texto, no nível de apego que eles demonstraram no início do processo, não cabe mais”, afirmou.
Antes de entregar o relatório, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) realizará na terça-feira (2) uma audiência pública para ouvir técnicos do governo federal, representantes do Consesp (Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública) e de entidades da sociedade civil, como a Cufa (Central Única das Favelas)
A ideia é aprofundar a compreensão sobre a dinâmica de milícias e facções e os impactos dessas organizações na vida da população que vive em áreas sob seu domínio.
Vieira pretende finalizar o texto até quarta (3), para então ser votado na CCJ e depois, no plenário. Ele afirma que a construção do projeto no Senado busca um rito distinto do adotado na Câmara, sendo “muito transparente, muito documentada” para evitar o que chamou de “guerra de narrativa”.
O senador afirmou que a intenção é incorporar as inovações previstas no projeto a um novo capítulo da Lei de Organizações Criminosas, em vez de criar uma legislação autônoma.
A versão original do projeto enviada ao Congresso alterava a Lei de Organizações Criminosas, o Código Penal, o Código de Processo Penal, além de outras normas. No entanto, durante a tramitação, Derrite optou por criar uma lei autônoma.
A principal preocupação de integrantes do governo e de especialistas é que essa fragmentação gere um cenário de insegurança e possível caos normativo por já estiver leis sobre o tema.
Segundo Vieira, é preciso delimitar os novos tipos de crime aprovados pelos deputados, já que alguns foram redigidos de forma muito ampla.
“O Direito Penal exige condutas taxativas, muito objetivas. Deixar a construção aberta para interpretação judicial favorece o crime organizado com alto poder econômico e acesso a boas bancas de advocacia”, disse o senador.
ENDURECIMENTO DE PENAS DEVE FAZER SENTIDO, DIZ RELATOR
Vieira afirmou que a discussão no Senado sobre as penas no PL Antifacção caminha no sentido de manter e consolidar o endurecimento previsto no texto.
Ele ponderou, porém, que é necessário que esse endurecimento “faça sentido, seja proporcional” e siga a lógica do que o Congresso vem aprovando. Ajustes podem ser feitos, mas ainda não há definição sobre como ficará a redação final.
Outro ponto em revisão é o trecho que trata do isolamento de lideranças em presídios federais. A ideia é tornar o texto mais claro e objetivo sobre quem pode ser considerado, de fato, uma liderança de organização criminosa.
Vieira citou como exemplo o depoimento do promotor Lincoln Gakiya na CPI do Crime Organizado. De acordo com Gakiya, em um universo de 40 mil integrantes do PCC, apenas cerca de 100 poderiam ser classificados como lideranças aptas ao isolamento.
O objetivo, segundo o senador, é garantir que os verdadeiros líderes sejam enviados ao sistema federal, enquanto os demais faccionados recebam um tratamento mais rígido, porém sem a necessidade de concentrar todos no mesmo regime de isolamento.
O senador avaliou ainda que alguns trechos são inconstitucionais e serão retirados do texto, podendo ser discutidos posteriormente por meio da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Segurança.
Entre esses pontos está a vedação ao auxílio-reclusão. Ele explica que o benefício é um direito previdenciário destinado à família do segurado preso, previsto na Constituição como forma de proteção social, justamente para evitar que os dependentes fiquem vulneráveis ou recorram ao crime para sobreviver. Ou seja, não se trata de um benefício ao preso, mas aos seus familiares.
O parecer do relator também não prevê retirar recursos da Polícia Federal nem dos estados. Ao contrário, o objetivo é ampliar o financiamento destinado ao enfrentamento ao crime organizado.
Para isso, estuda um novo modelo de financiamento para a área. A ideia é criar um fundo específico para o combate ao crime organizado. Ainda não há definição, porém, sobre a origem dos recursos nem sobre a proporção de repasse entre União e estados, pontos que seguem em discussão.
Outro ponto em análise é a retira a competência do Tribunal do Júri para alguns dos tipos penais previstos na lei. Vieira afirma que essa proposta enfrenta um entrave importante, já que o júri é uma garantia constitucional.
O texto da Câmara prevê que homicídios (dolosos) ou sua tentativa cometidos por membros de organizações criminosas ultraviolentas, quando enquadrados em situações do Crime de Domínio Social Estruturado, serão julgados por Varas Criminais Colegiadas, formada por juízes, não pelo Tribunal do Júri.
No caso da audiência de custódia, responsável por verificar eventuais abusos na prisão, o senador diz que a realização por videoconferência será reavaliada para evitar que o ato se torne mera formalidade.
No texto aprovado pela Câmara, a videoconferência é a regra, e a audiência presencial, exceção, sob o argumento de redução de custos.

Fonte: FolhaPress