Agronegócio
Sábado, 20 de abril de 2024

O que explica a falta de unicórnios no agronegócio brasileiro, segundo especialistas

Concentração de conhecimento tecnológico em grandes empresas é um dos obstáculos para crescimento de startups no setor, segundo especialistas

Com pouco mais de duas dezenas de unicórnios — startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão antes de abrirem capital—, o Brasil é berço de cerca de 66% das empresas do tipo entre os países latinos, segundo a LAVCA (sigla em inglês para Associação para Investimento de Capital Privado na América Latina). O segundo lugar é do México, com 19%.

Apesar do número significativo, nenhuma dessas empresas brasileiras é focada no agronegócio, um dos motores da economia local. Os motivos que explicam esse cenário, segundo especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business passam pela baixa conectividade no campo, concentração de novas tecnologias em grandes empresas e até no clima favorável do país.

A falta de conectividade e alfabetismo digital é apontada como importante lacuna no setor por Guilherme Kudiess, sócio da Ventiur aceleradora e Francisco Jardim, sócio-fundador da SP Ventures.

Apenas 23% dos agricultores tem acesso à internet em toda a operação agrícola no Brasil, segundo a McKinsey & Company. “Isso dificulta a adoção de algumas tecnologias”, diz Jardim.

O especialista destaca também que, antigamente, era difícil um produtor fazer uma video-chamada ou comprar seus insumos pela internet —movimento acelerado pela pandemia de Covid-19.

“Mas, no geral, [o produtor] é resistente ao digital, pois sempre tenta mitigar os riscos, e a tecnologia digital. E por poder apresentar falhas na operação, muitas vezes eles não querem usar essas tecnologias”, destaca o sócio-fundador da SP Ventures.

Já Gustavo Araujo, cofundador da plataforma de inovação Distrito, diz que existe uma conjuntura climática favorável (temperatura e solo) no Brasil para o agronegócio. Assim, o país é muito competitivo no mercado “sem precisar de recursos tecnológicos para ter sucesso”.

Cenário diferente de outros países, como Israel, que precisa plantar no deserto. Ou seja, a tecnologia se torna necessária para que o país opere com esse mercado.

Outra característica desse setor que pode barrar a formação de unicórnios no agronegócio é a concentração de conhecimento tecnológico em grandes empresas do setor, diz Celso Funcia Lemme, professor do Instituto de pós-Graduação e pesquisa em administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)”.

A JBS, por exemplo, tem uma unidade de carne celular, um método alternativo de produção de carne considerado inovador e que vem sendo explorado por startups pelo mundo. Já a Suzano, gigante brasileira do setor de celulose, entrou no mercado têxtil após desenvolver uma fibra sustentável, que exige menos água na produção.

O fato de o agronegócio funcionar em safras, que tem muitas vezes uma produção de 5 meses, o tempo de validação de uma tecnologia acaba demorado um pouco mais que em outros setores, destacam especialistas. Por exemplo, é possível realizar testes no mercado financeiro em segundos.

Um unicórnio vem aí…

Apesar dos obstáculos, especialistas dizem que é uma questão de tempo para surgir um unicórnio no setor.

O sócio da Ventiur cita que, por conta do aumento na demanda por alimentos no mundo, o Brasil será um lugar importante para suprir a necessidade global, “não só pela disponibilidade de terra e água, mas também pelo possível aumento na produtividade através da tecnologia”.

Segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura), será necessário produzir 70% a mais de alimentos até 2050.

O sócio-fundador da SP Ventures acredita que o primeiro unicórnio do agro será um marketplace, uma fintech, um biológical ou climatech. A aposta do especialista é que a primeira empresa do setor a alcançar o patamar de US$ 1 bilhão levará dois ou três anos.

Já o cofundador do Distrito declarou que o primeiro unicórnio no setor deve vir da fusão dos serviços financeiros com agro. “O agro sempre utilizou de crédito e serviços financeiros como natureza do próprio negócio, e hoje já temos algumas fintechs como Agrolend, Terra Magna e Nagro atuando no segmento”.

Fonte: CNN