Economia
Terça-feira, 21 de maio de 2024

Reoneração dos combustíveis retoma embate entre Haddad e ala política no governo Lula

Equipe econômica tenta evitar nova derrota, enquanto aliados tentam convencer Lula dos impactos negativos da medida sobre sua popularidade

Foco de um dos primeiros embates entre a equipe econômica e a ala política do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o retorno da cobrança de impostos federais sobre a gasolina e o etanol volta a dividir posições na base aliada às vésperas do fim dos efeitos de medida provisória que prorrogou desonerações concedidas pela gestão anterior.

A MPV 1.157/2023 prorrogou, até 28 de fevereiro, alíquotas zeradas de contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins incidentes sobre operações realizadas com gasolina, álcool, querosene de aviação e gás natural veicular. O dispositivo também desonerou o diesel e o gás de cozinha – mas nestes casos o prazo é até 31 de dezembro deste ano.

De um lado, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) tenta evitar um novo revés e garantir a reoneração dos combustíveis. As estimativas da equipe econômica apontam para um ganho de R$ 28,88 bilhões com o fim do benefício fiscal na semana que vem. A medida, inclusive, faz parte do conjunto de ações anunciadas pelo ministério em janeiro para conter o desequilíbrio fiscal.

Na outra ponta, porém, lideranças políticas temem que os impactos da ação sobre a inflação e a popularidade do novo governo, sobretudo na classe média (faixa da população com maior resistência a Lula), e pedem mais tempo até que medidas para mitigar um possível avanço dos preços na ponta possam ser implementadas.

Em uma tentativa de evitar uma repetição do episódio de janeiro, quando Lula determinou a prorrogação das desonerações contra a vontade de Haddad, a equipe econômica aposta na melhora do ambiente internacional como argumento para convencer o presidente a encerrar o benefício e trazer uma notícia positiva para as contas públicas.

Do encerramento de dezembro até agora, o dólar à vista caiu de R$ 5,28 para R$ 5,14, enquanto a cotação do petróleo tipo brent passou de US$ 85,91 para US$ 82,21 o barril no mercado internacional. Os dois movimentos devem reduzir os efeitos de uma reoneração.

O retorno integral da tributação significaria um incremento no preço da gasolina de R$ 0,79 por litro em Pis/Cofins e mais R$ 0,10 por litro em Cide. Para o etanol, o preço do litro subiria R$ 0,24 com o retorno do tributo.

Ontem (23), ao comentar o resultado da arrecadação de janeiro, o chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita Federal, Claudemir Malaquias, chegou a confirmar a reoneração no fim de fevereiro.

“De fato, a MP previu que a alíquota de desoneração seria vigente até o final deste mês. A reoneração está prevista conforme a norma que está vigendo”, disse.

Uma das vozes contra o movimento é a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente nacional do PT e uma das figuras mais próximas a Lula. Ela argumenta que a retomada da dos tributos federais sobre combustíveis deve ser precedida por uma nova política de preços praticada pela Petrobras – tema abordado com frequência pelo próprio presidente na última campanha eleitoral.

A expectativa da parlamentar é que o debate sobre o chamado Preço de Paridade Internacional (PPI) seja possível em abril, quando houver a renovação do conselho de administração da Petrobras a partir da indicação de novos quadros pelo governo.

“A política de preços atual, implantada pelo golpe, faz o povo pagar em dólares por gasolina e diesel que são produzidos aqui no Brasil em reais. A tal PPI sempre foi inflacionária e só favorece a indecente distribuição de lucros e dividendos da Petrobrás. Isso também tem de mudar”, afirmou Gleisi.

“Nosso desafio é equilibrar uma política de preços mais justa com a geração de caixa necessária para retomar e impulsionar os investimentos da Petrobras, fundamentais para o crescimento da economia, geração de empregos e de oportunidades. Isso também será possível a partir de abril”, prosseguiu.

“Impostos não são e nunca foram os responsáveis pela explosão de preços da gasolina que assistimos desde o golpe e no governo Bolsonaro/Guedes. Não somos contra taxar combustíveis, mas fazer isso agora é penalizar o consumidor, gerar mais inflação e descumprir compromisso de campanha”, concluiu.

Do lado da equipe econômica, a alegação é que a volta da cobrança dos impostos federais sobre os combustíveis teria impacto sobre a inflação no curto prazo, mas poderia gerar uma melhora do quadro fiscal em um horizonte mais longo.

Na prática, isso influenciaria positivamente as expectativas do mercado sobre o comportamento dos preços – o que é levado em conta pelo Banco Central nas decisões de política monetária, um dos principais alvos de Lula neste começo de governo.

O presidente Lula tem até terça-feira (28) para bater o martelo sobre uma eventual prorrogação ou o fim do benefício fiscal.

Conforme noticiou a agência de notícias Broadcast, do Grupo Estado, Lula teve reunião, nesta sexta-feira (24), com o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, e os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil, Rui Costa.

Ainda de acordo com a plataforma, Galípolo, que representou Haddad (em viagem oficial à Índia para o encontro do G20) no encontro, expôs sua contrariedade à prorrogação da isenção. No encontro, teriam sido discutidos os impactos da medida e possíveis alternativas para mitigá-la. A tendência é que Lula aguarde o retorno de Haddad, previsto para o fim de semana, antes de tomar uma decisão.

Nos bastidores, há discussões sobre caminhos intermediários, como a adoção de uma retomada gradual na tributação sobre os combustíveis, de modo a não impor uma nova derrota à ala econômica ou deixar o governo completamente exposto a um tema delicado para parte da opinião pública.

Fonte: InfoMoney