Cultura
Terça-feira, 23 de abril de 2024

Baladas de SP devem ter transmissão online e pistas menos cheias no pós-Covid

JOÃO PERASSOLO –

Voltar para uma pista de dança paulistana pode ser uma experiência diferente depois da pandemia, e talvez você não retorne para o mesmo clube onde ia dançar todos os sábados antes de março do ano passado.
A descoberta de novos lugares de festa, pistas menos cheias -devido à crise econômica ou ao medo de socializar depois do trauma coletivo da Covid- e a transmissão online de eventos com público presencial são cenários possíveis a partir do momento em que for possível sair à noite sem medo de se contaminar.
“Acho que a gente vai ter que passar por uma dessensibilização da Covid antes de estar num ambiente com tanta gente, com tanta troca. Quando você está numa festa, você não quer muita regra, não quer se vigiar, será que estou muito perto, será que bebi a bebida de alguém, será que beijei alguém. Você simplesmente quer fazer tudo isso”, diz a curadora da Galeria do DJ, espaço dedicado à memória da noite na Galeria Olido, Claudia Assef.
Ela diz achar complicado o cenário para festas presenciais no curto prazo, embora os frequentadores estejam sedentos pela volta. Sua opinião é compartilhada pelo DJ Paulo Tessuto, produtor da Capslock, uma das principais baladas de música eletrônica da cidade. Na opinião dele, as pessoas tendem a exagerar e vão enfiar o pé na jaca no retorno.
Resta saber quais casas noturnas ou galpões industriais de estética abandonada vão receber o público, já que produtores seguem pesquisando novos espaços. Tessuto afirma ter encontrado um lugar em Osasco, na Grande São Paulo, que poderia abrigar suas festas, além de não ter abandonado a ideia de botar de pé um centro comunal da Capslock, um prédio onde rolariam a sua e outras baladas de eletrônica.
Caio Taborda, sócio da festa Gop Tun, diz temer que menos espaços estejam disponíveis depois de tanto tempo fechados pela pandemia, mas lembra que a cena de festas independentes da qual faz parte é experiente em encontrar novos lugares e os tornar icônicos, assim como fez com a Fabriketa, uma fábrica no Brás transformada em espaço de eventos.
Mas mais importante do que se destacar na cena noturna do futuro próximo é seguir em atividade, diz André Almada, cofundador do grupo The Week, que reúne as casas de mesmo nome em São Paulo e no Rio de Janeiro.
“Estamos fechados há 15 meses e todos os esforços estão sendo feitos para a retomada segura. Assim como a The Week, milhares de estabelecimentos estão passando pelas mesmas dificuldades. Entendo que não é uma uma questão de competitividade ou vaidade, e sim de sobrevivência”, afirma, acrescentando que o entretenimento será uma válvula de escape no pós-pandemia.
Se antes do isolamento as festas se estendiam nas redes sociais nos dias seguintes, com a postagem incessante de fotos e vídeos de uma noitada, durante a pandemia o virtual passou a ser o único espaço possível de diversão para quem não se arriscou em eventos clandestinos.
Lives de Instagram, YouTube e Twitch salvaram os clubbers nos primeiros meses da quarentena, mas o formato se esgotou. “Já que é o que tem para hoje, vamos melhorar, porque aquela estética de câmera parada com o DJ tocando sem nenhuma interação com o público já deu”, diz Assef.
Neste contexto, a inovação vem do próprio setor noturno. A Gop Tun reuniu nomes queridos do circuito como o duo Vermelho Wonder, a DJ Eli Iwasa e a banda experimental Rakta e os pôs para tocar na Oca, no parque Ibirapuera, mixando imagens de suas apresentações a filmagens feitas com drones em áreas externas do parque.
“A gente não quer que tenha característica de live, vai ser um programa mais para o lado do cinema”, afirma Taborda, um dos idealizadores do evento, o Festival Não Existe, que será transmitido de graça nos próximos dias 27 e 28 pelo YouTube da Gop Tun.
Eventos vistos pelo computador não substituem o frisson do contato humano, é claro, mas podem virar uma fonte de renda para um setor combalido financeiramente pelo fechamento e com sua imagem abalada, já que festas ilegais parecem ter contribuído para o aumento exponencial de casos de Covid do final do ano passado para cá.
Taborda imagina um modelo em que se compre ingresso para acompanhar, a partir de uma tela, uma balada que aconteça ao vivo, com presença de público que também pagou para estar ali.
Esse tipo de evento híbrido é uma tendência que foi acelerada com a pandemia, afirma o designer de experiências e consultor Franklin Costa, mas é um movimento em estágio inicial, com muita experimentação criativa e poucos modelos de negócios estabelecidos.
“Games e festivais online são apenas algumas das possibilidades de novos palcos que estarão mais presentes em nosso dia a dia para quem deseja fazer parte do futuro do entretenimento ao vivo”, ele diz. “O show nunca parou, só mudou de palco.”

Fonte: FolhaPress