Economia
Sábado, 27 de julho de 2024

Desvalorização do peso deixa o brasileiro “mais rico” na Argentina? Entenda limites (e ilusões) do câmbio

Perda de valor do peso faz um real comprar mais unidades da moeda do país, mas hiperinflação

Menos de duas semanas atrás, no dia 11, uma sexta-feira, um real comprava cerca de 58 pesos, pelo câmbio oficial da Argentina. O valor já era alto quando comparado aos 35 pesos de janeiro deste ano. Mas acabou parecendo até baixo apenas três dias depois, quando um real passou a ser capaz de comprar mais de 70 pesos argentinos, na segunda-feira seguinte (14).

Com cada real valendo 72 pesos nesta quarta-feira (23) – ainda reflexo da decisão do banco central argentino de desvalorizar a moeda em 20% após a vitória do direitista Javier Milei nas primárias presidenciais do dia 13 – é comum ver brasileiros convencidos de que terão uma pequena fortuna nas mãos ao viajar para o país.

Segundo André Galhardo, economista e consultor da Remessa Online, o real, de fato, tem mais valor do que o peso no país vizinho, mesmo com a inflação galopante de 113,4% no acumulado de 12 meses até julho – até porque a desvalorização não aconteceu apenas agora em agosto. A moeda argentina já tinha perdido cerca de 75% do valor frente ao real ao longo do ano.

“Nos últimos meses, a desvalorização do peso foi drástica. O aumento dos preços chegou em um nível de hiperinflação por lá, mas, ainda assim, a perda de valor da moeda consegue ser mais rápida do que a mudança dos preços, o que faz com o real tenha vantagem frente à moeda local”, diz Galhardo.

Não significa, no entanto, abundância infinita para o brasileiro que vai ao país a turismo. A desvalorização inesperada deste mês, combinada com a inflação desenfreada dos meses anteriores, fez com que os argentinos perdessem a referência de preços internos. Com isso, os reajustes são tão flutuantes quanto a variação do próprio câmbio.

“A ilusão do câmbio pode levar o turista a achar que tudo é uma maravilha”, diz Paulo Feldmann, professor da FIA Business School. “Mas a moeda está muito desvalorizada porque os preços subiram muito. É assim que a inflação funciona.”

    Big Mac é a referência

    Para o professor da FIA, um bom parâmetro para entender se os produtos e serviços estão caros em um país é o índice Big Mac, feito pela revista britânica The Economist. O índice existe desde 1986 e, com base na teoria da paridade do poder de compra, avalia se a taxa de câmbio de diferentes países está em seu nível “correto”.

    Como um Big Mac pode ser encontrado em qualquer país, com os mesmos ingredientes e forma de preparação, o preço do produto é usado como medidor da taxa de câmbio.

    A última atualização divulgada em agosto deste ano, tem como referência o mês de junho. A metodologia prevê que o dólar dos Estados Unidos é o padrão, assim como o preço do Big Mac no país.

    Em junho, um Big Mac custava US$ 5,58 nos EUA e 1.650 pesos (US$ 5,99) na Argentina. Segundo o índice, a diferença de preços sugere que o peso argentino está 7,4% acima do seu valor “justo” em relação ao dólar.

    Já no Brasil, o preço do Big Mac – de R$ 22,90 (US$ 4,81) – indica que o real está 13,7% abaixo da taxa de câmbio adequada, segundo a The Economist.

    “O índice mostra que o Big Mac hoje é mais caro na Argentina do que no Brasil. Isso é um sintoma de que produtos e serviços básicos estão caros no país”, diz Feldmann.

    E acrescenta: “O turista tem que estar ciente de que o real tem mais valor que o peso, mas isso não necessariamente se reflete em poder de compra.”

    Fonte: InfoMoney