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Planet Hemp lança novo álbum e fala à CNN: “Momento político cobrou nossa volta”

Marcelo D2, BNegão e Pedro Garcia conversam sobre o primeiro lançamento em 22 anos de uma das bandas de rock brasileiras mais influentes da música nacional

Já faziam mais de duas décadas desde a última vez que foi possível dar a notícia de um lançamento do Planet Hemp.

A banda capitaneada por Marcelo D2 e BNegão – que marcou o rock nacional dos anos 1990 e não colocava um álbum na praça desde 2000 – lança, nesta sexta-feira (21), um disco com 15 faixas inéditas.

Em uma conversa com a CNN de cerca de meia hora pelo Zoom, BNegão, D2 e o baterista Pedro Garcia refletiram sobre o retorno criativo do grupo.

Retorno criativo porque a volta aos palcos já tinha acontecido. Separados em 2003 por conflitos internos, desde 2012, quando se reuniram para uma apresentação celebrando o aniversário da casa de shows carioca Circo Voador, o Planet Hemp não parou mais de tocar.

“Era sempre naquele esquema ‘greatests hits’, com as músicas dos discos que já viraram históricos para muita gente. Achávamos que o lugar do Planet ia ser esse. Já estava tudo construído ali. Íamos fazer nossas paradas nas carreiras solos”, contou BNegão.

Com o engajamento por causas sociopolíticas entranhado no DNA da banda, eles se sentiram cobrados a produzir por conta do momento turbulento da política nacional.

O momento político cobrou nossa volta. Muitas pessoas nos falaram que criaram interesse para ter consciência social por causa das primeiras letras do Planet Hemp. Então a galera cobrava muito: Cadê vocês no meio dessa confusão toda que o Brasil tá passando?BNegão, vocalista do Planet Hemp

Planet Hemp lança primeira música em 22 anos. / Bel Gandolfo

Com carreiras artísticas individuais consolidadas e a maturidade da idade, as discussões internas na dinâmica da banda perderam o peso.

“Esse retorno veio em um momento maduro pra caramba de todo mundo. Isso só a idade e a estrada trouxe. Colocamos no eixo que esse disco seria de banda, e a gente ia ter que deixar nossas vontades próprias um pouco de lado”, disse D2.

“A não ser que fosse uma coisa muito gritante, mas ouvimos e confiamos bastante um no outro nesse processo”, acrescentou.

Inclusive, o nome do álbum, “Jardineiros”, para além da óbvia referência do ativismo histórico do grupo a favor da legalização da maconha, também é uma referência a atual forma do grupo pensar

“É o jeito que a gente quer levar a vida. O bem comum, não é o bem próprio”, pontuou BNegão, que “plantou” a ideia do nome.

“Vi como a gente tava tendo cuidado um com o outro. O quanto o disco fala sobre semear, plantar, cuidar”, complementou Marcelo D2.

Planet Hemp lança primeiro álbum em 22 anos. / Fernando Schlaepfer / Divulgação

“A morte caminhou ao lado”

Esse disco começou a ser produzido na metade de 2019, quando a banda fez um retiro de 10 dias no estúdio de uma fazenda na cidade de Santo Antônio, no interior da Bahia.

No início daquele ano, os membros do Planet Hemp passaram pela perda de um colega e grande influência da banda: Marcelo Yuka, fundador da banda O Rappa, que morreu aos 53 anos por complicações de um AVC.

“Jardineiros” é aberto com uma homenagem póstuma ao falecido músico, poeta e ativista, em uma faixa intitulada “Marcelo Yuka”, que traz um trecho de uma entrevista dele concedida em 2016.

Fica claro a emoção deles ao relembrar de Yuka. “Ter uma faixa com o nome dele simboliza muito o que é o disco. O reconhecimento de quem luta por coisas importantes e está pelo ‘nós’, não pelo ‘eu’. O Yuka era um Planet Hemp”, disse D2.

Outro “Planet Hemp” que tem a memória evocada no álbum é Skunk, o vocalista e fundador do grupo, que morreu em 1994 por complicações da Aids, antes do lançamento do primeiro álbum da banda.

Planet Hemp se apresenta no Lollapalooza Brasil de 2022, substituindo a banda Foo Fighters, após a morte do baterista Taylor Hawkins. / Léo Lopes / CNN

“O Skunk é uma pessoa muito presente na minha memória. Ele é um norte que me ajudou muito a me reconhecer. A imagem dele, do Yuka, representa muito a ideia do que a gente acredita. Faz falta e é nosso dever gritar Yuka, Skunk, Chico Science, Speedfreaks”, acrescentou D2.

Para além da memória dos ex-companheiros de música, a produção do álbum foi interrompida pela chegada da pandemia, quando o sentimento de luto se tornou invariavelmente presente para os brasileiros.

” A morte caminhou ao lado [no processo de produção do disco]”, relembrou D2, que, assim como BNegão, perdeu a mãe no ano passado.

Disco foi produzido em processo coletivo

Em “Jardineiros”, o Planet Hemp passeia por diferentes vertentes sonoras, que reflete também o processo de produção pelo qual o álbum surgiu.

Enquanto o baterista Pedro Garcia foi o produtor da banda em contato com todo a criação do disco, ele e D2 explicam que outras pessoas também foram convidadas para construir o projeto.

O primeiro deles foi o catarinense Vinicius Leonard Moreira, o produtor Nave Beatz, que já havia trabalhado com D2 na carreira solo, e ganhou Grammy Latino assinando o disco “AmarElo”, do Emicida.

Planet Hemp lançou primeira música em 22 anos. “Distopia” é uma parceria com rapper paulistano Criolo. / Bel Gandolfo

“Ele tem um bom gosto e é eclético o suficiente para produzir um disco do Planet Hemp, dialogando junto”, contou Marcelo D2.

Em seguida veio o paulistano DJ Zegon ( Zé Gonzáles), que assumia as picapes do Planet Hemp na segunda metade dos anos 1990, e desde 2012 é reconhecido pelo projeto Tropkillaz.

D2 contou que essas colaborações culminaram no retorno de Mário Caldato Jr. – produtor brasileiro residente nos EUA, que já havia assinado a produção de outros dois álbuns do Planet Hemp, e também já trabalhou com nomes internacionais como Beastie Boys e Jack Johnson.

Sample de MC Carol e retorno de Black Alien

O resultado dessa produção a várias mãos é perceptível na audição do álbum, que lança mão de beats e samples mais modernos, sem abandonar o “rap-rock’n’roll-psicodelia-hardcore-e-ragga” cantado há 20 anos.

Enquanto “Taca Fogo”, “Distopia” e “Fim do Fim”, por exemplo, trazem de volta as guitarras pesadas, “Onda Forte”, “Ainda” e “Remedinho” abrem mais espaço para beats e samples se destacarem – com destaque para a primeira, em uma parceria sampleada com “Bateu Uma Onda Forte”, de MC Carol.

Tracklist:

Outra música marcante é “O Ritmo e a Raiva”, uma espécie de mini-biografia em exaltação à história do Planet Hemp, que marca o retorno do rapper Black Alien ao grupo.

“Gravamos duas músicas com ele. Uma delas vai nessa leva de agora. A gente impôs essa parceria. [risos] Falamos: ‘A gente vai voltar e você tem que estar, se não nem vai ter disco’. Ele faz parte desse leque que falamos, de pessoas que estão no embrião da banda”, pontuou D2.

“A presença dele era muito importante para os fãs, mas também pra gente. Pra sabermos que estamos vivos. Conversamos disso no aniversário de 50 anos dele. Sobrevivemos à Lapa dos anos 90, à juventude em uma cidade como o Rio”, completou.

Com os últimos ajustes afinados faltando poucas semanas para o lançamento, uma música acabou sendo retirada nos últimos dias. “Nunca Tenha Medo”, que parecia ter sido tirada do “A Procura da Batida Perfeita”, de Marcelo D2, ficou de fora.

Planet Hemp lança primeiro álbum em 22 anos. / Fernando Schlaepfer / Divulgação

BNegão revelou que a música, que trazia uma homenagem nos versos aos Originais do Samba, não teve a autorização de uso dos samples liberada a tempo do lançamento. “Infelizmente não chegou ainda, mas precisa sair. Uma hora vem”, contou.

Por enquanto, o Planet Hemp vai deixar o álbum reverberar entre os fãs e seguir cumprindo sua agenda de shows. A expectativa é só incorporar as músicas novas ao repertório no ano que vem.

“O lançamento do disco com show fazemos só a partir de março. Vamos mudar o show inteiro, tocar as músicas novas. A ideia é fazer uma parada completamente nova a partir de março, mas temos alguns shows ainda até lá”, concluiu BNegão.

Fonte: CNN

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