No Mundo
Terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

Votação ocorre sem violência no Equador, mas com Noboa acusado de violar lei eleitoral

O passado recente não permitia ao Equador atravessar a jornada eleitoral deste domingo (9) sem temor de violência. Depois das eleições de 2023, quando um candidato foi assassinado, todo cuidado parecia pouco. Mas a votação transcorreu em relativa normalidade.
As urnas fecharam às 19h (17h locais) sem que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciasse qualquer irregularidade. Diretores do órgão falaram em um dia de votação “sob normalidade” neste pleito em que 16 candidatos concorrem à Presidência, sendo os principais o atual líder, Daniel Noboa, e a opositora de esquerda Luisa González.
A participação eleitoral foi de 83,4% no país onde o voto é obrigatório para cidadãos que tenham entre 18 e 65 anos e com uma multa por não comparecer às urnas de US$ 47 (R$ 270). A apuração ocorre lentamente.
Isso não significa, no entanto, que o pleito tenha passado livre de acusações. Herdeira do capital político do ex-presidente Rafael Correa (2007-2017) -para o bem e para o mal-, Luisa González afirmou que houve, sim, irregularidades no pleito.
Ela não foi clara sobre a afirmação, mas mencionou, por exemplo, o fato de Noboa ter se recusado a se licenciar do cargo de presidente para concorrer à reeleição, como manda a lei eleitoral. A missão de observação da OEA (Organização dos Estados Americanos) no país disse que levará esse fato em consideração para seu relatório final.
A campanha do centro-direitista argumenta que, como ele foi eleito para um mandato-tampão, não teria obrigação de seguir essa regra. É um malabarismo institucional que os tribunais ainda não disseram se é válido ou não.
González chegou a chamar a presidente do CNE, Diana Atamaint, de “chefe de campanha de Noboa”. “Em vez de custodiar a democracia, ela permitiu que se cometam irregularidades”, disse a candidata pouco após votar em sua região natal, Manabí. Atamaint não comentou.
Quem também fez apontamentos nesse sentido foi a própria vice de Noboa, Verónica Abad, que o presidente tem tentado afastar do cargo, ainda que a Justiça já tenho dado decisão favorável a ela.
Ao comparecer para votar com um colete a prova de balas, ela disse que o ambiente do país “não é de alegria democrática”. “Peço aos equatorianos que saiam às urnas com liberdade e com força para defender a democracia, a Constituição e o Estado de direito”, declarou à imprensa. Ainda que um tribunal tenha dado a ela o direito de retomar seu cargo, seu gabinete foi cercado por militares e policiais nesta semana, a mando do presidente, para impedir seu acesso.
Uma série de medidas foi tomada para mitigar os riscos de violência durante o fim de semana, em especial episódios ligados a grupos do narcotráfico, hoje o maior desafio do país, que serve como rota de exportação de cocaína para a Europa, o México e a América Central.
O governo ordenou o fechamento de fronteiras até esta segunda-feira (10) com os seus dois vizinhos, Colômbia e Peru, e moveu mais de 57 mil policiais e 48 mil militares para atuarem diretamente nos eventos ligados à eleição.
Mais do que uma disputa entre projetos políticos com propostas para combater os dois problemas mais latentes no país (a insegurança e a crise energética), a eleição deste ano é uma disputa de qual rejeição mobiliza mais os equatorianos. De um lado, o “anti-noboismo”. De outro, o “anti-correísmo”.
O primeiro refere-se à oposição a Noboa, um líder que durante seus breves 15 meses no cargo foi apontado por acadêmicos e organizações internacionais de direitos humanos como um político que adotou um viés autoritário. Já o segundo, à oposição ao padrinho de Luisa González na política, o ex-presidente Rafael Correa (2007-2017), um dos nomes mais polarizadores do país.
As principais pesquisas eleitorais apontavam nas semanas anteriores à votação deste domino que Noboa era o favorito, com alguma chance inclusive de ganhar no primeiro turno -para isso, é necessário reunir mais de 50% dos votos ou, então, mais de 40% com uma diferença de dez pontos percentuais em relação ao segundo mais votado.
Político da centro-direita, Noboa se deparou com desafios substanciais no curto mandato de um ano e meio, no qual parecia estar a todo o tempo em clima de campanha a reeleição. Ele viu um canal de TV ser invadido ao vivo por homens armados, um dos maiores chefes criminosos fugir da cadeia e o sistema energético ruir com a seca.
Para combater a crise a galope da segurança pública, ele apostou na militarização do setor, o que é parte fundamental do “anti-noboísmo”, sentimento social de que a linha-dura do presidente corroborou para que houvesse violações de direitos humanos cometidas pelas mãos de soldados nas ruas. Os casos do tipo se acumularam.
Por outro lado, Luisa González, advogada e ex-deputada, carrega a carga simbólica dos governos de Rafael Correa, período de bonança econômica pela época áurea do boom das commodities, que alavancou as exportações de petróleo, mas marcado por escândalos de corrupção.
O próprio Correa foi condenado por um desses casos, mas afirma se tratar de mais um exemplo de “lawfare”, termo que se popularizou na região para falar de uma possível perseguição judicial com objetivos políticos. Hoje, ele vive na Bélgica, país natal de sua esposa.

Fonte: FolhaPress