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Sexta-feira, 21 de março de 2025

Pentágono inclui Musk em reunião ultrassecreta sobre possível guerra com a China

Ainda não está claro por que Musk teria sido incluído em uma reunião tão sensível; Trump nega que guerra com a China seja pauta

O Pentágono agendou para esta sexta-feira (21) uma reunião com Elon Musk para apresentar ao bilionário os planos militares dos Estados Unidos em caso de um eventual conflito com a China, afirmaram dois oficiais americanos na quinta-feira (20).

Outro integrante do governo confirmou que o encontro teria foco na China, sem dar mais detalhes. Um quarto oficial disse que Musk estaria de fato no Pentágono, mas não revelou o motivo da visita.

Poucas horas após a reportagem do The New York Times revelar o encontro, autoridades do Departamento de Defesa e o presidente Donald Trump negaram que o objetivo fosse discutir estratégias militares envolvendo a China. “A China nem será mencionada ou discutida”, disse Trump em uma publicação nas redes sociais durante a madrugada.

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Não estava claro se o briefing aconteceria conforme o planejado. Caso ocorresse, conceder a Musk acesso a alguns dos segredos mais sensíveis da área de Defesa dos EUA representaria uma ampliação significativa de seu já crescente papel como conselheiro informal de Trump e figura central nos planos do governo para cortar gastos e remodelar a máquina pública.

O episódio também chama atenção para possíveis conflitos de interesse, já que Musk transita com influência pela estrutura federal enquanto comanda empresas que são grandes fornecedoras do governo. Musk, CEO da SpaceX e da Tesla, é hoje um dos principais parceiros comerciais do Pentágono — e tem amplos interesses financeiros na China.

Os chamados “O-plans” (operational plans), como são conhecidas internamente as estratégias de guerra do Pentágono, estão entre os documentos mais protegidos do aparato militar americano. Se um país estrangeiro souber como os EUA planejam atacá-lo, pode fortalecer suas defesas e minimizar vulnerabilidades — o que comprometeria seriamente a eficácia dos planos.

Segundo fontes com conhecimento do conteúdo, o briefing ultrassecreto relacionado a um eventual conflito com a China tem cerca de 20 a 30 slides. O material descreve como os EUA reagiriam a uma escalada, desde os primeiros sinais de ameaça até a definição de alvos militares chineses, com prazos e alternativas que seriam submetidas ao presidente para decisão.

A Casa Branca não respondeu a um pedido de comentário sobre os objetivos da visita, como ela foi organizada, se Trump tinha conhecimento e se a presença de Musk representaria um potencial conflito de interesses. O governo também não esclareceu se Trump assinou alguma isenção ética permitindo a participação de Musk nesse tipo de reunião.

O principal porta-voz do Pentágono, Sean Parnell, inicialmente não respondeu aos questionamentos. Logo após a publicação da reportagem do NYT, ele divulgou uma breve nota: “O Departamento de Defesa está entusiasmado em receber Elon Musk no Pentágono nesta sexta-feira. Ele foi convidado pelo secretário Hegseth e está apenas em visita.”

Cerca de uma hora depois, Parnell publicou na rede X (ex-Twitter): “Isso é 100% fake news. Totalmente e maliciosamente errado. Elon Musk é um patriota. Estamos orgulhosos de recebê-lo no Pentágono.”

O secretário de Defesa, Pete Hegseth, também comentou na rede social: “Isso NÃO é uma reunião sobre ‘planos de guerra ultrassecretos com a China’. É um encontro informal para tratar de inovação, eficiência e produção inteligente. Vai ser ótimo!”

Meia hora depois, o Wall Street Journal confirmou que Musk estava sim programado para receber um briefing sobre o planejamento militar dos EUA em caso de guerra com a China.

Independentemente da pauta final, o episódio escancara o papel singular de Musk, que é ao mesmo tempo o homem mais rico do mundo e uma figura com poderes amplos delegados por Trump.

Musk possui autorização de segurança, e cabe a Hegseth determinar quem deve ter acesso aos planos.

Fontes relataram que, além de Hegseth, participariam da apresentação o almirante Christopher W. Grady, presidente interino do Estado-Maior Conjunto, e o almirante Samuel J. Paparo, comandante do Comando Indo-Pacífico. Eles detalhariam o plano americano para enfrentar a China em um cenário de conflito militar.

A reunião não seria realizada no gabinete de Hegseth — onde encontros informais geralmente ocorrem —, mas sim na “Tank”, uma sala de conferências segura do Pentágono, reservada a reuniões de alto nível entre membros do Estado-Maior, assessores e comandantes militares.

Planos operacionais para conflitos de grande escala, como uma guerra com a China, são tecnicamente complexos e de difícil compreensão para quem não tem formação em planejamento militar. Por isso, presidentes costumam receber apenas um panorama geral — e não os detalhes do plano. Não se sabe quantas informações Musk desejava ou esperava obter.

Hegseth, por sua vez, já havia sido informado sobre partes do plano em dois briefings recentes — um na semana passada e outro na quarta-feira.

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Ainda não está claro por que Musk teria sido incluído em uma reunião tão sensível. Ele não ocupa cargo na hierarquia militar nem é conselheiro formal de Trump em temas ligados à Defesa.

Uma possível justificativa seria sua atuação à frente do chamado DOGE (Departamento de Eficiência Governamental). Caso a equipe deseje propor cortes no orçamento do Pentágono de forma estratégica, pode ser necessário conhecer os sistemas de armas que os EUA planejam utilizar em uma guerra com a China.

Ainda assim, os interesses empresariais de Musk tornam delicado qualquer acesso a informações confidenciais sobre a China. Especialistas em ética apontam riscos claros. Parte das revisões recentes nos planos militares americanos envolve estratégias de defesa contra ataques no espaço. A China já desenvolveu armamentos capazes de atingir satélites americanos.

Os satélites Starlink, em órbita terrestre baixa, operados pela SpaceX, oferecem serviços de comunicação e dados e são considerados mais resilientes que satélites tradicionais. Musk, portanto, teria interesse em saber se os EUA conseguiriam protegê-los em caso de conflito.

Participar de um encontro confidencial sobre ameaças da China, ao lado dos principais nomes da Defesa americana, representaria uma oportunidade valiosa para qualquer empresa que queira vender soluções ao governo.

Musk poderia identificar demandas futuras e ajustar a oferta da SpaceX, que ele ainda comanda como CEO.

Paralelamente, Musk é alvo de uma investigação do inspetor-geral do Pentágono sobre possíveis falhas no cumprimento dos requisitos de sua autorização de segurança de nível ultrassecreto.

A apuração começou no ano passado, após denúncias de funcionários da SpaceX a órgãos federais, alegando que Musk e outros executivos não estavam relatando contatos com autoridades estrangeiras — como exigem os protocolos.

Antes do fim do governo Biden, a Força Aérea iniciou sua própria análise, após senadores democratas questionarem a conduta de Musk e alegarem que ele descumpria regras de segurança.

A Força Aérea chegou a negar um pedido de Musk para obter uma autorização ainda mais restrita — conhecida como Special Access Program — alegando riscos de segurança associados ao bilionário.

A SpaceX se tornou tão estratégica para o Pentágono que o governo chinês já declarou considerar a empresa uma extensão do Exército americano.

Um estudo publicado no ano passado pela Universidade Nacional de Tecnologia de Defesa da China, traduzido pelo Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, tinha o seguinte título: “Militarização da Starlink e seu impacto na estabilidade estratégica global.”

Musk e a Tesla, sua montadora de carros elétricos, dependem fortemente da China. A fábrica da empresa em Xangai, inaugurada em 2019 com autorização especial do governo chinês, é uma das mais avançadas do grupo e responde por mais da metade das entregas globais da marca.

Em 2023, a Tesla informou que possuía um contrato de financiamento de US$ 2,8 bilhões com instituições chinesas para custear sua produção local.

Publicamente, Musk evita críticas a Pequim e já demonstrou disposição para colaborar com o Partido Comunista Chinês. Em 2022, escreveu um artigo para a revista da Administração do Ciberespaço da China — a agência de censura do país — promovendo suas empresas e suas missões em favor da humanidade.

Naquele mesmo ano, disse ao Financial Times que Taiwan deveria ser transformada em uma “zona administrativa especial aceitável”, dando algum controle à China — declaração que irritou políticos da ilha. Na mesma entrevista, afirmou que Pequim exigiu garantias de que ele não venderia a Starlink na China.

No ano seguinte, em uma conferência de tecnologia, Musk afirmou que Taiwan era “parte integral da China que, arbitrariamente, não é tratada como tal” — e comparou a situação ao Havaí em relação aos EUA.

Na rede X, plataforma que ele comanda, Musk frequentemente elogia a China. Já disse que o país é “de longe” o líder mundial em veículos elétricos e energia solar, e que o programa espacial chinês é “muito mais avançado do que as pessoas pensam”. Também incentivou mais pessoas a visitarem o país e chegou a dizer que uma aliança entre Rússia e China seria “inevitável”.

Fonte: InfoMoney