CLARA BALBI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Talvez mais do que as outras artes, o teatro foi obrigado a se reinventar neste ano. Sua definição como uma experiência de tempo e espaço compartilhada com a plateia fez com que a atividade fosse vista como inviável diante das medidas de distanciamento social e inepta para o virtual. O choque da pandemia a princípio paralisou o setor.
Levou um tempo, assim, até que a área apostasse no digital. Quando enfim se rendeu a ele, criou algumas das obras mais radicais da quarentena –ou melhor, experimentos, já que diretores e atores classificam esses espetáculos como teatro. Ao mesmo tempo, o formato encontrado enfrenta dificuldades para ser financiado e para alcançar um público pagante.
O coronavírus começou afetando os dois principais festivais de teatro do país. A MITsp, Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, estava em curso quando a pandemia fechou a capital paulista, na segunda semana de março, e teve parte de sua programação cancelada. Já o Festival de Curitiba, previsto para o final daquele mês, foi substituído por uma versão online em setembro, com menos de 5% do número de espetáculos da sua edição anterior.
Dali, demorou cerca de um mês até que surgissem as primeiras peças online. Enquanto as lives musicais caseiras faziam sucesso, companhias disponibilizavam filmagens de montagens históricas na internet, e alguns poucos atores encenavam cenas e monólogos ao vivo nas suas redes sociais, gratuitamente.
Um dos primeiros passos em direção a uma presença mais estruturada na internet foi dado pelo Sesc. Em abril, ele passou a exibir três vezes por semana monólogos adaptados de peças já encenadas, interpretadas pelos atores diretamente das suas casas.
Até que, em maio, começaram a pipocar os primeiros espetáculos virtuais inéditos, muitos deles usando o aplicativo de teleconferências Zoom. Neles, os atores, antes vistos de longe pela plateia, apareciam mais próximos do que nunca, seus rostos em close. Os cenários, formados por imagens digitais, se transformavam num clique. E recursos próprios do cinema e das redes sociais eram pegos de empréstimo pelo teatro para moldar uma linguagem híbrida, inovadora.
Houve, entre outros, obras baseadas em trocas de mensagens com o espectador via redes sociais, como “Tudo o que Coube numa VHS”, do grupo Magiluth; trabalhos interativos, em que o público decidia os rumos da trama, como “Caso Cabaré Privê”, do Núcleo Pequeno Ato, e “Parece Loucura, Mas Há Método”, da Armazém Companhia de Teatro; montagens que confundiam realidade e ficção, como “Peça”, monólogo de Marat Descartes dirigido por Janaina Leite, e “ExReality”, da ExCompanhia de Teatro, além de podcasts, como o “O Bailado do Deus Morto”, do Teatro Oficina e “Que Dia É Hoje?”, do dramaturgo Vinicius Calderoni e, mais recentemente, espetáculos transmitidos diretamente dos palcos dos teatros.
O problema é que, mesmo com tanta criatividade, esse formato virtual não dá sinais de ser viável comercialmente, segundo profissionais da área.
Em parte porque, mesmo custando até 15 vezes menos do que uma montagem normal, essas produções ainda penam para alcançar o público, desacostumado a pagar por entretenimento na internet.
Mas, acima de tudo, por causa da dificuldade de conseguir patrocínios. Sentida pela classe pelo menos desde os cortes da Petrobras no ano passado, ela só cresceu no online.
Por enquanto, assim, o maior alívio dos profissionais da área tem sido a lei de emergência cultural, a Lei Aldir Blanc. Ela destinou R$ 3 bilhões do governo federal aos estados e municípios, operando em três frentes –renda emergencial mensal para os trabalhadores da cultura; subsídio mensal para manutenção de espaços culturais; e editais e outros instrumentos que visam a manutenção de iniciativas culturais.
Vale reconhecer o esforço de profissionais e de entidades do teatro, como a APTR, a Associação de Produtores de Teatro, ou movimento Artigo Quinto, entre outras, para a criação e a operacionalização da lei. Eles não só ajudaram a pressionar o Congresso a elaborá-la diante da inação da então secretária de Cultura Regina Duarte, como vêm se organizando para solucionar eventuais problemas nos textos dos editais e auxiliando trabalhadores e espaços com a burocracia para pedir o auxílio.
O plano, no entanto, é que os recursos da Aldir Blanc tenham sido repassados até o fim deste ano e o programa seja então finalizado. E aí a situação desses trabalhadores pode se complicar de novo.
Isso porque é improvável que os teatros voltem a funcionar normalmente nos primeiros meses de 2021, dado o crescimento de casos de Covid-19 e a incerteza sobre a vacina. As poucas casas de espetáculo paulistanas que optaram por abrir com a permissão do governo estadual há dois meses relatam poucos espectadores e custos altos de higiene.
Um caminho que talvez pudesse aliviar um pouco a crise é aquele indicado pelo musical “Hamilton”, de Lin-Manuel Miranda. Sua versão filmada não só bateu recordes de exibição no streaming, como convenceu muitos a assinar a plataforma Disney+. No ano que vem, a Netflix, que já tem outras peças de teatro filmadas no seu catálogo – entre stand-ups de humoristas nacionais e o musical “Shrek”–, lança um musical da Broadway sobre a princesa Diana, impedido de estrear por causa do coronavírus.
Por aqui, no entanto, não há planos nesse sentido. E, sem uma vacina, a incerteza prevalece no teatro.
Uma companhia paulistana, a Bendita Trupe, até tentou propor um espetáculo adaptado ao “novo normal” em outubro, dividindo o público em cabines de plástico individuais e incorporando máscaras e borrifadores de álcool 70% às cenas. A moda não pegou –nenhuma outra peça estreou nos mesmos moldes desde então.
Cultura
Terça-feira, 23 de julho de 2024
Dólar | R$ 5,18 | 0,000% |
Peso AR | R$ 0,03 | 0,164% |
Euro | R$ 5,59 | 0,000% |
Bitcoin | R$ 114.180,92 | 0,096% |
Parlamentares russos querem punição para tropas que usam smartphones na guerra da Ucrânia
Projeto sugere que dispositivos pessoais que permitem filmagem, gravação de áudio e transmissão de geodados na zona de combate sejam classificados como infração disciplinar grave, informou a mídia estatal A câmara baixa do parlamento russo, chamda de Duma, propôs detenção disciplinar de até 10 dias para tropas que usarem dispositivos com funções de câmera e...
No Mundo
Reforma da renda: o que já é discutido e como pode impactar a economia do país
Especialistas ouvidos pela CNN apontam para aumento da arrecadação, crescimento econômico e redução de desigualdades Em paralelo à discussão da reforma tributária sobre o consumo, cuja regulamentação foi aprovada pela Câmara dos Deputados no dia 10 de julho, evolui no Brasil e no mundo o debate da reforma sobre a renda. Esse é um outro pé...
Economia
Hamas e Fatah assinam acordo para formar governo de unidade após fim da guerra
Os grupos palestinos Hamas e Fatah, que regem a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, respectivamente, assinaram nesta terça-feira (23) um acordo no qual concordam em encerrar suas divisões e formar um governo de unidade nacional provisório uma vez que termine a guerra iniciada em outubro.O anúncio foi feito pelo Ministério das Relações Exteriores da...
No Mundo
Como a Dior quer fazer do e-commerce sua principal fonte de receita no Brasil
Vendas de cosméticos e perfumes pela plataforma digital da marca vem dobrando a cada ano desde sua implementação, afirma country manager da marca no Brasil Quando o mercado de luxo decidiu levar suas operações para o e-commerce, estava ciente das barreiras que iria encontrar. A da segurança, por envolver o transporte de produtos de altíssimo valor. A do...
Negócios
Ciro Gomes se aproxima de nomes ligados ao bolsonarismo durante convenções no Ceará
Ex-governador esteve ao lado de políticos do PL, sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro, em eventos no último fim de semana Ciro Gomes (PDT), ex-governador do Ceará, esteve ao lado de políticos do PL, sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro, durante convenções partidárias que lançaram pré-candidaturas no interior do Ceará. Imagens divulgadas nas redes sociais mostram Ciro...
Política
Nunes aparece em convenção do PL e chama Boulos de invasor e vagabundo
Na convenção do PL, que confirmou o ex-Rota Ricardo Mello Araújo como pré-candidato a vice na chapa de Ricardo Nunes (MDB), o prefeito se referiu ao seu principal adversário, Guilherme Boulos (PSOL), como vagabundo, invasor e sem vergonha.Em um aceno aos bolsonaristas, Nunes agradeceu o voto de confiança do PL e emendou, sem citar nominalmente...
Política
Análise: Harris teve um início dos sonhos, mas a tarefa pela frente é monumental
Se o legado de Biden for uma desvantagem eleitoral, Harris poderá pagar o preço O vice-presidente já conquistou o apoio de delegados suficientes para garantir a nomeação democrata, desencadeou uma bonança de angariação de fundos e mudou o estado de espírito de um partido que parecia caminhar para a derrota. Num discurso entusiasmante na tarde...
No Mundo