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Quinta-feira, 2 de maio de 2024

Pistache é a nova Nutella? A invasão da castanha na confeitaria brasileira

Como o nobre ingrediente se popularizou em panetones, cafés e nas redes sociais

A poucos dias do Natal, os confeiteiros do país vivem uma avalanche verde. Castanha nobre, de origem mediterrânea, o pistache surgiu em tudo: do petisco e do sorvete pulou para os bolos e docinhos, vai até no café e, claro, no panetone. No Twitter, TikTok e nos grupos de confeitaria no WhatsApp, já ficou jocoso: assim como a antiga fixação dos brasileiros a ganache de pistache é a nova Nutella, dizem os chefs.

Sintomático, o “pistacchiotonne” do confeiteiro Leonardo Borges, com mais de 6kg lambuzados do creme verde a R$ 1,4 mil, chamou a atenção nas redes sociais (já foram mais de 12 milhões de views), levando consumidores a buscarem versões menores em sua confeitaria – a Flakes, que tem unidades apenas em Rondônia e São Paulo. Mas não foi o único item a viralizar e quem já contava com o ingrediente nos produtos do portfólio teve que aumentar a produção. As poucas casas que ainda não estavam preparadas correram para lançar suas versões.

“Está todo mundo meio em choque, ninguém sabe muito bem o que aconteceu. A gente tem falado muito disso nos nossos grupos de confeiteiros. Estamos dizendo que é a nova Nutella”, conta Diego Lozano, chef pâtissier duas vezes eleito o melhor chocolatier do Brasil no World Chocolate Masters. Dos cerca de mil docinhos de pistache que vendia mensalmente em sua Levena, em Pinheiros, a produção teve de quintuplicar: só nos primeiros 15 dias de dezembro, saíram 2,5 mil unidades.

O mundo todo está comendo mais pistache. Dados da Statista, agência alemã de pesquisa, mostram que nos últimos 10 anos o consumo global da castanha cresceu em torno de 35%. No Brasil, dados de importação do MDIC mostram que o país comprou mais de 400 toneladas do ingrediente em 2023, o equivalente a US$ 5,8 bilhões, volume três vezes maior do que há um ano.

Por questões climáticas, é difícil produzir pistache na América Latina. A maior parte chega ao Brasil dos Estados Unidos e do Irã, terra de origem. Os EUA só começaram a produzir pistache no fim dos anos 1970, mas foi na década seguinte, no contexto da guerra entre Irã e Iraque, que a produção local escalou, com os americanos colocando sanções nas importações e, mais tarde, tarifas muito altas. Por conta do clima e de uma onda imigratória de iranianos para a Califórnia, a região se tornou a maior produtora do mundo.

A proximidade e as boas relações comerciais aumentaram o fluxo do pistache americano para o Brasil, especialmente na pandemia e pós pandemia, com uma adaptação de rotas por proximidade. Mais recentemente, a inflação na Europa fez com que o continente freasse o consumo de nozes como um todo, o que também levou produtores a voltar os olhos para importadores então menos óbvios, como o Brasil.

Atualmente, os confeiteiros dizem que têm pago junto a fornecedores entre R$ 150 e R$ 200 o quilo, mas o produto já chegou a custar R$ 400/kg no passado.

“Neste ano, estive em Londres no evento do International Nut & Dried Fruit Council (INC), que reúne os maiores empresários de nozes, castanhas e frutas secas do mundo. Os produtores de pistache comentaram que estavam interessados em entrar com mais força em países como o Brasil, dado que notaram demanda e tem esse contexto europeu”, conta José Eduardo Camargo, presidente da Associação Brasileira de Nozes, Castanhas e Frutas Secas (ABNC).

Camargo, que é produtor de macadâmia, vê a avalanche verde com bons olhos. “Para o setor como um todo é bom. É como quem gosta de um vinho e começa a provar outras uvas. O pistache pode ser a porta de entrada para um novo devorador de castanhas brasileiras também”, avalia.

Na gastronomia, os chefs sentiram esse aumento de oferta e demanda pelo ingrediente nos últimos dois anos, mas com pico em 2023. Ainda em agosto, por exemplo, a gelateria Baccio di Latte promoveu o Festival do Pistacchio, com uma série de sabores inéditos que combinavam a castanha a outros ingredientes.

Fonte: Valor Pipeline