Data Mercantil

Entenda a crise da DM9 após escândalo de uso de Inteligência Artificial em campanha

Uma das maiores agências de publicidade do Brasil, a DM9, está em meio a uma crise causada pelo uso de inteligência artificial. A agência teria manipulado imagens de uma campanha por meio da tecnologia.

O escândalo envolvendo a DM9 e o uso de Inteligência Artificial em uma peça publicitária culminou na demissão de um executivo da agência, na devolução de prêmios por conta de uma investigação interna e na ruptura no contrato com a Consul.

O caso figura como um dos maiores escândalos do mercado publicitário e traz à tona o debate sobre os limites do uso de IA no mercado criativo.

O empresário, conselheiro de empresas como Exxata e KPL Supply e M&A advisor, Roberto Valverde, avalia que o caso reflete um cenário no qual ‘tudo é novo’ e que naturalmente o ser humano se beneficia de ferramentas inovadoras até que chegue a regulação.

“Outros casos assim devem aparecer, mas talvez não nesse nível de exposição internacional. Lembrando que nesse caso em específico foi a maior sanção para uma agência brasileira”, comenta.

Qual foi a peça publicitária feita para a Consul

A DM9 produziu uma peça publicitária chamada “Economia Eficiente de Energia” para a Consul, marca de eletrodomésticos.

A campanha incentivava pessoas a trocarem eletrodomésticos velhos por novos, usando a economia que teriam na conta de luz para bancar o novo produto, mais econômico.

O trabalho em questão foi premiado no Cannes Lions 2025, o festival de maior prestígio do universo da publicidade.

Ao fim de junho, a agência ganhou o Grand Prix da categoria Creative Data na premiação. Todavia, a medida foi revertida pouco tempo depois.

Uso de Inteligência Artificial foi descoberto

O vídeo produzido pela agência para a Consul continha manipulação de imagens com o uso de Inteligência Artificial que simulava resultados de campanha.

A campanha usou IA até mesmo para adulterar uma reportagem da CNN Brasil sobre o setor energético, mas que foi manipulada para parecer que divulgava a iniciativa da Consul, com alteração de narração da jornalista e apresentadora Gloria Vanique no vídeo feito pela DM9.

Com a descoberta, nove dias depois da premiação, o Cannes Lions pediu a cassação do prêmio.

Os desdobramentos

Após o caso, a DM9 fez uma investigação interna e encontrou inconsistências em outros trabalhos que integravam a premiação.

A DM9 encontrou problemas em outras campanhas, como “Plastic Blood” e “Death Gold”, de outros clientes, e então retirou as inscrições dessas duas campanhas. Com isso, devolveu outros dez prêmios conquistados por esses trabalhos em Cannes.

O então copresidente, Chief Creative Officer (CCO) e líder da produção desses trabalhos, Ícaro Doria, saiu da operação da DM9 em comum acordo entre as lideranças da agência.

Segundo o site Meio & Mensagem, a Consul, da Whirlpool, decidiu romper o contrato para com a agência. A IstoÉ Dinheiro questionou a DM9 que respondeu que não iria comentar o caso, reforçada nota à imprensa divulgada anteriormente (ver abaixo).

Fontes do mercado informaram à IstoÉ Dinheiro que o valor da conta Consul pode girar na casa dos R$ 120 milhões anuais. A agência tampouco confirmou esse valor ou deu detalhes sobre as cifras do contrato.

Uso de IA em debate

O caso intensifica as discussões sobre o uso de IA no mercado publicitário e pressiona organizações a reformularem regras e regulamentos para contemplarem uma nova realidade.

Valverde avalia que ‘com certeza’ haverá um grande redesenho de regras. Além disso, adiciona que o cenário revela uma corrida das agências para lidar com o tema.

“É como se o Oscar tivesse que ser redesenhado por beneficiar filmes norte-americanos em anos passados. É inevitável que vai existir o redesenho da premiação, a indústria de publicidade e criação está em xeque. As grandes agências estão fazendo fusões por conta da perda de receita.”

Sobre governança, explica que, até então, o tema de IA e tecnologia era debatido de forma superficial dentro das agências, mas que agora mecanismos de controle e outras práticas devem vir à tona para lidar com o novo panorama, envolvendo o compliance das empresas.

Além disso, o especialista avalia que o caso da DM9 é emblemático e que o contexto pode balizar cláusulas que garantam que o material produzido para clientes por agências seja de fato produzido por humanos – com pouco ou nenhum uso de Inteligência Artificial.

O que diz a DM9

Leia o comunicado da agência na íntegra:

Após uma investigação conduzida pelo board da agência, constatou-se que três dos cases inscritos pela DM9 no Festival de Criatividade Cannes Lions deste ano apresentavam inconsistências graves relacionadas à veracidade ou legitimidade dos trabalhos apresentados.

Os fatos culminaram no afastamento imediato de Icaro Doria, ex-copresidente e CCO e líder da produção desses cases, responsável direto pelas falhas.

A DM9 confirma a retirada dessas três inscrições de 2025:
* “Efficient Way to Pay”, para Consul, foi retirada após a descoberta de que inteligência artificial foi utilizada para criar duas cenas que não refletiam fielmente a execução real do projeto.
* “Gold = Death”, para Urihi Yanomami, e
* “Plastic Blood”, para OKA Biotech, também foram retirados devido à insatisfação com o nível de legitimidade de cada um dos trabalhos.

Os prêmios eventualmente conquistados por esses trabalhos serão devolvidos ao Festival.

A DM9 pede desculpas, sem reservas, ao Festival de Criatividade Cannes Lions, aos jurados que dedicaram seu tempo e cuidado para avaliar seus trabalhos, e à indústria como um todo.

A equipe de liderança executiva da DM9 permanece comprometida em agir com integridade e manter os mais altos padrões para seus clientes, pessoas e negócios.

Em espírito de transparência e responsabilidade, a DM9 se compromete com um processo que garantirá que todos os projetos atendam aos mais elevados padrões éticos. Além disso, a agência implementará um Comitê de Ética em Inteligência Artificial, para estabelecer diretrizes claras e melhores práticas para o uso responsável de IA e tecnologia em seus processos criativos. Em breve, serão anunciados os integrantes do comitê, bem como modelo de práticas implementadas para garantir a integridade de todas as ações e campanhas da agência.

Fonte: IstoéDinheiro

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