O presidente Jair Bolsonaro tem até o dia 22 de abril para sancionar o Orçamento de 2021, aprovado em 25 de março pelo Congresso. Mas, antes de assinar o documento que define as despesas e receitas do ano, o governo precisa resolver o impasse que tem atrasado a sanção: como tornar o projeto viável, diante das mudanças que subestimam os gastos obrigatórios?
O texto aprovado por deputados e senadores prevê um volume alto de recursos destinados a emendas parlamentares e, ao mesmo tempo, cortes injustificados em despesas obrigatórias — como com aposentadorias, pensões e auxílios. Em resumo, os gastos obrigatórios previstos ficaram abaixo do que realmente precisará ser desembolsado pelo governo para cobri-los.
O Orçamento traz uma previsão de despesas obrigatórias 32,7 bilhões de reais menor do que deveria, de acordo com cálculos da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara. As despesas obrigatórias são aquelas que não podem deixar de ser pagas, como benefícios da Previdência, abono salarial, entre outras.
Parte do dinheiro que iria para esses gastos sociais foi realocado para pagamento de emendas parlamentares, que são verbas carimbadas por deputados e senadores para obras em redutos eleitorais, geridas, no caso, pelo Ministério do Desenvolvimento Regional.
O Congresso retirou 13,5 bilhões de reais dos benefícios previdenciários, 2,6 bilhões de reais do seguro-desemprego e 7,4 bilhões de reais do abono salarial para colocar em emendas. Isso tudo com base em números defasados, calculados com base em valores desatualizados do salário mínimo e da inflação.
O impacto estimado pela Consultoria de Orçamento da Câmara é de 8,3 milhões de reais com a atualização dos números. Os cálculos presentes na peça orçamentária foram feitos em cima do salário mínimo previsto em 2020, de 1.067 reais, não nos 1.100 reais atuais. Todas as despesas com benefícios são pagas com base no salário mínimo.
Era dever do governo federal enviar uma mensagem modificativa para corrigir os valores com referência nos novos parâmetros encaminhados em dezembro de 2020, mas isso não ocorreu. Sem essa iniciativa do Executivo, o Congresso também não fez a atualização.
E agora?
Para resolver o impasse, a saída apontada pelo Ministério da Economia é o corte em emendas parlamentares, por meio de veto presidencial, para viabilizar o pagamento das despesas obrigatórias. O governo enviaria um projeto de lei depois (PLN), para redistribuir o dinheiro e garantir pagamentos essenciais, sem precisar cortar bilhões das despesas discricionárias, que correspondem a uma fatia pequena do Orçamento, de cerca de 5%.
O relator do Orçamento, Marcio Bittar (MDB-AC), propôs retirar 10 bilhões de reais das emendas de relator. O valor, entretanto, ainda é considerado insuficiente pelo Ministério da Economia, que espera um corte maior, de até 30 bilhões de reais, para cobrir a previsão subestimada nos gastos obrigatórios.
No Congresso, porém, o entendimento majoritário é de que não dá para tirar todo esse valor das emendas, porque elas já foram calculadas com base em números defasados. A perda, portanto, poderia ser muito grande. Os parlamentares também alegam que todas as decisões foram tomadas com o acompanhamento do Ministério da Economia, que poderia ter sugerido mudanças durante a tramitação.
É pedalada?
Há divergência sobre o que acontecerá com o presidente Jair Bolsonaro, caso ele sancione o Orçamento sem mudanças. De um lado, existe o entendimento de que, se ele não resolver o impasse, pode ser enquadrado em crime de responsabilidade fiscal. A possibilidade de “pedaladas” será estudada por auditores do Tribunal de Contas da União (TCU) na análise das contas do presidente.
Um grupo de parlamentares apresentou ao tribunal um requerimento pedindo manifestação formal sobre o corte de 26,5 bilhões de reais em despesas obrigatórias, como aposentadorias, para inflar emendas. Por outro lado, deputados e senadores, incluindo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), têm atuado para que o TCU não se posicione contra o Orçamento.
A Consultoria de Orçamento do Senado, em nota técnica, concluiu que Bolsonaro não poderia ser enquadrado em crime de responsabilidade fiscal na situação atual. Segundo consultores, o governo pode adotar medidas corretivas, como apresentar projeto de lei de crédito suplementar para recompor as dotações que sofreram cortes, cancelando, em contrapartida, valores destinados a emendas.
“Por se tratar de ato político e, por não constar do rol de tipificações da Lei 1.079/1950 [que define os crimes de responsabilidade], a sanção não poderia isoladamente ser considerada crime de responsabilidade, devendo atos seguintes, devidamente tipificados, serem observados na execução orçamentária”, diz a nota técnica.
Outra possibilidade é suplementar as despesas primárias por meio de cancelamento de dotações, excesso de arrecadação e superavit financeiro. Também é possível, por veto, abrir espaço para envio de projeto de lei de crédito suplementar para realocar recursos. Independentemente da escolha, o mais provável é que Bolsonaro acabe se indispondo com o Congresso, que não é a favor de nenhuma mudança que diminua as emendas parlamentares.
Fonte: Exame