Economia
Quinta-feira, 16 de maio de 2024

Campos Neto “dribla” o mercado, mas cria armadilha ao Copom

Com economia forte retratada pelo Relatório de Inflação, presidente do BC surpreende ao dizer que indicação do mercado para corte de juro em junho de 2023 atende objetivo de levar inflação para a meta

O Banco Central terá uma árdua tarefa pela frente se o mercado dobrar a aposta em corte da taxa de juro mais cedo antes do primeiro semestre de 2023. O movimento foi intensificado nesta semana com a divulgação de três índices de inflação em quedas acima do esperado: IPCA-15, Índice de Preços ao Produtor (IPP) e IGP-M.

As projeções de arrefecimento da inflação têm fortalecido a ideia de que a Selic pode ser reduzida antes da virada do primeiro semestre de 2023. Essa avaliação pode precipitar uma reprecificação de ativos e dificultar o trabalho do BC para baixar a inflação.

A inflação ainda está muito alta. Não é à toa que o BC pretende manter a taxa de juros em 13,75% por um longo período para garantir sua convergência para a meta.

A economia, porém, responde aos juros mais longos. E a perspectiva de cortes antecipados da Selic tem efeitos: alivia as condições financeiras, tende a dar suporte para a atividade e torna menos eficiente o aperto monetário.

Inesperadamente, Roberto Campos Neto, presidente do BC, agiu para conter danos à frente – inevitáveis se a aposta em corte antecipado da Selic avançar – e não mediu palavras durante entrevista sobre o Relatório de Inflação, divulgado nesta quinta-feira, 29 de setembro.

Campos Neto afirmou que a curva de juros – portanto o mercado – aponta para corte de Selic em junho de 2023, talvez um pouco antes, e que, nesse horizonte, o BC atinge o objetivo de levar a inflação ao redor da meta.

O presidente do BC deu um drible no mercado no sentido de conter especulação sobre a queda da Selic. Entretanto, ergue uma armadilha para o Copom, caso o cenário sofra alteração relevante e a trajetória de queda da inflação não se confirme ou os preços voltem a subir.

E pode ser precipitado descartar um período de euforia nos mercados nas próximas semanas. De um lado, passada a eleição, a definição do próximo presidente é um redutor de incertezas. De outro, o próprio Relatório de Inflação é combustível para expectativas mais animadoras para a economia brasileira.

O documento do BC traz avaliações positivas sobre a atividade, reconhece que a inflação declina pela redução de impostos sobre combustíveis e energia elétrica e indica que essa tendência de queda pode ser amplificada pela fragilidade da economia internacional que tem no enfraquecimento dos preços das commodities um viés deflacionário.

O relatório pontua que a inflação, embora bem acima do teto da meta de 5% para este ano, caiu de 11,73% em junho para 8,73% em agosto. E a projeção do mercado declinou de 8,50% para 6%.

A projeção para o crescimento do PIB deste ano passou de 1,7% para 2,7% e o BC avalia que a economia avançará 1% em 2023.

O avanço do PIB deste ano é creditado particularmente ao vigor do crédito que a instituição estima crescerá 14,2% em 2022 e não mais 11,9% como previsto anteriormente.

Outro dado que reforça a percepção de que a economia vai bem é o aumento das importações que tiveram, segundo o BC, “alta acentuada em linha com o crescimento da atividade industrial e aumento das importações de adubos e fertilizantes, bens de capital e combustíveis”.

Com o mundo desacelerando, as exportações não tiveram evolução tão favorável no terceiro trimestre, inclusive, pelo arrefecimento dos preços internacionais de diversas commodities.

Em contraponto, diz o BC, os investimentos externos diretos no Brasil seguem em alta com “a melhora da atividade doméstica, lucratividade das empresas, retomada de projetos adiados pela pandemia e demanda por investimentos em energia, tecnologia e óleo e gás”, informa o Relatório de Inflação.

O BC também traz um alento quanto às contas públicas. Em três meses, desde o Relatório de Inflação de junho, a mediana das projeções para o resultado fiscal passou de déficit de R$ 12 bilhões para superávit de R$ 30 bilhões. E, se confirmado, será o primeiro desde 2013.

A perspectiva favorável para as contas do governo, pontua o BC, reflete uma arrecadação firme, sustentada sobretudo por receitas derivadas da renda fixa – reflexo do aumento das taxas de juros – e do resultado de empresas ligadas ao setor de commodities.

Fonte: Neofeed