Esportes
Sábado, 4 de maio de 2024

A fórmula Endrick: a estratégia de branding por trás do novo contratado do Real Madrid

Empresas altamente especializadas, como a Wolff, cuidam cada vez mais cedo da imagem dos atletas de alta performance.

De um lado, clubes bilionários e vencedores — como Flamengo e Palmeiras. De outro, times altamente endividados, quebrados ou desesperados para virar SAF (Sociedade Anônima do Futebol). De um lado, ligas estruturadas com premiações milionárias. De outro, torneios esvaziados e deficitários. De um lado, jogadores talentosos com imagem arranhada, desperdiçada ou destruída. De outro, atletas com carreiras administradas como marcas. O futebol moderno — este cujas regras vão completar 160 anos — vive seu maior turning point. E isso passa a exigir a presença de operações sofisticadas na gestão de torneios, das carreiras dos esportistas e das empresas que querem se vincular a uma audiência sempre gigantesca. “O mercado mudou e houve o desembarque de profissionais altamente qualificados”, disse Fábio Wolff, da Wolff Sports, agência que é referência na área.

A empresa de Wolff tem em mãos cuidar da construção de imagem de uma das maiores revelações do futebol brasileiro em décadas, o atacante do Palmeiras Endrick. Jogador de 16 anos, na quinta-feira (15) foi anunciada sua venda ao clube mais vencedor do futebol mundial, o espanhol Real Madrid, por uma quantia que pode chegar a 70 milhões de euros (cerca de R$ 400 milhões). Para comparação, oficialmente Neymar custou bem menos ao Barcelona, em 2013: 57 milhões de euros — apesar de o site especializado Transfermarket citar o valor real na casa de 88 milhões de euros. O ex-santista, no entanto, já tinha 21 anos, cinco a mais que Endrick hoje. Para cuidar da imagem do jogador do Palmeiras, Wolff usará como benchmarking atletas de classe mundial, como Rafael Nadal, Roger Federer e Cristiano Ronaldo. “A estratégia é idêntica: ter poucos contratos, mas duradouros”, disse.

E esse é um diferencial incomum. O plano é que Endrick tenha oito contratos com marcas de diferentes segmentos e um patrocinador esportivo, no caso, a Nike. O número restrito aumenta a conexão entre atleta e empresas, o que amplifica a performance de construção de imagem para os dois lados. A regra no mercado brasileiro, quando um jogador ‘estoura’, é a oposta: aceitar todo tipo de anunciante apenas para reforçar o caixa. Muitos produtos pegam essa carona oportunista e o patrocinado mal cria identificação com as marcas. Isso muda completamente com atletas de primeríssima linha. No caso do tenista espanhol Nadal, recordista em torneios de Grand Slam (22), do ex-tenista suíço Federer, um dos maiores do esporte em todos os tempos, e do futebolista português Cristiano Ronaldo, os contratos são de longo prazo.

Divulgação

“Nossa estratégia para o Endrick é ter poucos, e duradouros, contratos. E todos com seu próprio storytelling” Fábio Wolff, Wolff Sports.

Para a carreira de Endrick, já são dois, além da Nike. A rede de saúde bucal Odonto Company e o fantasy game Rei do Pitaco. Os dois têm três anos de duração. “Para um jogador de futebol, o da Odonto Company foi o contrato mais precoce da história”, disse Wolff. “E todos os patrocínios terão seu próprio storytelling.” O atleta, como é comum à maioria dos jogadores de futebol do Brasil, tem origem extremamente pobre. Nascido em Taguatinga (DF), foi apresentado a vários times grandes. O Palmeiras acabou levando porque ofereceu um emprego no serviço de limpeza do clube ao pai do então menino de 10 anos. Num almoço no refeitório da equipe, notaram que seu pai comia longe de todos. Por vergonha, já que tinha um grave problema nos dentes. “Juntar essa história pessoal com a marca Odonto Company leva para a relação comercial algo muito maior.”

MARCAS Adalberto Leister Filho é diretor de Conteúdo da agência Máquina do Esporte, think tank do setor esportivo. Para ele, com o atleta indo para o Real Madrid — o que deve acontecer apenas em 2024, quando completar 18 anos —, os futuros parceiros comerciais tendem a ser grifes de abrangência global. Até porque virá desse tipo de relação o rendimento dos superatletas. “Cada vez mais eles farão dinheiro vinculado a marcas e menos ao salário dos próprios clubes”, afirmou.

Wolff concorda. E nesse caminho é um dos pioneiros. Há 20 anos, concluiu o mestrado em mercado do futebol na Universidade de Liverpool. De volta ao Brasil, criou em 2006 a Wolff Sports, agência de marketing esportivo que mais fecha contratos no País. Nela, a gestão de imagem de atletas é braço recente. Há outras três frentes, divididas em plataformas de negócios. Na primeira, ele faz o trabalho que chama de taylor made. Entende o que uma marca busca ao querer se vincular ao mundo esportivo e decide para ela a melhor estratégia, o melhor caminho. Na segunda plataforma, faz aquisição de direitos em si — de um torneio até a publicidade num estádio. A terceira frente são os eventos próprios, como a Ladies Cup (futebol feminino) e o Praia de Paulista (beach tennis). A operação de gestão de imagem de atletas é o quarto segmento. “E nele fazemos o business plan e um planejamento estratégico.” Como cabe a qualquer produto. Como cabe a qualquer atleta moderno.

Fonte: IstoéDinheiro