
Aliados de Jair Bolsonaro (PL) passaram a procurar culpados entre si, acentuando rachas já existentes no bolsonarismo após a manifestação deste domingo (29), na avenida Paulista, atrair um público abaixo do esperado para os atos promovidos pelo grupo.
Segundo, o Monitor do Debate Político do Cebrap, o público deste domingo foi de 12,4 mil pessoas. Em abril deste ano, em outro ato bolsonarista, foram contabilizados 44,9 mil manifestantes. Já em fevereiro do ano passado, na mesma Paulista, o monitor estimou que 185 mil pessoas compareceram à manifestação em defesa de Bolsonaro.
Enquanto parte do entorno do ex-presidente apontou falta de lealdade de aliados que faltaram ao ato, outras figuras próximas criticaram a organização da manifestação, que teria sido feita de modo a afastar políticos de centro-direita que orbitam o bolsonarismo.
Auxiliares ligados ao clã Bolsonaro enfatizaram a crítica à ausência de nomes como os dos presidentes do PP, Ciro Nogueira, e do União Brasil, Antônio Rueda -que se uniram em uma federação partidária-, do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) e da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Até a noite de sábado, os organizadores davam como certo que Michelle e Nikolas não só participariam do ato como discursariam ao lado de Bolsonaro.
Além disso, o grupo viu oportunismo nas críticas feitas por Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao governo Lula. O governador de São Paulo, cotado como possível candidato à Presidência, mas que nega interesse, disse “fora, PT” duas vezes em sua fala e poupou o STF de críticas.
Para o grupo, o discurso não ajudou em nada, por exemplo, a defesa da libertação de presos como o general Walter Braga Netto, detido desde dezembro sob acusação de tentar atrapalhar as investigações sobre a trama golpista que, segundo denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República), Bolsonaro teria liderado.
Sem citar nomes, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, divulgou um vídeo nas redes sociais comentando as manifestações e pedindo atenção a detalhes como “quem compareceu, quem não compareceu, como é que foram os discursos, quem é que faz o embate”.
Em autoexílio nos Estados Unidos desde março, ele é cotado como possível sucessor do pai em uma disputa presidencial em 2026.
“Essa é uma grande oportunidade para você aprender, porque foi ali um palco, não somente por um grito de liberdade, mas também um evento que não deixa de ser político. Então é para você acompanhar a política de perto, porque quem não escuta ‘cuidado’, depois ouve ‘coitado'”, disse Eduardo.
O filho e a mulher de Bolsonaro travam uma disputa familiar pela indicação do ex-presidente para sucedê-lo nas urnas, uma vez que ele está inelegível por decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Enquanto o deputado está no exterior, a ex-primeira-dama justificou a ausência dizendo que tinha um evento do PL Mulher em Roraima.
Organizadores do ato de domingo alegaram, reservadamente, terem sido surpreendidos pela viagem de Michelle e disseram que o encontro em Roraima não foi sequer divulgado em redes sociais. Além disso, houve outro evento do PL Mulher em Boa Vista, capital roraimense, no dia 1º de junho. Em comunicado publicado no próprio site do PL Mulher à ocasião, constava que os próximos estados a serem visitados por Michelle seriam Tocantins e Piauí -sem referência a um retorno a Roraima no mesmo mês.
A reportagem enviou mensagens para Nogueira e Rueda, mas nenhum deles respondeu. Também não conseguiu contato com Michelle.
Por meio de sua assessoria, Nikolas Ferreira afirmou que não foi à manifestação porque compareceu a um casamento de sua família.
“Fui padrinho de casamento de uma prima, que morou comigo minha infância toda. Casamento marcado há meses. Não faltei a nenhuma outra manifestação. E com discursos contundentes”, disse.
CHAMADO
O ato deste domingo foi a primeira manifestação chamada pelo ex-presidente após ele ser ouvido pelo ministro do STF Alexandre de Moraes no inquérito da trama golpista.
No depoimento, no último dia 10, Bolsonaro adotou um tom ameno diante do ministro, que é alvo constante de críticas de seu grupo político, e chegou a chamar os apoiadores acampados em frente aos quartéis do Exército, no fim de seu mandato, de “malucos”.
Para dois dos presentes no ato ouvidos pela Folha, a conduta de Bolsonaro diante de Moraes pode ter contribuído para afastar parte do público, já que apoiadores esperavam uma postura mais reativa por parte do ex-presidente, além de uma defesa daqueles que foram às portas dos quartéis insuflados por ele após a derrota nas eleições.
Aliados mais próximos de Bolsonaro, contudo, avaliam que o quórum menor neste domingo não tem relação com o episódio e também não indicaria uma diminuição de sua popularidade.
Para esse grupo, além da ausência de aliados políticos, o baixo público tem relação com uma divulgação que teria sido mal feita nas redes sociais.
Eles criticam apoiadores com muitos seguidores que não teriam falado sobre o protesto, embora o pastor Silas Malafaia, organizador do ato, tenha mais de 4 milhões de seguidores no Instagram e tenha publicado chamadas nas redes com semanas de antecedência.
Um integrante do PL afirmou que expoentes políticos que poderiam ter comparecido ao ato, e que estiveram presentes em manifestações anteriores, não têm encontrado sentido em se deslocar até a Paulista para ficar longe de Bolsonaro -pois não conseguem produzir conteúdo com o ex-presidente em suas redes. O acesso ao trio elétrico onde fica o ex-presidente é controlado por Malafaia, que também foi criticado.
Fonte: FolhaPress