Economia
Quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Recompras de ações batem recorde em 2024 e tiram bilhões da Bolsa brasileira

O mercado de ações brasileiro teve um recorde de programas de recompra de ações por parte de empresas em 2024. Foram 126 pedidos de recompra aprovados pela B3 no ano passado, envolvendo 4,8 bilhões de papéis, ambos recordes históricos da Bolsa de Valores brasileira. Os números representam um salto em relação a 2023, que teve 80 pedidos de programas de recompra, envolvendo 1,8 bilhão de ações.
Segundo dados da B3, o pico anterior de pedidos era de 2021, com 115 em meio à pandemia. Em termos de papéis, o recorde é de 2004, com 3,9 bilhões de ações envolvidos nos programas.
Companhias costumam recomprar os seus papéis como forma de remunerar os acionistas, elevando o valor das ações que seguem negociadas no mercado. Ela também pode ser uma estratégia financeira da companhia, se estiverem em baixa e a empresa as revender na alta. Pode ser ainda uma forma de aproveitar um momento de forte geração de caixa, como visto pelas empresas nos últimos anos, com crescimento do PIB (Produto Interno Bruto).
O programa de recompra pode durar meses ou anos e ser executado ou não, de modo integral ou parcial, de acordo com a preferência da empresa.
De acordo com levantamento da gestora Alpha Key, de janeiro de 2022 e setembro de 2024, foram executadas 128 operações de recompra, o que retirou R$ 64 bilhões que eram negociados livremente entre investidores na Bolsa de Valores, o chamado free float. Excluindo a recompra da Petrobras, de 155 milhões de papéis, este valor cai para R$ 58 bilhões.
Segundo o BTG Pacutal, os programas de recompras de ações impediram que o Ibovespa tivesse uma queda maior do que os 10,4% em 2024. “A boa notícia é que as recompras devem continuar forte em 2025”, diz o banco em relatório.
De acordo com o BTG, há 62 programas de recompra abertos que, se executados na íntegra, somariam R$ 64,5 bilhões, o que pode ser uma boa oportunidade de investimento.
“Investidores devem procurar por grandes programas de recompra, em termos percentuais ao total de ações, de ações com histórico de executá-los”, afirma o banco em relatório a clientes.
De acordo com o estudo da Alpha Key outros fatores contribuíram para uma redução de 13% do free float da Bolsa brasileira no mesmo período, como o fechamento de capital de algumas empresas, a desvalorização dos papéis e a distribuição de dividendos -quando uma empresa distribui lucros aos seus acionistas, o valor embolsado pelo investidor é descontado do preço da ação.
Tais desvalorizações somadas às recompras de ação retiraram R$ 260 bilhões do mercado brasileiro, que foi de R$ 1,96 trilhão para R$ 1,7 trilhão.
“Tirando a Petrobras, em dólares, a Bolsa brasileira toda vale em torno de 18% da capitalização de mercado da Apple (menos de US$ 600 bilhões)”, diz a Alpha Key em seu levantamento.
No mesmo intervalo, o número de empresas listadas caiu de 385 para 335.
“Apenas como efeito de comparação, só no ano de 2024 a Índia teve quase mais IPOs (334) do que todas as empresas listadas no Brasil, e a Polônia conta atualmente conta com mais de 400 companhias na Bolsa de Varsóvia.”
De acordo com a gestora, o encolhimento do mercado de ações em tamanho e em valor vai na direção contrária do mercado de capitais, visto que fundos, títulos públicos e depósitos cresceram em percentual superior ao CDI do período. Dividindo o free float por este restante do mercado, o resultado é semelhante ao visto no momento mais agudo da crise de 2015/2016, aponta o estudo da Alpha Key.
“Essa combinação não implica que o preço não possa cair ainda mais, ela apenas constrói um ambiente bastante assimétrico em termos probabilísticos”, diz a gestora.
“O mercado de juros atualmente no Brasil precifica uma Selic alta para sempre, por conta de uma inflação também alta para sempre. No entanto, o mercado acionário precifica que as empresas, quase todas líderes em seus segmentos, perderam a capacidade de qualquer repasse real de preços, algo que discordamos.”
Uma eventual mudança de cenário, segundo o relatório, viria com uma sinalização de alternância no governo federal, o que poderia levar o Ibovespa para além dos 200 mil pontos.
A Alpha Key traça um paralelo com o mercado argentino, no qual a Bolsa subiu mais do que os juros do país antes mesmo da eleição de Javier Milei.
“Mesmo sem nenhum sinal de um governo reformista e ousado, as mínimas dos mercados na Argentina se deram um ano e meio antes do pleito presidencial, muito antes de qualquer possibilidade de alguém como Milei subir ao poder, simplesmente pela reponderação de probabilidades da não continuidade do Kirschnerismo.”
Segundo Christian Keleti, presidente da Alpha Key, quando o mercado de ações brasileiro voltar a subir, faltarão ações disponíveis para a compra, o que tende a impulsionar a valorização dos papéis já listados. “Pode ser uma alta colossal.”

Fonte: FolhaPress