O aniversário de 40 anos da Guerra das Malvinas, neste sábado (2), é marcado pela intensificação dos pedidos para o julgamento de militares argentinos na Corte Suprema do país por crimes contra a humanidade. Eles são acusados por ex-combatentes.
Na quinta (31), o Ministério Público decidiu acrescentar casos de abuso sexual e de antissemitismo a um processo aberto ainda em 2007. Soldados que se recusaram a lutar -porque não se encontravam em condições de enfrentar as poderosas tropas britânicas, por falta de treinamento, de armas e até de alimentação- alegam terem sido torturados e obrigados a ir ao campo de batalha.
Em quatro décadas, julgamentos pontuais acabaram sem conclusão ou com a absolvição dos acusados. Nesses casos, a defesa dos militares afirmou que os supostos delitos deveriam ser tratados segundo o código militar, o que terminava com sua liberação ou, depois de um tempo, com a prescrição.
Há 15 anos, porém, alguns juízes passaram de modo isolado a considerar alguns desses casos como crimes contra a humanidade. Os casos, ainda sem conclusão, inspiraram outros, e os ex-combatentes então apresentaram um conjunto de mais de 170 denúncias de abusos. O pedido é para que eles sejam tratados como os que foram cometidos pelas Forças Armadas na ditadura -e julgados como tal.
Em dezembro, o tema passou a ser avaliado pela Corte Suprema, dando esperanças aos antigos soldados de que os julgamentos passem a ocorrer com mais volume e celeridade.
“Precisamos que o Pode Judiciário se coloque à altura dos que foram vítimas. A Guerra das Malvinas também foi parte das ações da ditadura”, diz o ex-combatente Ernesto Alonso. “Os chefes militares que foram às Malvinas são os mesmos que comandaram os centros clandestinos de detenção e o aparato repressivo que vivemos de 1976 a 1983, quando ocorreram desaparecimentos, detenções e torturas.”
Entre os principais abusos denunciados está o de amarrar soldados seminus em árvores, por um dia ou uma noite, nos acampamentos das ilhas, conhecidas pelo clima de intempéries e baixas temperaturas. Outros incluíam enterrar jovens oficiais até a cabeça e deixá-los assim por dias, sem comer, e atirá-los sem roupa nos lagos e rios gelados do arquipélago. Também teriam sido usados métodos que, na Argentina, eram adotados contra presos políticos em centros clandestinos de detenção, como surras e choques elétricos.
A Guerra das Malvinas foi desatada por parte da ditadura argentina, então liderada pelo general Leopoldo Galtieri. Como o regime imposto pelo golpe em 1976 vinha caindo em descrédito -em meio à crise econômica, aos anos de autoritarismo e ao desaparecimento de cidadãos-, Galtieri apelou para o sentimento de patriotismo e afirmou que enviaria tropas para “retomar” as ilhas Malvinas (ou Falkland, para os britânicos e habitantes locais).
A causa é sensível até hoje, com os argentinos sentindo que o arquipélago lhes pertence -apesar de ser habitado por britânicos e seus descendentes há várias gerações e de constituir um estado associado ao Reino Unido, tendo inclusive votado em referendo a determinação de continuar com esse status.
A estratégia de Galtieri funcionou num primeiro momento, com o apoio de grande parte da sociedade à invasão das ilhas pelas Forças Armadas argentinas. Depois de o governo de Margaret Thatcher mandar tropas para expulsar os argentinos, porém, a opinião pública aos poucos foi se dando conta de que um massacre se avizinhava. E assim foi.
A guerra terminou em 14 de junho, com a rendição de Buenos Aires e um saldo de 649 mortos do lado argentino e 255 mortos do britânico.
Fonte: FolhaPress/Sylvia Colombo