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Terça-feira, 23 de julho de 2024

Irã determina investigação de massacre que teria deixado 82 mortes em meio a protestos

O presidente do Irã, Ebrahim Raissi, ordenou nesta quinta-feira (6) a abertura de investigações sobre um confronto entre policiais e manifestantes que teria deixado dezenas de mortos na cidade de Zahedan, no sudeste do país. O massacre ocorreu na última sexta (30), na esteira dos protestos que já duram três semanas em várias cidades da nação muçulmana.
Segundo Teerã, foram 20 mortos, incluindo seis policiais, além do chefe regional da inteligência da Guarda Revolucionária, força responsável por conduzir operações militares secretas no exterior.
A Anistia Internacional, porém, disse nesta quinta que 82 pessoas morreram, sendo 16 vítimas de confrontos em outras áreas de Zahedan -centenas ficaram feridas. A organização frisa que algumas pessoas morreram dias após o massacre devido aos baixos estoques de sangue, curativos e outros suprimentos médicos. Outras ainda estão gravemente internadas.
A Anistia diz que as forças de segurança dispararam “munição real e gás lacrimogêneo” contra manifestantes reunidos em frente a uma delegacia. “As provas colhidas mostram que a maioria das vítimas foi atingida por balas na cabeça, coração, pescoço e tronco, revelando uma clara intenção de matar ou ferir gravemente”, diz a ONG, que acusa os agentes de segurança de terem atirado do telhado da delegacia.
O massacre teria sido tão grande que a agência de notícias francesa AFP, seguindo a retórica de organizações de direitos humanos, apelidou o episódio de “Sexta-Feira Sangrenta” -rememorando a forma que historiadores nomeam uma série de massacres contra manifestantes em vários períodos da história mundial, como os “Domingo Sangrento”, no Império Russo e na Irlanda do Norte, e a própria “Sexta Sangrenta”, no Brasil. .
A mídia próxima ao regime iraniano, por outro lado, descreveu os confrontos como um “incidente terrorista” e Teerã acusou o grupo rebelde sunita Jaish al-Adl de estar por trás das mortes. O líder da minoria sunita no Sistão-Baluchistão -onde está Zahedan-, porém, rejeitou o envolvimento da organização. Segundo ele, na última sexta, “um grupo de soldados, a pé e em veículos, disparou contra pessoas reunidas ao redor de uma mesquita, matando e ferindo vários jovens”.
A província de Sistão-Baluchistão, na fronteira com Paquistão e Afeganistão, é uma região pobre, onde com frequência ocorrem atentados e confrontos entre forças de segurança e grupos armados. A área abriga a minoria baluchi, que adere principalmente ao islamismo sunita e não ao xiismo dominante do Irã.
Militantes e ONGs há muito lamentam que a região sofra discriminação por parte do establishment religioso xiita, com um número desproporcional de baluchis mortos anualmente em confrontos com as autoridades ou condenados e executados. A Anistia estima que em 2021 ao menos 19% de todos os condenados à morte eram baluchi, ainda que a etnia represente menos de 5% da população do país.
De qualquer forma, o regime iraniano indicou em um comunicado que o ministro do Interior, Ahmad Vahidi, foi ao local nesta quinta por ordem do presidente para liderar uma investigação aprofundada sobre as origens e causas da violência ocorrida.
O diretor da ONG Baluch Activists Campaign (BAC), Abdolá Aref, disse à AFP que na sexta os manifestantes foram à delegacia para protestar e, no local, gritaram palavras de ordem contra o líder supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei. Alguns manifestantes teriam atirado pedras nos policiais, que responderam com tiros. Segundo o ativista, “muitas pessoas foram mortas por franco-atiradores, incluindo pessoas que não participaram das manifestações”.
A violência em Zahedan ocorre enquanto o Irã enfrenta uma onda de protestos após a morte de Mahsa Amini, uma jovem curda de 22 anos, ainda em 16 de setembro. Ela morreu após ser presa pela polícia em Teerã por supostamente não usar o véu islâmico como dita o rígido código de vestimenta do país. A família diz que ela foi espancada e entrou em coma.
Desde então, 154 pessoas morreram durante as manifestações, segundo a organização Direitos Humanos no Irã. É incerto se a soma inclui as 88 mortes em Zahedan apontadas pela Anistia.

Fonte: FolhaPress